Rockembach, Moisés

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PRISMA.COM n.º 42 ISSN: 1646 - 3153  PRISMA.COM (42) 2020, p. 117-121 DOI: https:// doi.org/10.21747/16463153/42r2 117 Wild Wild Web: What the history of the Wild West teaches us about the future of the Digital Society  Moises Rockembach UFRGS rockembach@yahoo.com.br        PRISMA.COM n.º 42 ISSN: 1646 - 3153    118 As discussões sobre ética e filosofia da informação, bem como a regulação no âmbito digital nunca estiveram tão presentes como hoje. No momento em que grandes corporações concentram a posse de boa parte dos dados e recursos digitais, questiona-se quais os benefícios e malefícios desta dinâmica de poder. A partir de dois pólos geoeconómicos bem definidos, primeiramente os Estados Unidos e, mais recentemente, a adição da China neste jogo pelo controle da informação, temos o que pode-se chamar da disputa pelo "capital do século XXI", ou seja, os dados na web e bancos de dados. Isto não envolve somente a posse destes dados, mas, nomeadamente, a capacidade de processar e analisá-los. Mesmo com alguns avanços em termos de legislação nos últimos anos, ainda nos encontramos em um período dito "selvagem" no que diz respeito a regulação destas atividades e é neste sentido que Tim Cole propõe o livro Wild Wild Web: o que a história do Velho Oeste nos ensina sobre o futuro da Sociedade Digital (Wild Wild Web: What the history of the Wild West teaches us about the future of the Digital Society, publicado também em alemão como Wild Wild Web: Was uns die Geschichte des Wilden Westens über die Zukunft der digitalen Gesellschaft lehrt, ambos em 2018). Cole nasceu nos Estados Unidos, mas viveu boa parte do tempo na Alemanha, é jornalista especializado em tecnologia desde os anos 1990, um dos primeiros blogueiros da Alemanha (1995), e escreve sobre industria tecnológica, economia e transformação digital nos Estados Unidos e Alemanha1. Autores como Bell (1974) e Castells (2005) já anunciavam o que chamamos, respectivamente, por Sociedade da Informação e Sociedade em Rede, antevendo o capitalismo informacional e a mudança econômica que sobrevieram nos anos seguintes, com ênfase nos ambientes tecnológicos.  A internet pode ser considerada uma estrutura recente na história da sociedade, especialmente o ambiente da world wide web, que tem início com Tim Bernees Lee em 1991. O que é colocado por Tim Cole em seu livro é que o ambiente web possui correspondência com o oeste selvagem norte-americano, um vasto território a ser descoberto e, por vezes, domado, o que historicamente no caso americano levou a dizimação da população nativa. Quais são as semelhanças entre o velho oeste selvagem e o ambiente da internet de hoje? Muitos paralelos entre o wild west e a wild web são levantados por Cole1, desde a forma de navegá-los, respectivamente o cavalo e o computador/navegador (browser) ou o motor a vapor que pavimenta o caminho para o oeste e o motor de busca que dá acesso a web, representado pelo Google, que agora faz parte de algo maior, uma das empresas do conglomerado chamado Alphabet (https://abc.xyz), uma holding da qual fazem parte também empresas como  O que se percebe é que no velho oeste (wild west), da mesma forma como o momento que vivemos na internet, não há regras claramente definidas. Assim como existiram os velhos barões do oeste norte-americano (John Rockefeller, Corneluis Vanderbilt, Andrew Carnegie, John Pierpont Morgan), os novos barões nomeados por Tim Cole (Jeff Bezos, Mark Zuckerberg, Larry Page e o já falecido Steve Jobs) representam o mundo tecnológico e suas respectivas empresas são representadas pelo acronimo GAFA: Google, Apple, Facebook, Amazon. Se por um lado são celebrados como empresas inovadoras, por outro, possuem problemas relacionados à privacidade e o mal uso dos dados pessoais. A Amazon e Jeff Bezos, por exemplo, comparado por Cole com Corneluis Vanderbilt, que procura controlar toda cadeia de valor dos produtos e que com seus serviços de nuvem, possui ainda o controle sobre grandes                                                           1 Tim Cole é editor-chefe da revista Smart Industry (www.smart-industry.net) e mantém seu site pessoal em inglês e alemão: http://www.cole.de a Waymo, especializada em carros autônomos e a DeepMind, com foco em inteligência artificial. PRISMA.COM n.º 42 ISSN: 1646 - 3153    119 conjuntos de dados, do armazenamento ao seu processamento. A concentração de poder e recursos financeiros nas mãos destas Big Techs coloca a sociedade em um desequilíbrio que pode ser perigoso, com o uso indiscriminado de nossos dados. A expansão destas chamadas Big Techs não demonstra razões de diminuir, autores como Webb (2019) já falam em nove grandes empresas tecnológicas ou "Big Nine", acrescentando a Microsoft e a IBM ao grupo dos Estados Unidos e as chinesas Tencent, Baidu e Alibaba, impactando inclusive em uma nova tendência pela disputa da liderança no mercado de Inteligência Artificial mundial. A falta de transparência de privacidade nos dispositivos da Apple, o mal uso de dados da plataforma Facebook, representado por casos como o da Cambridge Analytica - atualizado agora com o boicote que o Facebook enfrenta nos discursos de ódio, analisado sobre a hashtag #stophateforprofit, o monopólio que a Amazon exerce nas cadeias produtivas e de distribuição de produtos e a onipresença que o Google possui como motor de busca da internet são alguns dos desequilíbrios apontados por Cole sobre o denominado GAFA (Google, Apple, Facebook e Amazon).  Estas empresas citadas, juntamente com outras Big Techs, tem o poder de se tornarem mais poderosas que muitos governos, moldar mercados e influenciar a opinião pública, o poder de vigilância está latente neste contexto. O Facebook já possui mais usuários do que a China ou a Índia, ou seja, se fosse um país, seria o maior do mundo. As redes sociais, inicialmente uma forma de nos conectarmos e criar novas possibilidades de produção, publicação e compartilhamento de conteúdos, têm agora sido alvo de críticas, por servir de fonte de manipulação e desinformação. Cole defende que um ceticismo sobre o papel da industria de tecnologia poderá nos trazer o amadurecimento necessário para a atuação das empresas e uso das tecnologias de forma consciente e pergunta: em um mundo onde as decisões de adoção de tecnologia são fundamentadas em lucratividade e eficiência, é possível rejeitar determinadas soluções baseado em questões éticas?  Os dados não são criados da mesma forma, eles podem ser divididos entre fechados, compartilhados e abertos, multiplos sujeitos fazem parte da criação,  processamento, distribuição e armazenamento. Entretanto, Cole afirma que os debates sobre privacidade de dados não tem levado estas questões em consideração, gerando contradições no uso e tratamento de grandes conjuntos de dados, ou Big Data. O acúmulo de dados é o modelo de negócio vigente, que permite análises mais precisas de comportamento e perfis para o mercado.  Uma das questões colocadas por Tim Cole tem relação com o tamanho e escala destes conglomerados tecnológicos que se formam. A fusão e, principalmente, compra de empresas tecnológicas acaba sendo obstáculo à competitividade, empresas como o Facebook, Whatsapp e Instagram pertencem ao mesmo grupo, assim como todo o conglomerado chamado Alphabet, que tem o Google como principal representante. O compartilhamento e cruzamento de dados entre plataformas gera uma desvantagem competitiva no mercado e um poder a favor destas grandes empresas. Os dados coletados são uma das bases do marketing digital, por isso, como são tratadas as informações sensíveis, como é realizado o cruzamento de dados e quem tem acesso a estes dados são questões importantes a serem respondidas e esclarecidas. A existência de legislações de proteção de dados, como o RGPD (Regulamento Geral sobre a Proteção de Dados) européia, infelizmente, não tem impedido as grandes empresas tecnológicas de cruzar fronteiras éticas e, por vezes, pagar multas por estas ações. Por isso, PRISMA.COM n.º 42 ISSN: 1646 - 3153    120 alguns indícios tem apontado para um declínio deste modelo da web com menos regulamentação e direcionando para um modelo mais crítico e responsável. Para isto é preciso abrir espaço para a competição, uma menor concentração de conglomerados e maior valorização da privacidade digital. A geração atual, que cresceu com o desenvolvimento da web e das redes sociais, torna-se aos poucos mais consciente da wild web e do poder dos algoritmos e dos filtros-bolha, que nos trazem, por exemplo, recomendações conforme o nosso perfil, mas também desinformação e polarização política, as plataformas não somente representam o que a sociedade quer expressar, mas também condicionam comportamentos. Neste sentido, Cole também aponta para a necessidade dos legisladores em discutir e aprovar regras atualizadas sobre a atuação das Big Techs e que não sejam somente teóricas, mas também aplicáveis.  O pagamento pelo uso das plataformas de forma "gratuita" acontece pelos dados fornecidos e neste caso Cole repete o que muitos autores já disseram, que quando você não está pagando pelo produto, "você" é o produto, seus dados servem como análise de segmentação comportamental e podem resultar em manipulações injustas e problemas relacionados a geração de mercados de informação assimétrica.  Apesar de muitos indivíduos demonstrarem preocupação com a privacidade no meio digital, suas ações não correspondem a estas preocupação, seja aceitando termos de uso que dão direito ao coleta e uso de dados pelas plataformas e por terceiros, seja com a exposição nas redes, o que gerou até termos específicos, como o Shareting (sharing + parenting) que exemplifica o excesso de exposição de dados das crianças pelos seus pais e os efeitos destes excessos. Segundo Cole, o velho oeste americano pode nos ensinar algumas lições como observar o excesso de poder que o GAFA possui e pensar em como reduzir este poder, por exemplo, com o desmembramento em empresas menores. As principais empresas da web precisam do que Cole chama de " supervisão adulta", isto implica a necessidade de um comitê de direitos digitais para realizar esta supervisão. Assim como foi no velho oeste, a sociedade digital precisa de regras legais para o funcionamento apropriado. Mais do que isto, é preciso um novo conjunto de guias morais e éticos a ser comunicado nas escolas, universidades, centros de treinamento e empresas. As leis e políticas precisam estar de acordo com uma ética digital, mas somente a regulação pode não ser suficiente.  O livro de Tim Cole, comparando o Wild West com a Wild Web, nos traz questões importantes para reflexão. As grandes empresas tecnológicas fazem parte do nosso dia a dia, nossa economia e vida social. Uma ética digital pode ter melhor aderência quando pensada como uma extensão da ética do mundo real, com novos problemas e dilemas aplicados as plataformas digitais. Desta forma, é preciso refletir, representar e colocar em prática as virtudes éticas nestes ambientes, o que nos traz novos e grandes desafios.   PRISMA.COM n.º 42 ISSN: 1646 - 3153    121 Referências Bibliográficas  BELL, D. (1974). O Advento da Sociedade Pós-Industrial. São Paulo: Cultrix, 1974. Castells, M. (2005). A Sociedade em rede. Volume I. 8a edição. Tradução de Roneide Venâncio Majer. São Paulo: Paz e Terra. COLE, T. (2018). Wild Wild Web: What the history of the Wild West teaches us about the future of the Digital Society. Forsthaus Verlag. WEBB, A. (2019). The big nine: How the tech titans and their thinking machines could warp humanity. Hachette UK.  

Wild Wild Web: what the history of the Wild West teaches us about the future of the digital society

https://lume.ufrgs.br/bitstream/10183/213877/1/001117384.pdf

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