research

Igreja, Estado e Família no debate sobre o ensino particular em Portugal (meados do século XX)

Abstract

O debate sobre o papel do ensino particular, na sua relação com o ensino público, emergiu com particular acuidade em alguns momentos do percurso histórico-educativo português na segunda metade do século XIX e ao longo de todo o século XX. A consolidação do sistema público de ensino foi um processo paralelo ao da afirmação do poder do Estado e um factor essencial para a sua consecução. Esse facto não pôs em causa a permanência de um sector particular com alguma relevância, embora variável conforme os momentos e respectivos contextos. A Igreja Católica continuou, nesse âmbito, a ocupar um lugar importante na oferta escolar e na escolarização dos portugueses, em correspondência com o seu entendimento, mesmo durante o período liberal, como instituição fundamental para a socialização em valores tidos por essenciais para a preservação dos equilíbrios sociais. A «liberdade de ensino» surge, nas suas diversas dimensões, como elemento central do referido debate, entendida, simultaneamente, como «liberdade de ensinar», ou seja, a possibilidade de abrir escolas, e como «liberdade de aprender», ou seja, o direito de escolha das escolas pelas famílias. O Estado Novo português (do início dos anos 30 até 1974) foi, não obstante o seu carácter tendencialmente totalitário, um momento privilegiado desse debate, em particular no que se refere às relações entre o Estado e a Igreja e sua expressão no terreno educativo. É inquestionável a afirmação do poder do Estado que procura controlar, de forma estrita, todas as iniciativas desenvolvidas nesse âmbito. Embora tanto a Constituição de 1933 como a Concordata de 1940, entre o Estado português e a Igreja Católica, consagrem a «liberdade de ensino», o Estatuto do Ensino Particular, publicado em 1949, contribui para reforçar a dependência do ensino particular em relação ao modelo «oficial», bem como os mecanismos de controlo a que ele estava sujeito. Mesmo assim, este é um período de franca expansão quantitativa do ensino particular, em particular ao nível do ensino liceal, até porque o Estado procura conter artificialmente a oferta, num período que começa a testemunhar uma procura crescente neste nível de ensino, mais sensível a partir do final dos anos 50. Apesar da cumplicidade política e ideológica mantida entre o salazarismo e a Igreja Católica, bem visível no papel atribuído ao catolicismo no currículo escolar, é igualmente notória a resistência que amplos sectores da Igreja oferecem à secundarização do ensino religioso católico e à sua assunção como meramente supletivo em relação ao ensino público. A finalidade da presente comunicação é, então, circunscrever os termos do debate então travado sobre os papéis respectivos da Igreja, da Família e do Estado na educação (direitos e deveres recíprocos), tendo como referência o ensino particular, entre as décadas de 40 e de 60 do século XX. Para tal, procederemos à análise de conteúdo de um conjunto diversificado de fontes, incluindo diplomas legais, artigos de revistas pedagógicas, actas de congressos, documentos da Igreja Católica e de entidades ligadas a esse sector do ensino, entre outras publicações

    Similar works