Motivações pragmáticas para o uso de dupla negação : um estudo do fenômeno em português europeu

Abstract

A possibilidade de expressar a negação sentencial de modos distintos é fato reconhecido em diversas línguas. Entre essas possibilidades está a estratégia que consiste em utilizar mais de um operador de negação sentencial expressando apenas uma operação de negação, o que é referido por alguns autores como dupla negação. As razões para o surgimento dessa forma alternativa de negação têm sido motivo de algum debate em Pragmática. Para a maioria dos autores, a dupla negação surge como estratégia discursiva para expressar ênfase. Em uma série de trabalhos, Scott Schwenter tem defendido a hipótese de que a dupla negação surge como forma de marcar conteúdo ativado no discurso. Lima (2013), elaborando sobre as ideias de Schwenter, defende a ideia de que, em seus estágios iniciais de uso, enunciados de dupla negação cumprem a função pragmática de sinalizar manutenção de tópico sentencial. Este trabalho investiga usos de dupla negação em entrevistas sociolinguísticas, procurando identificar sua função discursiva a partir de uma análise que leva em consideração os conceitos de tópico e comentário propostos por Van Kuppevelt (1995). A partir dessa análise, propõe a hipótese de que em um estágio inicial, a dupla negação cumpre uma dupla função: sinalizar a apresentação de comentário a (sub)tópico, próximo ou distante, e sinalizar continuidade tópica, ou seja, disposição de dar continuidade à apresentação de comentários em (sub)tópicos subsequentes. Para testar essa hipótese, realiza-se um teste de percepção aplicado em falantes da cidade de Lisboa. O resultados do teste são analisados e comparados com os de outro teste semelhante realizado com falantes residentes na cidade de Porto Alegre em 2013. Esses resultados revelam que, nas duas localidades, a aceitação de enunciados de dupla negação diminui à medida que se afasta da função de expressar a manutenção de tópico discursivo, oferecendo suporte para a hipótese testada.The possibility of expressing sentential negation in different ways is acknowledged in several languages. Among these possibilities, there is the strategy of using more than one operator of negation expressing just one denial, which is referred by some authors as double negation. The reasons for the emergence of this alternative form of denial have been the objective of some debate in Pragmatics. For most authors, the double negation appears as a discursive strategy to express emphasis. In a series of papers, Scott Schwenter has defended the hypothesis that the double negation arises as a strategy to indicate activated content in speech. Lima (2013), elaborating on the Schwenter ideas, takes the view that, in its early stages of use, the double negation meet the pragmatic function of signaling sentence topic maintenance. This work investigates the uses of double negation in sociolinguistic interviews, trying to identify its discursive function from an analysis that takes into account the concepts of topic and comment proposed by Van Kuppevelt (1995). From this analysis, we propose the hypothesis that at an early stage, the double negative fulfills two functions: to signal the presentation of comment to a (sub) topic, near or far, and to signal topical continuity, i.e willingness to continue for comments on subsequent (sub) topics. A perception test was applied to speakers from Lisbon to test this hypothesis. The test results are analyzed and compared with those of other similar test applied to speakers from Porto Alegre in 2013. These results show that in both locations, the acceptance of statements of double negation decreases as it moves away from the function to express the maintenance of discursive topic, providing some support for the hypothesis tested

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