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A coerência da crueldade : os significados da violência extrema para os envolvidos no tráfico de drogas no Rio Grande do Sul
A pesquisa analisa os significados da violência letal extrema produzida nos conflitos entre facções na cidade de Porto Alegre e Região Metropolitana, entre os anos de 2016 e 2018. O estudo quer entender por que novas formas de matar, como esquartejamentos, decapitações, alvejamentos, atentados e chacinas foram operacionalizados durante o período de disputas entre dois grupos do tráfico de drogas do estado do RS, os Bala na Cara e os Antibalas. Para isso, articula-se a teoria de Valencia a respeito do capitalismo gore e a teoria da sociabilidade violenta de Machado da Silva. Para a análise, recorreu-se a três fontes principais de pesquisa: notícias dos jornais locais a respeito da chamada guerra no tráfico, grupos focais realizados com dez adolescentes internados em unidade de cumprimento de medida socioeducativa e entrevistas narrativas com quatro participantes desses grupos focais. Enquanto a análise documental possibilitou compreender as dinâmicas de atuação dos embolamentos e as mudanças no uso da violência durante esse período, o contato direto com os envolvidos no tráfico de drogas permitiu acessar os significados subjetivos do uso dessa violência. Dois conjuntos de resultados foram produzidos a partir do corpus da pesquisa. Sob o ponto de vista da estrutura das facções, a violência extrema se mostrou uma estratégia de produção de capital econômico, operada de acordo com as configurações estruturais do mercado e sujeita a transformações sempre que essas condições mudam. Assim, após o período da guerra, os embolamentos que utilizaram a violência extrema se consolidaram no cenário do mercado ilícito de drogas, passando a gerir uma galeria no Presídio Central, no caso dos V7, e expandindo seu território de domínio para o interior do estado, no caso dos Bala na Cara. Sob o ponto de vista dos sujeitos envolvidos, por outro lado, a violência extrema adquiriu significados muito além dos ganhos econômicos. Para os jovens, a guerra representou o momento de consolidação do seu envolvimento com os grupos do tráfico, no qual a violência foi o instrumento utilizado para vingar a morte de seus amigos e familiares, proteger a sua vila das incursões de grupos contrários e afirmar a sua relevância no interior do embolamento. Esse ciclo de ação e reação violenta ocorreu por meio do fortalecimento de um sistema sociocultural que condiciona um certo script de práticas às masculinidades marginalizadas, regidas por um código de honra, em que a proteção e a homenagem são capitais essenciais para alcançar o prestígio pessoal. A violência extrema, portanto, atuou como um fator essencial na instrumentalização dos envolvidos como agentes incumbidos de colocar em prática o que, para os embolamentos, consistia em uma estratégia de expansão e fortalecimento. A cada ato de violência extrema realizado durante o período da guerra, os jovens, ao mesmo tempo que aprofundavam seu envolvimento, auxiliavam na construção de uma estrutura ainda mais consolidada, de modo que se instalou uma configuração social que só veio a ser desconstituída quando as condições estruturais mudaram e a violência extrema deixou de ser um instrumento essencial na estratégia de atuação dos embolamentos no mercado da droga do estado.The research analyzes the meanings of the extreme lethal violence produced in the conflicts between criminal factions in the city of Porto Alegre and the Metropolitan Region, between 2016 and 2018. We aimed to understand why new forms of killing, such as quartering, beheading, shooting, attacks and slaughter took place during the period of disputes between two drug trafficking groups in the state of Rio Grande do Sul, the so called Bala na Cara and the Antibalas. To this end, Valencia's theory on gore capitalism and Machado da Silva's theory on violent sociability were articulated. We resorted to three main sources of research in the analysis: media from local newspapers about the so-called war on drug trafficking, focus groups conducted with ten adolescents in juvenile detention, and narrative interviews conducted with four participants from these focus groups. While the documentary analysis made it possible to understand the dynamics of drug trafficking groups actions and the changes in the use of violence during this period, the contact with those involved in drug trafficking allowed us to access the subjective meanings of its use. Two sets of results were produced from the research corpus. From the standpoint of drug trafficking groups structure, extreme violence has proven to be a strategy of economic capital production, operated according to the structural configurations of the market and subject to modifications whenever these conditions changed. Thus, after the war, the drug trafficking groups that used extreme violence consolidated themselves within the ilegal drug market scenario, running a gallery in the Central Prision, as was the case of the V7, and expanding their domain towards the countryside, in the case of the Balas na Cara. From the point of view of those involved in drug trafficking groups, on the other hand, extreme violence acquired meanings far beyond economic gains. For young people, the war was the time to consolidate their involvement with trafficking groups, in which violence was the means used to avenge the death of their friends and family, to protect their village from the incursions of opposing groups and to affirm their relevance within the group. This cycle of violent action and reaction occurred through the strengthening of a sociocultural system that conditions a certain script of practices to marginalized masculinities, governed by a code of honor, where protection and honor are essential capitals for achieving personal prestige. Extreme violence, therefore, acted as an essential factor in the instrumentalization of those involved in drug trafficking groups as agents responsible for practicing what was a strategy of expansion and strengthening for drug trafficking groups. At every act of extreme violence during the war, the young people deepened their involvement and helped to build an even more consolidated structure. Therfore, the social configuration that emerged was only dismantled when structural conditions changed and extreme violence became no longer an essential means to the drug market strategy of action
‘Pra eles verem que nós somos ruim’: Violência extrema no mercado de drogas no Rio Grande do Sul
This article seeks to understand why factions and the individuals involved in the Rio Grande do Sul drug market resorted to extreme violence between 2016 and 2018. We concluded that the use of extreme violence was an essential instrument in the strategy of expansion of criminal groups in the drug market in the state. The use of violence as the main purpose of the action deepened the involvement of the subjects in the “war”, pointing to a pattern of sociability, with codes of solidarity internal to the groups.Este artigo procura entender por que facções e seus sujeitos envolvidos no mercado de drogas gaúcho recorreram à violência extrema, entre 2016 e 2018. Com base em notícias de jornal, grupos focais e entrevistas narrativas com adolescentes em cumprimento de medida socioeducativa de internação, concluiu-se que o emprego de violência extrema constituiu um instrumento essencial na estratégia de expansão dos embolamentos no mercado de droga no estado. O uso da violência como fim principal da ação aprofundou o envolvimento dos sujeitos na “guerra”, apontando para um padrão de sociabilidade, com códigos de solidariedade internos aos grupos
"So they can see how bad we are" : extreme violence in Rio Grande Do Sul's drug market
Este artigo procura entender por que facções e seus sujeitos envolvidos no mercado de drogas gaúcho recorreram à violência extrema, entre 2016 e 2018. Com base em notícias de jornal, grupos focais e entrevistas narrativas com adolescentes em cumprimento de medida socioeducativa de internação, concluiu-se que o emprego de violência extrema constituiu um instrumento essencial na estratégia de expansão dos embolamentos no mercado de droga no estado. O uso da violência como fim principal da ação aprofundou o envolvimento dos sujeitos na “guerra”, apontando para um padrão de sociabilidade, com códigos de solidariedade internos aos grupos.“So They Can See How Bad We Are”: Extreme Violence in Rio Grande Do Sul’s Drug Market seeks to understand why factions and the individuals involved in the Rio Grande do Sul drug market resorted to extreme violence between 2016 and 2018. We concluded that the use of extreme violence was an essential instrument in the strategy of expansion of criminal groups in the drug market in the state. The use of violence as the main purpose of the action deepened the involvement of the subjects in the “war”, pointing to a pattern of sociability, with codes of solidarity internal to the groups
‘So They Can See How Bad We Are’: Extreme Violence in Rio Grande Do Sul’s Drug Market
Este artigo procura entender por que facções e seus sujeitos envolvidos no mercado de drogas gaúcho recorreram à violência extrema, entre 2016 e 2018. Com base em notícias de jornal, grupos focais e entrevistas narrativas com adolescentes em cumprimento de medida socioeducativa de internação, concluiu-se que o emprego de violência extrema constituiu um instrumento essencial na estratégia de expansão dos embolamentos no mercado de droga no estado. O uso da violência como fim principal da ação aprofundou o envolvimento dos sujeitos na “guerra”, apontando para um padrão de sociabilidade, com códigos de solidariedade internos aos grupos.This article seeks to understand why factions and the individuals involved in the Rio Grande do Sul drug market resorted to extreme violence between 2016 and 2018. We concluded that the use of extreme violence was an essential instrument in the strategy of expansion of criminal groups in the drug market in the state. The use of violence as the main purpose of the action deepened the involvement of the subjects in the “war”, pointing to a pattern of sociability, with codes of solidarity internal to the groups
Death Territories: Visibility of Juvenile Residents of Porto Alegre who were Victims of Homicide in 2015, 2016, 2017 and 2018
The paper aims to map the homicides that victimize individuals residing in Porto Alegre between the years 2015 and 2018 identifying their main characteristics as well as the neighborhoods where they lived and died Based on data from the Mortality Information System SIM provided by the Municipal Health Department the paper analyzes the profile of the victims in relation to age gender and race The QGis software was used to map the life and death sites of the murdered youth aged between 15 and 29 years Thus it was possible to reaffirm the idea that homicides mainly victimize young black males However the age curve showed a peak of victims between 15 and 19 years old which was not a reality a decade ago In addition it was noted the proportional decrease of white victims as well as a greater women representation Finally in relation to life and death places while there is a strong concentration in the neighborhoods Rubem Berta Restinga Santa Tereza Sarandi and Lomba do Pinheiro it was also possible to verify a growing territorial homicides sprea
Traficante não é vagabundo: trabalho lícito, profissionalização e tráfico de drogas na perspectiva de adolescentes internados
O presente trabalho analisa como um grupo de adolescentes do sexo masculino internados em uma Unidade Socioeducativo na FASE-RS e participante do curso profissionalizante do Projeto Pescar compreende a categoria trabalho a partir das atividades do trabalho lícito, da profissionalização e do tráfico de drogas. A problemática foi desenvolvida em razão da hipótese de que a adesão por adolescentes ao tráfico de drogas pode ser mais bem compreendida através da aproximação da atividade ilícita à noção de trabalho. Para tanto, a pesquisa toma o trabalho não só como atividade produtora de bens de uso, mas também como categoria essencial à construção do ser social e como principal responsável pela distinção do indivíduo na hierarquia social. Metodologicamente, realizaram-se grupos focais com dez adolescentes, os quais foram orientados a discutir sobre trabalho, profissionalização e tráfico de drogas. A análise foi dividida em quatro eixos (significado das atividades, como elas são aprendidas e descritas, os prós e os contras de tais atividades, e como elas se relacionam com as competências comportamentais desenvolvidas pelo Projeto Pescar). Assim, observou-se uma percepção ambivalente na relação entre o tráfico de drogas e o trabalho. Por um lado, os adolescentes aproximam o tráfico à noção de trabalho, na medida em que a atividade é indicada como produtora de bens, responsável por possibilitar a materialização de ideações abstratas, e, sobretudo, atuante na distinção dos indivíduos, os quais estariam acima na hierarquia social em relação, por exemplo, ao “vagabundo”. Em contrapartida, o tráfico de drogas é afastado da nocão de trabalho quando a violência da atividade ilícita é exaltada, sobretudo a violência letal e a sua ameaça produzida pelos sujeitos pertencentes aos grupos rivais no mercado de drogas.This paper analyzes how a group of male adolescents confined at a house arrest and participant in the professionalizing course of the Pescar Project comprises the category of work based on the activities of legal work, professionalization and drug trafficking. The problematic was developed from the hypothesis that the adhesion by adolescents to the drug traffic can be better understood through the approximation of the illicit activity to the notion of work. Therefore, research takes work not only as an activity producing goods of use, but also as a category essential to the construction of the social being and as the main responsible for the distinction of the individual in the social hierarchy. Methodologically, focus groups were executed with ten adolescents, who were instructed to discuss work, professionalization and drug trafficking. The analysis was divided into four axes (meaning of activities, how they are learned and described, the pros and cons of such activities, and how they relate to the behavioral competencies developed at Pescar Project). Thus, there was an ambivalent perception of the relationship between drug trafficking and work. On the one hand, adolescents approach trafficking to the notion of work, once the activity is indicated as a producer of goods, responsible for enabling the materialization of abstract ideas and, above all, acting on the distinction of individuals, which would be above in the social hierarchy in comparison with the "tramp", for example. On the other hand, drug trafficking is kept away from the notion of work when the violence of the illicit activity is exalted, especially the lethal violence and its threat produced by the subjects belonging to the rival groups in the drug market
O interacionismo radical de Athens em debate: Resenha de 'Radical Interactionism on the Rise’, organizado por Lonnie H. Athens (Emerald Group Publishing, 2013)
ATHENS, Lonnie H. (ed.). (2013), Radical Interactionism on the Rise (Studies in Symbolic Interaction, Vol. 41). Bingley, Emerald Group Publishing
Traficante não é vagabundo: trabalho lícito, profissionalização e tráfico de drogas na perspectiva de adolescentes internados
O presente trabalho analisa como um grupo de adolescentes do sexo masculino internados em uma Unidade Socioeducativo na FASE-RS e participante do curso profissionalizante do Projeto Pescar compreende a categoria trabalho a partir das atividades do trabalho lícito, da profissionalização e do tráfico de drogas. A problemática foi desenvolvida em razão da hipótese de que a adesão por adolescentes ao tráfico de drogas pode ser mais bem compreendida através da aproximação da atividade ilícita à noção de trabalho. Para tanto, a pesquisa toma o trabalho não só como atividade produtora de bens de uso, mas também como categoria essencial à construção do ser social e como principal responsável pela distinção do indivíduo na hierarquia social. Metodologicamente, realizaram-se grupos focais com dez adolescentes, os quais foram orientados a discutir sobre trabalho, profissionalização e tráfico de drogas. A análise foi dividida em quatro eixos (significado das atividades, como elas são aprendidas e descritas, os prós e os contras de tais atividades, e como elas se relacionam com as competências comportamentais desenvolvidas pelo Projeto Pescar). Assim, observou-se uma percepção ambivalente na relação entre o tráfico de drogas e o trabalho. Por um lado, os adolescentes aproximam o tráfico à noção de trabalho, na medida em que a atividade é indicada como produtora de bens, responsável por possibilitar a materialização de ideações abstratas, e, sobretudo, atuante na distinção dos indivíduos, os quais estariam acima na hierarquia social em relação, por exemplo, ao “vagabundo”. Em contrapartida, o tráfico de drogas é afastado da nocão de trabalho quando a violência da atividade ilícita é exaltada, sobretudo a violência letal e a sua ameaça produzida pelos sujeitos pertencentes aos grupos rivais no mercado de drogas.This paper analyzes how a group of male adolescents confined at a house arrest and participant in the professionalizing course of the Pescar Project comprises the category of work based on the activities of legal work, professionalization and drug trafficking. The problematic was developed from the hypothesis that the adhesion by adolescents to the drug traffic can be better understood through the approximation of the illicit activity to the notion of work. Therefore, research takes work not only as an activity producing goods of use, but also as a category essential to the construction of the social being and as the main responsible for the distinction of the individual in the social hierarchy. Methodologically, focus groups were executed with ten adolescents, who were instructed to discuss work, professionalization and drug trafficking. The analysis was divided into four axes (meaning of activities, how they are learned and described, the pros and cons of such activities, and how they relate to the behavioral competencies developed at Pescar Project). Thus, there was an ambivalent perception of the relationship between drug trafficking and work. On the one hand, adolescents approach trafficking to the notion of work, once the activity is indicated as a producer of goods, responsible for enabling the materialization of abstract ideas and, above all, acting on the distinction of individuals, which would be above in the social hierarchy in comparison with the "tramp", for example. On the other hand, drug trafficking is kept away from the notion of work when the violence of the illicit activity is exalted, especially the lethal violence and its threat produced by the subjects belonging to the rival groups in the drug market