20 research outputs found
A sobrevivência do santo que “desmunheca”
A proposta geral deste artigo é analisar a sobrevivência transcultural do “gesto de desmunhecar” de São Sebastião, santo de origem cristã que há mais de 100 anos tem tido sua iconologia apropriada em contextos queer. Em termos mais específicos, o objetivo é investigar uma fórmula patética ou traço mnemônico que constela as figuras canônicas e contemporâneas de São Sebastião a uma ampla comunidade de imagens, de diferentes frações temporais e geográficas, nas quais pulsos e mãos também “desmunhecam”. Em primeiro lugar, se levanta o argumento de que o rastro queer da iconologia de São Sebastião não é refém das iconologias homoeróticas que se apropriaram de sua estética apolínea e de suas associações com os traumas culturais impingidos às populações de sexo/gênero divergentes. Em segundo lugar, propõe-se que o “páthos do desmunhecar” só vem a corroborar, através dos sentidos de fabulação e de resistência, com os rearranjos queer da iconologia canônica do santo.
Bichas intelectuais: um manifesto pelos saberes localizados
Este ensaio elabora, a partir da minha posição de bicha, um manifesto em defesa da produção de um conhecimento cientifico posicionado e localizado. Neste sentido, busco expor e contestar os mitos de imparcialidade e objetividade da ciência canônica branca e masculinista, visualizando também uma profanação da figura do intelectual em um contexto contemporâneo de disputa política e luta por reconhecimento.Palavras chave: saberes localizados; profanação; intelectualidade; bichasMaricas intelectuales: un manifiesto por los saberes localizadosResumen: Este ensayo elabora, a partir de mi posición de marica, un manifiesto en defensa de la producción de un conocimiento científico posicionado y localizado. En este sentido, busco exponer y contestar los mitos de imparcialidad y objetividad de la ciencia canónica blanca y masculinista, visualizando también una profanación de la figura del intelectual en un contexto contemporáneo de disputa política y lucha por reconocimiento.Palabras clave: saberes localizados; profanación; intelectualidad; maricaIntellectuals queers: a manifest by the localized knowledgeAbstract: This essay elaborates, from my position of queer, a manifesto in defense of the production of a scientific knowledge positioned and located. In this sense, I seek to expose and contest the myths of impartiality and objectivity of white and masculinist canonical science, also visualizing a desecration of the figure of the intellectual in a contemporary context of political dispute and struggle for recognition.Keywords: localized knowledge; desecration; intellectuality; quee
PARE DE NOS FILMAR! MOMENTOS DE NEGOCIAÇÃO EM MEIO ÀS IMAGENS COLONIAIS DA ÁFRICA?
Based on film criticism and theoretical reflection, this essay discusses the film Stop filming us (Joris Postema, 2020). Co-produced by the Netherlands and the Democratic Republic of Congo (DRC), the movie follows the Dutchman Joris Postema in a self-reflective filmic exercise: “as a western filmmaker, a native citizen of a rich European country am I able to use another lens other than the colonialist to film Africa and Africans?” First, the essay interrogates a question widely used by the Dutch director himself: “can I film?” It then reflects on the tensions between a single narrative, stereotype and colonialist discourse, borrowing especially from the studies by Homi Bhabha (2013) and Stuart Hall (2016). In a third moment, the essay treads the tensions between the aesthetics and politics of image (Jacques Rancière, 2018) and, finally, it points to a moment of negotiation (Homi Bhabha, 2013) that allow a spectator experience with the feature film without giving in to essentialist stances.Movido por um arranjo entre crítica cinematográfica e reflexão teórica, este ensaio disserta sobre o filme Pare de nos filmar (Stop filming us, Joris Postema, 2020). O longa-metragem, coprodução dos Países Baixos com a República Democrática do Congo (RDC), acompanha o holandês Joris Postema em um exercício fílmico autorreflexivo: “como cineasta ocidental, cidadão nativo de um rico país europeu, sou capaz de usar uma outra lente que não seja a colonialista para filmar a África e os africanos? ” De saída, o ensaio fraciona uma pergunta vastamente utilizada pelo próprio diretor holandês: “posso filmar? ” Em seguida, reflete sobre as tensões entre narrativa única, estereótipo e discurso colonialista, apoiado especialmente nos estudos de Homi Bhabha (2013) e Stuart Hall (2016). No terceiro momento, o ensaio passeia pelas tensões entre estética e política da imagem (RANCIÈRE, 2018) e, por fim, aponta para um instante de negociação (BHABHA, 2013) que permite uma experiência espectatorial com o longa-metragem sem ceder a posições essencialistas
Ensaios sobre autorias queer no cinema brasileiro contemporâneo
Este estudo desenvolve uma ideia de autoria queer no cinema brasileiro contemporâneo enquanto um exercício de performance. Parte-se de um mapeamento de realizadoras transbichas- sapatas que, desde meados dos anos 2000 até o presente momento, dirigiram e roteirizaram filmes com personagens queer, sapatas, bichas, trans, butches, veados e/ou que abordaram em seus filmes temas correntes como corporalidade, gênero, pornografia e sexualidade. Apresenta-se esse mapeamento sob o argumento de que o cinema brasileiro contemporâneo é marcado pela complexidade e pela multiplicidade de outros sujeitos históricos que estão filmando. E, por esse motivo, a produção dessas imagens é contingenciada de um modo potente e precário por experiências deslocadas e deslocantes. Assim, o mapeamento construído expõe não só um flexível e extenso número de realizadores, mas também algumas informações sobre suas identificações de sexo/gênero, região, estado, cidade, formas de financiamento e modelos de produção. A partir desse contexto, realiza-se uma seleção de diretores/diretoras/roteiristas/performers para conversas e entrevistas - a fim de dialogar sobre seus processos criativos e de produção. Essas conversas são friccionadas junto a filmes, materiais extrafílmicos e teorizações oriundas dos campos das artes, do cinema, da política, da estética e da performance. Com isso, desenvolve-se um caminho reparativo e ensaístico que, sem restaurar o tema de um sujeito originário, busca entender como esses sujeitos de gênero, corpo e sexualidade dissidentes se constituem como autores ou autoras queer no cinema brasileiro contemporâneo. Considera-se, assim, que a autoria queer trata-se de uma performance incorporada que reconfigura a experiência e o vivido e que comunica histórias pessoais e culturais das homossexualidades e das transexualidades. Além disso, elas oferecem uma partilha política e estética que coloca em crise valores e normatividades do “bom” e do “cânone”, produzem diferentes repertórios de sensibilidades e promovem uma inflexão queer de alguns valores das noções de autoria cinematográfica produzidas e disseminadas ao longo do século XX.This study develops an idea of queer authorship in contemporary brazilian cinema as a performance exercise. This work elaborates a mapping of queer directors and screenwriters who, from the mid 2000's until the present moment, have directed films with queer characters or who have approached in their films themes such as corporeality, gender, pornography and sexuality. This mapping is presented with the argument that contemporary brazilian cinema is marked by the complexity and multiplicity of other historical subjects who are filming. For this reason, the production of these images is contingent in a powerful and precarious way on displaced experiences. Thus, the mapping exposes not only a flexible and extensive number of directors, but also some information about their gender identifications, region, state and city, forms of financing and production models. From this context, the research proposes a selection of directors/scriptwriters to talk about their creative and production processes. Later, the research rubs these conversations with films, extra-filmic materials and theorizations about art, cinema, politics, aesthetics and performance. Thus, the work proposes a reparative and essayistic path that, without restoring the theme of an original subject, reflects how these dissenting subjects of gender, body and sexuality constitute themselves as queer authors in contemporary brazilian cinema. Finally, queer authorship is a performance (embodied practice) that reconfigures the experience and communicates personal and cultural histories of homosexualities and transsexualities. In addition, they offer a political and aesthetic sharing that puts in crisis values and norms of the "good" and the "canon", produce different repertories of sensibilities and promote a queer inflection of some values of the notions of cinematographic authorship produced and disseminated throughout the 20th century
Carta de uma criança queer para outra criança queer: percursos espectatoriais desviantes na infância
Neste texto, tomando como premissa o consumo e a apropriação de repertórios audiovisuais que permeiam memórias pessoais e culturais, propomos produzir algumas articulações entre nossas infâncias queer, ambas vividas em territórios distintos e análogos (o interior cearense e o interior gaúcho) e clivadas em diferentes temporalidades que atravessam os anos 1980, 1990 e início dos anos 2000. Recorremos à forma das cartas como proposta de escrita dialógica e à teorização como dispositivo de memória, a fim de elaborarmos uma reflexão conjunta a respeito de experiências de formação marcadas por diferentes contingências, invenções e precariedades. Com isso, buscamos construir um senso de coexistência a partir dos engajamentos afetivos com as imagens e os sons, bem como traçar linhas que conectam crianças queer ao longo do tempo e do espaço
A força do fracasso, o levante dos selvagens: uma entrevista com Jack Halberstam
No dia 25 de maio de 2023 foi realizada na Casa da Glória, centro de eventos culturais localizado na região central do Rio de Janeiro (RJ), a Conferência Queer Aqui - Together in Hard Times/ Juntes em tempos de luta, que reuniu um conjunto de pesquisadoras e pesquisadores brasileiros e estrangeiros em torno de temas como estudos queer e políticas da diferença. Por ocasião dessa conferência, que foi organizada pela Columbia University e pelo Columbia Global Centers, o professor e pesquisador Jack Halberstam, o qual mais recentemente ganhou projeção no Brasil em função da tradução e publicação de seu livro A arte queer do fracasso (Cepe editora, 2020), concedeu uma entrevista a Ribamar Oliveira (doutorando do Programa de Pós-Graduação em Comunicação e Cultura da UFRJ) e Dieison Marconi (pós-doutorando no Programa de Pós-Graduação em Comunicação e Cultura da UFRJ)
Notas sobre espectatorialidade queer // Notes on queer spectatorship
A grande maioria das recentes pesquisas em cinema queer no Brasil têm se concentrado sob o ponto de vista estético-narrativo e das políticas de representação. Nesse caso, permanece uma série de lacunas que precisam ser exploradas e investigadas, como é o caso dos processos de produção e consumo. No presente artigo, propomos um alargamento do horizonte de pesquisa através da espectatorialidade fílmica. Assim, nos dispomos a refletir as políticas queer no cinema a partir de suas reverberações no contexto de consumo e apropriação das narrativas fílmicas por intermédio do que podemos denominar de espectatorialidade queer
Narcisos insubmissos: autorrepresentação, identidade e diferença nas artes visuais ibero-americanas
Diante da compreensão de que compartilhamos um passado histórico e sociocultural recente e similar (semiperiférico, ditatorial, colonial, cristão, monoteísta patriarcal), o que as artes ibero-americanas teriam a dizer sobre as ficções dominantes e com que ferramentas estéticas e dissensuais fariam frente a um consenso policialesco de gênero, sexualidade, raça e classe social? Que cenas, gestos e rostos, mesmo que transitórios, ambíguos e relacionais, poderiam perturbar determinados regimes policialescos não apenas de raça, gênero e classe, mas também perturbar as próprias ficções dominantes no campo das artes?
Com este número, pretendemos analisar então as operações discursivas e estéticas que ocorrem quando são as subjetividades subalternas que representam a si mesmas, em vez de serem retratadas a partir do olhar de um Outro hegemônico que frequentemente procura coisificá-las, dominá-las e observá-las de uma distância que não contamine sua subjetividade
Carta ao rapaz que me amou, ao rapaz que eu amei: Um ensaio sobre experiência estética, cultura pop e desencontro amoroso
Tomando como ponto de partida a experiência estética com diferentes produtos da cultura pop e/ou popular que exploram o sentimento amoroso em sua faceta romântica, esse texto depura alguns códigos e clichês que compõem essa imagética amorosa. A partir dessa depuração, reflete-se sobre como o amor romântico, embora possa não sobreviver enquanto modelo viável de relação, ainda subsiste como experiência estética. Recorre-se à escrita anacrônica de duas cartas de amor como proposta metodológica e a teorização como dispositivo de memória pessoal e cultural, afastando a crítica comunicacional e sociológica de uma tessitura “séria e engajada” contra o amor romântico na cultura pop e propondo, inclusive, uma reflexão reparativa (SEDGWICK, 2020) a respeito das diferentes formas pelas quais sujeitos e comunidades minoritárias se nutriram e/ou se nutrem com objetos de uma cultura cujo desejo declarado foi, muitas vezes, o de não as sustentar.  
Ensaios sobre autorias queer no cinema brasileiro contemporâneo
Este estudo desenvolve uma ideia de autoria queer no cinema brasileiro contemporâneo enquanto um exercício de performance. Parte-se de um mapeamento de realizadoras transbichas- sapatas que, desde meados dos anos 2000 até o presente momento, dirigiram e roteirizaram filmes com personagens queer, sapatas, bichas, trans, butches, veados e/ou que abordaram em seus filmes temas correntes como corporalidade, gênero, pornografia e sexualidade. Apresenta-se esse mapeamento sob o argumento de que o cinema brasileiro contemporâneo é marcado pela complexidade e pela multiplicidade de outros sujeitos históricos que estão filmando. E, por esse motivo, a produção dessas imagens é contingenciada de um modo potente e precário por experiências deslocadas e deslocantes. Assim, o mapeamento construído expõe não só um flexível e extenso número de realizadores, mas também algumas informações sobre suas identificações de sexo/gênero, região, estado, cidade, formas de financiamento e modelos de produção. A partir desse contexto, realiza-se uma seleção de diretores/diretoras/roteiristas/performers para conversas e entrevistas - a fim de dialogar sobre seus processos criativos e de produção. Essas conversas são friccionadas junto a filmes, materiais extrafílmicos e teorizações oriundas dos campos das artes, do cinema, da política, da estética e da performance. Com isso, desenvolve-se um caminho reparativo e ensaístico que, sem restaurar o tema de um sujeito originário, busca entender como esses sujeitos de gênero, corpo e sexualidade dissidentes se constituem como autores ou autoras queer no cinema brasileiro contemporâneo. Considera-se, assim, que a autoria queer trata-se de uma performance incorporada que reconfigura a experiência e o vivido e que comunica histórias pessoais e culturais das homossexualidades e das transexualidades. Além disso, elas oferecem uma partilha política e estética que coloca em crise valores e normatividades do “bom” e do “cânone”, produzem diferentes repertórios de sensibilidades e promovem uma inflexão queer de alguns valores das noções de autoria cinematográfica produzidas e disseminadas ao longo do século XX.This study develops an idea of queer authorship in contemporary brazilian cinema as a performance exercise. This work elaborates a mapping of queer directors and screenwriters who, from the mid 2000's until the present moment, have directed films with queer characters or who have approached in their films themes such as corporeality, gender, pornography and sexuality. This mapping is presented with the argument that contemporary brazilian cinema is marked by the complexity and multiplicity of other historical subjects who are filming. For this reason, the production of these images is contingent in a powerful and precarious way on displaced experiences. Thus, the mapping exposes not only a flexible and extensive number of directors, but also some information about their gender identifications, region, state and city, forms of financing and production models. From this context, the research proposes a selection of directors/scriptwriters to talk about their creative and production processes. Later, the research rubs these conversations with films, extra-filmic materials and theorizations about art, cinema, politics, aesthetics and performance. Thus, the work proposes a reparative and essayistic path that, without restoring the theme of an original subject, reflects how these dissenting subjects of gender, body and sexuality constitute themselves as queer authors in contemporary brazilian cinema. Finally, queer authorship is a performance (embodied practice) that reconfigures the experience and communicates personal and cultural histories of homosexualities and transsexualities. In addition, they offer a political and aesthetic sharing that puts in crisis values and norms of the "good" and the "canon", produce different repertories of sensibilities and promote a queer inflection of some values of the notions of cinematographic authorship produced and disseminated throughout the 20th century