Narrativas híbridas e a construção de subjetividades no documentário Fogo no mar

Abstract

Nos últimos 20 anos mais de 400 mil imigrantes da África e do Oriente Médio que rumavam para a Europa chegaram até à ilha de Lampedusa, na Itália – muitos destes sem vida ou com precárias condições de saúde. O documentário Fogo no mar (2016), de Gianfranco Rosi, acompanha um ano desta delicada realidade enquanto regista o cotidiano dos sicilianos locais na região que possui pouco mais de cinco mil habitantes em 20 quilômetros de extensão terrestre cercada pelo Mar Mediterrâneo. Na obra encontram-se elementos narrativos oriundos da ficção, ainda que a sua concepção e construção seja documental. No presente artigo, consideramos as perspectivas documentais e ficcionais no desenvolvimento desta narrativa, buscando compreender as percepções subjetivas e as suas correlações com a leitura individual potencializada aos espectadores. A abordagem do cineasta é observacional e pouco reflexiva, propondo aos espectadores múltiplas leituras, essencialmente subjetivas a seus próprios valores e pensamentos acerca dos temas abordados pela obra. Há um contraste declarado entre a desesperadora realidade dos refugiados e imigrantes com a pacífica existência dos moradores locais, levando-nos à reflexão sobre as múltiplas identidades que ora nos separam, ora nos unem. No enredo, tal dicotomia é explícita, sendo de fácil percepção as identidades excludentes, binárias e classificativas. Os refugiados permanecem assim na ambivalência: são estrangeiros? Imigrantes? Ilegais? Desta forma, tanto a obra cinematográfica quanto este artigo se posicionam de modo a proporcionar e ampliar o diálogo acerca do fluxo imigratório na Europa contemporânea, uma vez que em 2017 já houve mais de três mil mortes dentre refugiados no Mar Mediterrâneo, segundo a Organização Internacional para as Migrações (OIM). Para tal, o presente estudo busca compreender quais são as manifestações narrativas próprias ao documentário e quais são comuns à ficção empregadas neste filme, pontuando o supracitado hibridismo narrativo e a sua subjetividade através da análise textual e poética

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