Injúria inalatória por exposição a incêndio : seguimento funcional respiratório e efeitos de longo prazo sobre a capacidade de exercício e qualidade de vida em uma amostra das vítimas da tragédia da Boate Kiss

Abstract

Introdução: A exposição a incêndio pode levar a óbito e causar injúria inalatória nos sobreviventes. Os sobreviventes podem apresentar complicações relacionadas à queimadura de vias aéreas e estas complicações podem ser precoces ou tardias. Objetivos: Identificar o impacto da gravidade da injúria inalatória provocada por exposição a incêndio nas complicações de curto prazo e na evolução funcional pulmonar, capacidade de exercício e bem estar dos indivíduos em longo prazo. Métodos: Dois estudos foram realizados: Um estudo de coorte com 18 pacientes vítimas de queimaduras e injúria inalatória confirmada por fibrobroncoscopia, a qual foi estratificada como leve/moderada ou grave. Foram identificadas as complicações precoces e realizado seguimento funcional pulmonar por até 40 meses. Um segundo estudo transversal com 15 indivíduos expostos a incêndio (38,2 ± 2,6 meses após o evento) e 15 controles foi realizado para estudar capacidade de exercício, qualidade de vida e saúde mental dos expostos. Para estudo dos dados foi utilizado o modelo de equações de estimações generalizadas, testes t de Student, Mann-Whitney ou qui-quadrado. O nível de significância estatística adotado foi 0,05. Resultados: Os indivíduos com injúria inalatória grave tinham, em comparação com os que apresentavam injúria inalatória leve a moderada, maior superfície corporal queimada, maior tempo em ventilação mecânica, maior taxa de síndrome do desconforto respiratório agudo e de pneumonia associada à ventilação mecânica e permaneceram mais tempo hospitalizados (p<0,05). Houve normalização das variáveis espirométricas, que foi mais precoce no grupo com injúria inalatória leve/moderada. As principais sequelas funcionais pulmonares em longo prazo, as quais não se relacionaram com a gravidade da injúria inalatória inicial, foram o aumento do volume residual (83,3% dos casos) e a redução da capacidade de difusão pulmonar (55,6% dos casos). A capacidade de exercício foi comparável entre os grupos, exceto por uma maior relação VE/VCO2 no grupo exposto. Sintomas depressivos, tendência à ansiedade e pior qualidade de vida foi observada no grupo exposto. Cerca de um quinto dos expostos ao incêndio apresentaram screening positivo para estresse pós-traumático. Conclusões: Complicações respiratórias precoces foram mais frequentes nos indivíduos com injúria inalatória grave. As sequelas funcionais pulmonares de longo prazo foram o alçaponamento aéreo e a redução da capacidade de difusão que não se associaram com o grau de injúria inalatória inicial. A capacidade de exercício estava preservada em longo prazo, mas foi observado achado sugestivo de ineficiência ventilatória. Sintomas depressivos, tendência à ansiedade, pior qualidade de vida foram mais frequentes no grupo exposto e cerca de um quinto dos expostos apresentou achados compatíveis com estresse pós-traumático.Introduction: Exposure to fire may lead to death and cause inhalation injury to survivors. Survivors may have complications related to airway burns and these complications may appear early or late in the follow-up. Objectives: To identify the impact of the severity of inhalation injury caused by fire exposure on short-term complications and pulmonary functional behavior on long-term, and to study exercise capacity and well-being of exposed individuals on long-term. Methods: Two studies were performed: A cohort study of 18 individuals with burns and fibrobronchoscopy-confirmed inhalation injury that was stratified as mild / moderate or severe. Early complications were identified and lung function was measured for up to 40 months. A cross-sectional study with 15 fire exposed individuals (38.2 ± 2.6 months after the event) and 15 controls was conducted to assess the long-term effects of fire inhalation injury on exercise capacity, mental health and quality of life. Data were studied using the generalized estimation equation model, Student's t-test, Mann-Whitney or chi-square test. The level of statistical significance adopted was 0.05. Results: Individuals with severe inhalation injury had, compared with those with mild to moderate inhalation injury, greater burned body surface area, longer time on mechanical ventilation and hospitalization, higher rate of acute respiratory distress syndrome and ventilator-associated pneumonia (p <0.05). A normalization of spirometric variables occurred earlier in the group with mild/moderate inhalation injury. The main long-term pulmonary functional sequelae, which were not related to the severity of the inhalation injury, were increased residual volume (83.3% of cases) and reduced lung diffusion capacity (55.6% of cases). Exercise capacity was comparable between groups, except for a higher VE/VCO2 ratio in the exposed group. Depressive symptoms, a tendency towards increased anxiety symptoms and worse quality of life were observed in the exposed group. About one-fifth of those exposed to fire showed positive screening for posttraumatic stress. Conclusions: Early respiratory complications were more frequent in individuals with severe inhalation injury. Long-term lung functional sequelae were air trapping and reduced diffusion capacity, which were not associated with the degree of initial inhalation injury. Exercise capacity was preserved over the long term, except for a finding suggestive of ventilatory inefficiency. Depressive symptoms, a tendency to increased anxiety symptoms, poorer quality of life were more frequent in the exposed group. About one fifth of the cases had findings consistent with posttraumatic stress

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