Consequencialismo e virtudes na epistemologia contemporânea: articulações e desafios

O Consequencialismo é bem conhecido como uma tese no campo da Ética, mas podemos também falar de um “consequencialismo” em Epistemologia. Este ensaio pretende apresentar um tipo geral de teoria da justificação epistêmica que, a despeito das características específicas da avaliação moral e da avaliação epistêmica, guarda parentesco com os modelos consequencialistas para a avaliação moral da ação: um modelo baseado em virtudes intelectuais. Além disso, pretendemos explorar alguns desenvolvimentos do projeto melhorativo associado a tal modelo no campo da Educação e, ao fim, indicar algumas dificuldades que rondam as teorias que utilizam o conceito de virtude, dificuldades estas postas pelos resultados das pesquisas situacionistas. Concluiremos defendendo que as abordagens de virtudes permanecem possuindo grande força para o campo da epistemologia, tanto em termos do modelo teórico adotado quanto em termos dos projetos melhorativos a ele associados, apesar de os argumentos situacionistas não poderem ser negligenciados na construção de propostas empiricamente bem fundamentadas

Cultivando o caráter intelectual em sala de aula: as virtudes intelectuais na epistemologia da educação

Dissertação (mestrado) - Universidade Federal de Santa Catarina, Centro de Filosofia e Ciências Humanas, Programa Programa de Pós-Graduação em Filosofia, Florianópolis, 2022.Nas últimas décadas, a epistemologia de virtudes tem se estabelecido como uma das principais vertentes da epistemologia contemporânea. Os principais conceitos a serem analisados na epistemologia de virtudes são aqueles referentes às excelências cognitivas exibidas por um bom agente conhecedor ? o que nós chamamos de ?virtudes intelectuais?. Embora estes conceitos mereçam ser explorados por si mesmos dentro da epistemologia, eles podem também ser valiosos em outras áreas. Mais recentemente, alguns teóricos das virtudes começaram a explorar as relações entre os conceitos de virtude e a teoria educacional, propondo a ideia de que um dos objetivos epistêmicos da educação é o de cultivar as virtudes intelectuais dos estudantes. O presente trabalho explora essa proposta. Em primeiro lugar, são discutidas as duas principais caracterizações do conceito de ?virtude intelectual?: o confiabilismo de virtudes e o responsabilismo de virtudes, juntamente com uma discussão a respeito da adoção do responsabilismo como pano de fundo teórico para o restante do trabalho. A discussão então se volta para duas teorias distintas a respeito dos fins epistêmicos da educação ? uma que se foca na aquisição de crenças verdadeiras ou de conhecimento, e outra interessada na obtenção de entendimento. Em seguida, a ?abordagem de virtudes? é discutida no contexto dos fins epistêmicos da educação, em conjunto com alguns de seus possíveis benefícios e algumas das estratégias pedagógicas que têm sido propostas como meios de educar para virtudes intelectuais. Após isso, discute-se a importância de educar para virtudes particulares, sendo estas a ?abertura intelectual? [?open-mindedness?], a ?humildade intelectual?, a ?inquisitividade? [?inquisitiveness?] e a ?virtude testemunhal?. No último capítulo, considera-se uma possível objeção à abordagem de virtudes intelectuais na educação, advinda de uma tese conhecida como ?situacionismo epistêmico?. O mote principal do situacionismo epistêmico é a ideia de que o nosso comportamento intelectual é melhor explicado por fatores das situações nas quais nos encontramos do que por traços de caráter robustos (como as virtudes). A discussão mostra, no entanto, que o situacionismo não é tão ameaçador quanto aparenta ser à primeira vista, e que poderíamos, inclusive, utilizar do que aprendemos com os situacionistas para aprimorar nossas tentativas de educar para virtudes intelectuais.Abstract: In the last few decades, virtue epistemology has established itself as one of the main branches of contemporary epistemology. The main concepts to be analyzed in virtue epistemology are those that refer to the cognitive excellences exhibited by a good thinker ? what we call ?intellectual virtues?. Although those concepts are worthy of epistemological exploration in their own right, they can also be valuable in other domains. In recent years, some virtue theorists have started to explore the relationship between virtue concepts and educational theory, proposing that one of the epistemic aims of education is to cultivate students? intellectual virtues. The present work explores that proposal. First, the two main characterizations of the concept of ?intellectual virtue? are discussed: virtue reliabilism and virtue responsibilism, along with a discussion about the adoption of responsibilism as our theoretical framework. The discussion then turns to two different theories regarding the epistemic aims of education ? one focused on the acquisiton of true belief or knowledge and the other interested in the attainment of understanding. Then, the ?intellectual virtues account? is discussed in the context of the epistemic aims of education, in addition to some of the benefits we could derive from it and some pedagogical strategies that have been proposed as a means to educate for intellectual virtues. After that, the importance of educating for particular virtues is addressed, these being ?open-mindedness?, ?intellectual humility?, ?inquisitiveness? and ?testimonial virtue?. The last chapter addresses a possible objection to the intellectual virtues account in education, derived from a thesis known as ?epistemic situationism?. The central theme of epistemic situationism is the idea that our intellectual behavior is better explained by factors of the situations we find ourselves in than by robust character traits (such as intellectual virtues). The discussion shows, however, that epistemic situationism is not as threatening as it appears to be and that we could use what we have learned from the situationists to improve our attempts to educate for intellectual virtues