Tese de douramento em História (ramo de conhecimento em Idade Contemporânea (UMINHO) e História Social (UFBA)Na Europa e na América as feiras sempre tiveram uma importância muito grande,
ultrapassando o seu papel comercial nas cidades e transformando-se, em muitas sociedades, em
entrepostos de trocas culturais e de aprendizado, nos quais os transeuntes de várias localidades se
congregam e estabelecem laços de sociabilidade.
No período atual de propagação e consolidação do ideário e práticas da globalização
contemporânea, apesar de o capitalismo periférico se instalar a uma velocidade acentuada, com a
emergência de novos lugares de consumo — a exemplo dos supermercados e hipermercados, centros
comerciais e portais de consumo —, as feiras continuam a existir com características múltiplas, de
polissémicas sociabilidades, um espaço de mobilidades comerciais e sociais que se concretizam
através das diversificadas transformações ocorridas, não só na localização geográfica e produtos
comercializados, mas também nas formas de fazer a feira: atos, gestos, performances corporais,
movimentos e dizeres, fomentados pelos atores sociais que frequentam e transitam pelos seus
labirintos.
Neste sentido surgiu o interesse deste estudo, qual seja, o de perceber como estes comércios
tradicionais conseguem conviver e resistir aos impactos causados pela globalização na atualidade. Para
responder a este questionamento, tivemos que trilhar dois caminhos: primeiro identificar os impactos e
posteriormente as estratégias de continuidade e de descontinuidade que os personagens das feiras
tiveram que assumir para que estas se mantivessem na atualidade como lugares de consumo.
Percebemos inicialmente que, diante da efervescência da globalização, mesmo que as feiras busquem
a manutenção, a conservação de algumas tradições, é notoriamente impossível que estes mercados
tradicionais se mantenham no decurso do tempo, sem alterações. Para entendermos melhor tais táticas e estratégias, elegemos como loci de investigação as
feiras das urbes minhotas portuguesas — nomeadamente Ponte de Lima, Barcelos e Vila do Conde — e
as nordestinas brasileiras — de Campina Grande-PB, de Caruaru-PE e a feira de São Joaquim,
localizada em Salvador-BA. Com as particularidades que as aproximam e distanciam foi possível
percebermos, de modo comparativo, os impactos da globalização nas feiras destes dois universos.
Tivemos em conta os valores históricos, sociais, culturais e económicos da cidade que as acolhe.
Para responder às indagações, delimitamos a pesquisa entre os anos de 1986 e 2007, por
entendermos ser este o período em que ocorreram transformações importantes na Europa, bem como
em Portugal que aderiu à CEE. Na América Latina, o Brasil vivia o fim do período ditatorial e a
redemocratização política. Ambos os processos contribuíram para a abertura económica de mercado, a liberalização do comércio e a implantação da política neoliberal influenciada pela ideologia globalizada
do capitalismo de mercados, diante da crise dos Estados, cujas funções estavam em processo de
redefinição.
Quanto aos impactos da globalização, percebemos o desemprego, informalidade, migração e
imigração, diversidade cultural, hibridação identitária, implantação de novos lugares de consumo,
adaptação à nova lógica de mercado frente aos blocos económicos, abertura de mercado aos produtos
importados, com destaque para os produtos chineses. Em relação às estratégias e adaptações
utilizadas pelos feirantes detetamos as substituições das mercadorias e das formas de pagamento. Em
relação ao poder público percebemos que este, sobretudo no Brasil, tem iniciado a busca pelo
reconhecimento destes lugares como património imaterial, destacando as políticas de salvaguarda e os
projetos de requalificações destes lugares. Entretanto, apesar das ressignificações e readequações às
dinâmicas de mercado, as feiras contemporâneas passam por uma elevada crise de sobrevivência, de
descontinuidade. Se de fato os interesses para a sua continuidade forem legítimos, é necessário adotar
uma política de incentivo e valorização destes espaços emergentes.
A metodologia utilizada privilegiou os relatos da História Oral, mas também foi pesquisado um
conjunto diversificado de fontes de outros tipos, incluindo registros de diferentes instituições públicas e
notícias de jornal. No trabalho de campo, além das entrevistas com feirantes e fregueses, utilizamos
levantamentos fotográficos e cartográficos. Foram entrevistadas cerca de 240 pessoas (120 no Brasil e
120 em Portugal). Optamos por preservar as identificações dos depoentes atribuindo-lhes
pseudônimos.En Europe et en Amérique les foires ont toujours eu une grande importance, allant ainsi audelà
de leur simple rôle commercial dans les villes et se transformant dans de nombreuses sociétés en
lieux d’échange culturel et d’apprentissage, dans lesquels les passants de différentes localités
s’agrègent et construisent des liens de sociabilité.
Dans la période actuelle de consolidation et de diffusion des idéaux et des pratiques de la
mondialisation contemporaine, et en dépit du fait que le capitalisme périphérique s’installe à grande
allure, avec l’émergence de nouveaux lieux de consommation – à l’instar des supermarchés et des
hypermarchés, des magasins et des centre commerciaux –, les foires continuent d’exister,recouvrant
descaractéristiques multiples, desformes de sociabilitéspolysémiques, des espaces
demobilitécommerciale et sociale qui se concrétisent avec les divers changements survenus, non
seulement dans la localisation géographique et dans les produits commercialisés, mais aussi dans les
façons d’aménagerlafoire : les actes, les gestes, les performancescorporelles, les mouvements et les
motsproduits par les acteurs sociaux qui la fréquentent et circulent à travers ses labyrinthes.
C’est ainsi qu’a surgi l’intérêt pour cette étude, à savoir de comprendre comment ces lieux de
commerce traditionnelsarrivent à vivre avec et à résister aux impacts causés de nos jours par la
mondialisation. Pour répondre à ces questionnements, nous avons dû emprunter deux voies :
premièrement identifier les impacts, puis deuxièmement identifier les stratégies de continuité et de
discontinuité que les personnages des foires ont eu à assumerpour que celles-ci puissent subsister
jusqu’à nos jours en tant que lieux de consommation. Nous avions d’emblée comprisque si les foires
cherchaient à subsister, à préserver certaines de leurs traditions, face à l’effervescence de la
mondialisation, il était notoirement impossible que ces marchés traditionnels puissent survivre dans le
temps, sans changements.
Pour mieux comprendre ces tactiques et ces stratégies, nous avons choisi comme
locid’investigation les foiresdes villes portugaisesdu Minho – et plus précisément de Ponte de Lima,
Barcelos et Vila do Conde–ainsi que les foires du nord-estbrésilien–et plus particulièrement Campina
Grande-PB, Caruaru-PE et celle deSão Joaquim, située à Salvador de Bahia. Avec les particularités qui
les rapprochent et les distancient il a été possible de comprendre, de façon comparative, l’impact de la
mondialisation sur ces foires dans cesdeux univers. Nous avons pris en compte lesvaleurs historiques,
sociales, culturelles et économiques des villes qui accueillent ces foires. Pour répondre à ces questionnements, nous avons réalisé notre recherche durant la période
1986/2007, qui dans notre optique est marquée par de profonds changements en Europe, et plus
spécifiquement au Portugal,avec l’intégration à la CEE. En Amérique Latine, le Brésil a connu la fin de
la période dictatoriale et une nouvelle démocratisation politique. Ces deux processus ont contribué à
l’ouverture économique du marché, à la libéralisation des échanges et à la mise en oeuvre de politiques
néolibérales influencées par l’idéologie du capitalisme mondialisé des marchés, face à la crise des
États et à la redéfinition de leurs fonctions.
En ce qui concerne les impacts de la mondialisation, nous avons mis en avant le chômage,
l’informalité, la migration et l’immigration, la diversité culturelle, l’hybridation identitaire, la mise en
oeuvre de nouveaux lieux de consommation, l’adaptation à la nouvelle logique du marché face aux blocs
économiques, l’ouverture du marché aux produits importés, en particulier aux produits chinois. En ce
qui concerne les stratégies et les adaptations utilisées par les marchands des foires, nous avons
détecté des changements au niveau des produits et des formes de paiement. Par rapport aux pouvoirs
publics, enparticulier au Brésil, nous nous sommes rendus compte que ceux-ci ont initié une lutte pour
la reconnaissance des foires comme patrimoine immatériel, en mettant l’accent sur les politiques de
sauvegarde et les projets de requalification de ces lieux. Cependant, en dépit des recadrages et des
réadaptationsau dynamisme des marchés, les foiressubissent une grave crise de survie et de
discontinuité.Alors, si les intérêts pour leurpersistance sont légitimes, il est nécessaire d’adopter une
politique d’encouragement et de promotion de ces espaces émergents.
La méthodologie utilisée privilégie les récits de l’histoire orale, mais nous avons égalementeu
recours à un ensemble élargi de sources très diversifiées, incluant les registresde différentes institutions
publiques ainsi les informations des journaux. Durant les travaux de terrain, en plus des entrevues avec
les commerçants et les clients, nous avons fait appel à des registres photographiques et
cartographiques. Nous avons interviewé 240 personnes (120 au Brésil et 120 au Portugal). Nous avons
choisi de préserver l'identification des personnes interrogées en leur donnant des pseudonyme