27 research outputs found
"O aparelho é como um automóvel; a pista é a paciente": para além do ensino de tecnologia no pré-natal
O presente estudo contempla as práticas e ideias envolvidas na formação acadêmica de um grupo social relevante: o dos médicos que, dada sua posição hierárquica significativa na produção da marca ultrassom obstétrico, parece-nos ser um ponto de "parada" interessante e fundamental no fluxo circular entre ideias, marcas e coisas que constituem esse objeto, ultrassom. A observação etnográfica da situação de ensino permite captar dinamicamente esse momento fundamental no qual os principiantes são apresentados a uma tecnologia que foi histórica (e provisoriamente) constituída como indispensável no acompanhamento pré-natal. Pretende-se, assim, apreender de que modo é produzida a "socialização visual" dos futuros profissionais; a pesquisa empírica evidenciou que, juntamente com um determinado tipo de olhar, outros elementos bastante heterogêneos também são ensinados aos futuros médicos. Uma tensão bastante presente no campo consiste na dicotomia entre uma abordagem eminentemente clínica e outra, de teor fortemente tecnicista. A eventual precariedade de dispositivos tecnológicos evidencia diversos paradoxos e incongruências nesta segunda tendência. As modificações ocorridas no desenrolar dos diversos processos que se articulam no campo observado são discutidas em termos do que são capazes de revelar sobre os grupos sociais envolvidos em sua produção
"Half a pint of humanity" - the production of the pleasure of seeing and the construction of fetal person mediated by ultra-sound imaging: an ethnographic study in imaging clinics in the city of Rio de Janeiro
O foco central desta tese consiste em procurar compreender um fenômeno que se verifica na atualidade em torno das imagens ultra-sonográficas fetais. O que era a princípio e
em princípio uma tecnologia de imagem médica, inventada com propósitos diagnósticos, gradualmente transformou-se em objeto de consumo e lazer. Para investigar o fenômeno, a
pesquisa teórica aborda como foram construídos o olhar e o observador modernos, e de que modo as tecnologias de imageamento médico incidem na construção social do corpo. Outro aspecto teórico consiste na investigação, de um ponto de vista sócio-histórico, acerca da produção da gravidez e do feto como temas médicos, e de que modo a tecnologia de ultra-som aplicada à obstetrícia está situada na articulação de vários processos: o da construção de um novo olhar, o das reconfigurações do corpo, o da medicalização da gestação e do feto e, finalmente, o da construção do feto como Pessoa antes de seu nascimento. Estudos antropológicos produzidos no exterior, ao longo da década de 1990, apontaram que o
fenômeno envolvendo as imagens fetais encontrava-se inscrito nos e delimitado pelos códigos socioculturais específicos de onde ocorriam. A inexistência de pesquisas acerca do tema, no
contexto brasileiro, foi o ponto de partida para uma investigação empírica. Foi realizada uma observação antropológica de ultra-sonografias obstétricas, em abordagem etnográfica, em três clínicas privadas de imagem, ao longo de 2003, no Rio de Janeiro, visando compreender como tal fenômeno se dava, de que modo era produzido e significado pelos atores e quais os desdobramentos de tais práticas, modelados por especificidades culturais locais. O trabalho de
campo evidenciou que a ultra-sonografia obstétrica caracteriza-se por ser uma tecnologia de imagem interativa, em contraste com outras técnicas de imageamento médico, uma peculiaridade que propicia a construção de diversos significados a partir das imagens fetais cinzentas e esfumaçadas. A produção do prazer de ver o feto é a pedra de toque que une o útil ao agradável, e o consumo de imagens é um ponto de articulação de diversas questões expostas ao longo da tese. Pode-se pensar nesta situação como parte de um panopticismo que devassa corpos femininos e fetais, em um mesmo processo normatizando-os e construindo novos sujeitos calcados em corporalidades virtuais.The central focus of this thesis consists of seeking to understand a phenomenon which is presently taking place in the area of fetal ultrasound images. What began as a medical
imaging technology, invented for diagnostic purposes, gradually became an object of consumption and leisure. In order to investigate this phenomenon, the theoretical investigation looks at how the modern mode of seeing and the observer were constructed, and in what way technologies of medical imaging impact the social construction of the body.
Another theoretical aspect consists of the investigation, from a socio-historical point of view, of the production of pregnancy and of the fetus as medical subjects, and in what way the technology of ultra-sound applied to obstetrics is situated at the nexus of various processes: the process of constructing a new mode of seeing, of the reconfigurations of the body, of the medicalization of gestation and of the fetus, and, finally, of the construction of the fetus as a person before its birth. Anthropological studies carried out abroad, during the nineties, show that the phenomenon involving fetal images was inscribed in and delimited by the specific socio-cultural codes where the imaging was done. The lack of research in this area in the Brazilian context was the point of departure for an empirical investigation. An anthropological observation of obstetric ultra-sounds, with an ethnographic approach, was carried out in three private imaging clinics, during the course of 2003, in Rio de Janeiro, with the intention of understanding how this phenomenon took place, in what way it was produced and signified by those involved, and what were the ramifications of these practices, modeled by local cultural particularities. The field work showed that obstetric ultrasonography can be characterized as an interactive imaging technique, in contrast to other medical imaging techniques, a peculiarity which lends itself to the construction of various significations having as their origin gray and hazy fetal images. The production of the pleasure of seeing the fetus is the touchstone which links the useful to the pleasing, and the consumption of images is point of connection for various questions raised in the thesis. One can think of this situation as part of a panopticism which scans female and fetal bodies, at one and the same time normatizing them and constructing new subjects shaped by virtual corporalities
Wearing the white coat: thoughts about the subjectivity and the ethnographer’s place in a medical environment
The author discusses some issuesthat arose in the course of fieldwork, part of her doctorate thesis about the social construction of thefoetus as a person through imaging technology. The research involved the observation of obstetrical ul-trasound scans in private clinics in Rio de Janeiro-Brazil. The problem in point was the search for an anthropological view in a medical environment,the observer herself being a physician. The request that she wear a white coat caused questions to ariseconcerning the identity of the observer, as a doctoras well as an anthropologist. It is queried how thisduality operates in the course of the research, withregard to the actors in this universe and in the viewof the observer. Her presence appeared to be moreperturbing to the doctors than to the mothers-to-be. The way in which the perturbation was expres- sed differed according to the gender of the doctor. The researcher’s medical background facilitated the author’s attendance at the examinations and the ac- ceptance of the research by the subjects observed; on the other hand, there is a tension raised by the observer’s attempt at reaching an anthropological view in a situation that is doubly familiar to her.A autora discute questões surgidas no decorrer do trabalho de campo, parte da tese de doutorado, cuja temática consiste na construção do feto como Pessoa, mediada pela tecnologia de imagem. Foram observadas ultrassonografias obstétricas em clínicas do Rio de Janeiro, RJ, e neste texto é problematizado o fato de buscar um olhar antropológico em ambiente médico, sendo ela própria médica. O pedido de que vestisse o jaleco em duas clínicas gerou questões acerca da identidade da observadora, como médica e como antropóloga. Discute-se como esta dupla inserção opera no decorrer da pesquisa, em relação aos atores deste universo e no olhar da observadora. A presença desta pareceu ser mais perturbadora para os médicos do que para as gestantes. O modo como a perturbação era expressa diferiu de acordo com o gênero do ultrassonografista. A formação médica facilitou a entrada no campo e a aceitação da pesquisa por parte de seus sujeitos e por outro lado há uma tensão quando a pesquisadora busca estranhar uma situação duplamente familiar
"Meio quilo de gente": um estudo antropológico sobre ultra-som obstétrico
Bem mais que um relato sobre ultra-sonografia fetal em mulheres de camadas médias do Rio de Janeiro, a obra propõe uma reflexão refinada sobre o papel da tecnologia médica na (re)definição do corpo e da própria realidade em que vivemos. Os resultados, apresentados, contribuem para o debate sobre a construção do feto como pessoa mediada pela tecnologia de imagem
“…Those could just as well be the Rocky Mountains…”- Consumption, spectacularity and much more in obstetrical ultrasound in Rio de Janeiro at the turn of the century
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Previous issue date: 2009Universidade Federal do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, RJ, Brasil.Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, RJ, Brasil.Este artigo mobiliza a chamada “teoria ator-rede” para abordar a tecnologia de ultra-som obstétrico no Rio de Janeiro no início do século XXI como uma tecnologia ‘indispensável’ no acompanhamento pré-natal. Sem almejar compor uma lista exaustiva, o artigo põe em cena um elenco de elementos heterogêneos que agem em justaposição configurando a especificidade da tecnologia estudada, ensejando sua delimitação e nomeação. Os elementos híbridos aqui apresentados – aparelhagem, didatismo, tranqüilidade, oráculo, afetos, prestígio, mercado, mídia, patologia, purificação – são configurados e entendidos como agentes ou actantes híbridos que são simultaneamente 1) naturais mas sem formas definidas que estejam lá já previamente dadas para serem ‘simplesmente’ descobertas (formas de “coisas-em-si”); 2) coletivos mas não sociais se a este adjetivo for atribuído o sentido de pertencer a um mundo exclusivo de relações de “humanos-entresi”; e ainda 3) narrados mas não constituídos só pelo discurso. A performance deste trabalho é praticar um primeiro movimento de afastamento da tradição de grandes divisores tomados a priori, predominantes nos últimos séculos nos estudos do conhecimento dito moderno: natureza x sociedade, público x privado, coração x mente, ciência x crença, humano x não-humano, masculino x feminino, macro x micro, local x global. Interessa-nos especialmente que, na medida em que se obtém este afastamento, surgem / co-constroem-se outras paisagens para os estudos CTS (ciência-tecnologia-sociedade) no Brasil – nelas, em linguagem crua, o que existe é o que age, e só entidades híbridas têm a capacidade da ação. O passo seguinte deste trabalho, indicado mas não completado aqui, é estudar os lugares onde se passam as ações que configuram os elementos apresentados e por que meios (veículos materiais) eles se comunicam, articulam e agem uns sobre os outros.This work calls upon the so called ANT (actor-network theory) to approach the obstetric ultrasound technology as an ‘indispensable’ technology in prenatal monitoring in Rio de Janeiro at the turn of the 21st century. It does not envisage to build an exhaustive list but rather to perform a set of heterogeneous elements which by acting in juxtaposition configure the specificity of the studied technology, allowing for its delimitation and naming. The hybrid elements that are presented here - equipment, didacticism, assurance, oracle, affections, prestige, market, media, pathology, purification – are configured and understood as agents or actants which simultaneously are: 1) natural but without previously established forms that are already out there to be ‘simply’ discovered (not “things-in-themselves”); 2) collective but not social if this adjective refers to belonging to an exclusive world of relations of “humans-among-themselves”; and yet 3) narrated but not constituted solely by discourse. The purpose of this work is to perform a distance from the tradition of the great a priori dividers which predominate in the studies of the so-called modern knowledge in the last few centuries: natural x social, public x private, heart x mind, science x belief, human x non-human, male x female, macro x micro, local x global. Our special interest is that, to the extent that this distance is obtained, other landscapes can be reached by Brazilian and Latin American STS (science-technology-society studies) – there, to say it somewhat crudely, that which exists is that which acts, and only hybrids have the capacity to act. The next step of this work, here indicated but not completed, is to study where the actions that configure the above elements take place and by which means (material vehicles) they communicate, articulate and act one upon other among themselves