Tese de doutoramento, Ciências Geofísicas e da Geoinformação (Meteorologia), Universidade de Lisboa, Faculdade de Ciências, 2011A strategy is presented that allows deriving a new index for burned area
discrimination over the Amazon and Cerrado regions of Brazil. The index is based on
information from the near-infrared (NIR) and middle-infrared (MIR) channels of the Moderate
Resolution Imaging Spectroradiometer (MODIS). A thorough review is undertaken of existing
methods for retrieving MIR reflectance and an assessment is performed, using simulated and
real data, about the added value obtained when using the radiative transfer equation (RTE)
instead of the simplified algorithm (KR94) developed by Kaufman and Remer (1994), the
most used in the context of burned area studies. It is shown that use of KR94 in tropical
environments to retrieve vegetation reflectance may lead to errors that are at least of the
same order of magnitude of the reflectance to be retrieved and considerably higher for large
values of land surface temperature (LST) and solar zenith angle (SZA). Use of the RTE
approach leads to better estimates in virtually all cases, with the exception of high values of
LST and SZA, where results from KR94 are also not usable. A transformation is finally
defined on the MIR/NIR reflectance space aiming to enhance the spectral information such
that vegetated and burned surfaces may be effectively discriminated. The transformation is
based on the difference between MIR and NIR in conjunction with the distance from a
convergence point in the MIR/NIR space, representative of a totally burnt surface. The transformation allows defining a system of coordinates, one coordinate having a small scatter
for pixels associated to vegetation, burned surfaces and soils containing organic matter and
the other coordinate covering a wide range of values, from green and dry/stressed vegetation
to burned surfaces. The new set of coordinates opens interesting perspectives to
applications like drought monitoring and burned area discrimination using remote-sensed
information.O coberto vegetal da superfície da Terra tem vindo a sofrer mudanças, por vezes
drásticas, que conduzem a alterações tanto na rugosidade da superfície terrestre como no
seu albedo, afectando directamente as trocas de calor sensível e latente e de dióxido de
carbono entre a superfície terrestre e a atmosfera (Sellers et al., 1996). Neste contexto, as
queimadas assumem um papel de extremo relevo (Nobre et al., 1991; O’Brien, 1996; Xue,
1996) na medida em que constituem uma das mais importantes fontes de alteração do
coberto vegetal, resultando na destruição de florestas e de recursos naturais, libertando
carbono da superfície continental para a atmosfera (Sellers et al., 1995) e perturbando as
interacções biosfera-atmosfera (Levine et al., 1995; Scholes, 1995) através de mudanças na
rugosidade do solo, na área foliar e noutros parâmetros biofísicos associados ao coberto
vegetal. Ora, neste particular, a Amazónia Brasileira constitui um exemplo notável de
mudanças no uso da terra e do coberto vegetal nas últimas décadas, como resultado da
desflorestação induzida pelo homem bem como por causas naturais (Gedney e Valdes,
2000; Houghton, 2000; Houghton et al., 2000; Lucas et al., 2000), estimando-se que as regiões tropicais sejam responsáveis por cerca de 32% da emissão global de carbono para
a atmosfera (Andreae, 1991). Neste contexto, a disponibilidade de informações
pormenorizadas e actualizadas sobre as distribuições espacial e temporal de queimadas e
de áreas ardidas em regiões tropicais afigura-se crucial, não só para uma melhor gestão dos
recursos naturais, mas também para estudos da química da atmosfera e de mudanças
climáticas (Zhan et al., 2002).
A detecção remota constitui, neste âmbito, uma ferramenta indispensável na medida
em que permite uma monitorização em tempo quase real, a qual se revela especialmente
útil em áreas extensas e/ou de difícil acesso afectadas pelo fogo (Pereira et al., 1997).
Diversos instrumentos, tais como o Land Remote Sensing Satellite/Thematic Mapper
(LANDSAT/TM) e o National Oceanic and Atmospheric Administration/Advanced Very High
Resolution Radiometer (NOAA/AVHRR) têm vindo a ser extensivamente utilizados na
gestão dos fogos florestais, em particular aos níveis da detecção de focos de incêndio e da
monitorização de áreas queimadas. Mais recentemente, o instrumento VEGETATION a
bordo do Satellite Pour l'Observation de la Terre (SPOT) tem vindo a ser utilizado com
sucesso na monitorização de fogos. Finalmente, são de referir os sensores da série Along
Track Scanning Radiometer (ATSR) para os quais têm vindo a ser desenvolvidos algoritmos
de identificação de focos de incêndio, e ainda o sensor Moderate Resolution Imaging
Spectroradiometer (MODIS) que tem vindo a demonstrar capacidades óptimas no que
respeita à observação global de fogos, plumas e áreas queimadas.
Neste contexto, os métodos actuais de detecção de áreas ardidas através da
detecção remota têm vindo a dar prioridade à utilização das regiões do vermelho (0.64 μm)
e infravermelho-próximo (0.84 μm) do espectro eletromagnético. No entanto, tanto a região
do vermelho quanto a do infravermelho-próximo apresentam a desvantagem de serem
sensíveis à presença de aerossóis na atmosfera (Fraser e Kaufman, 1985; Holben et. al.,
1986). Desta forma, em regiões tropicais como a Amazónia, onde existem grandes camadas
de fumo devido à queima de biomassa, a utlização destas duas regiões do espectro eletromagnético torna-se insatisfatória para a detecção de áreas ardidas. Por outro lado, a
região do infravermelho médio (3.7 – 3.9 μm) tem a vantagem de não ser sensível à
presença da maior parte dos aerossóis, exceptuando a poeira (Kaufman e Remer, 1994)
mostrando-se, ao mesmo tempo, sensível a mudanças na vegetação devido à absorção de
água líquida.
Com efeito, estudos acerca dos efeitos do vapor de água na atenuação do espectro
eletromagnético demonstraram que a região do infravermelho médio é uma das únicas
regiões com relativamente pouca atenuação (Kerber e Schut, 1986). Acresce que a região
do infravermelho médio apresenta uma baixa variação da irradiância solar (Lean, 1991),
tendo-se ainda que a influência das incertezas da emissividade na estimativa da
temperatura da superfície é pequena quando comparada com outras regiões térmicas tais
como as de 10.5 e 11.5 μm (Salysbury e D’Aria, 1994).
A utilização da radiância medida através de satélites na região do infravermelho
médio é, no entanto, dificultada pelo facto de esta ser afectada tanto pelo fluxo térmico
quanto pelo fluxo solar, contendo, desta forma, duas componentes, uma emitida e outra
reflectida, tendo-se que a componente reflectiva contém os fluxos térmico e solar reflectidos
pela atmosfera e pela superfície enquanto que as emissões térmicas são oriundas da
atmosfera e da superfície. Ora, a componente solar reflectida é de especial interesse para a
detecção de áreas ardidas pelo que se torna necessário isolá-la do sinal total medido pelo
sensor. Devido à ambiguidade deste sinal, a distinção dos efeitos da reflectância e da
temperatura torna-se uma tarefa muito complexa, verificando-se que os métodos em que se
não assume nenhuma simplificação, levando-se, portanto, em consideração todos os
constituintes do sinal do infravermelho médio se tornam complexos e difíceis de serem
aplicados na prática, na medida em que requerem dados auxiliares (e.g. perfis atmosféricos)
e ferramentas computacionais (e.g. modelos de tranferência radiativa). Kaufman e Remer
(1994) desenvolveram um método simples para estimar a reflectância do infravermelho
médio o qual assenta em diversas hipóteses simplificadoras. Apesar do objectivo primário que levou ao desenvolvimento do método ser a identificação de áreas cobertas por
vegetação densa e escura em regiões temperadas, este método tem sido lagarmente
utilizado nos estudos acerca da discriminação de áreas queimadas, algumas das vezes em
regiões tropicais (Roy et al., 1999; Barbosa et al., 1999; Pereira, 1999). Na literatura não
existe, no entanto, nenhum estudo acerca da exactidão e precisão deste método quando
aplicado com o objectivo de detectar áreas ardidas, em especial em regiões tropicais. Neste
sentido, no presente trabalho procedeu-se a um estudo de viabilidade do método proposto
por Kaufman e Remer (1994) em simultâneo com a análise da equação de tranferência
radiativa na região do infravermelho médio, tendo sido realizados testes de sensibilidade
dos algoritmos em relação aos erros nos perfis atmosféricos, ruído do sensor e erros nas
estimativas da temperatura da superfície. Para tal recorreu-se ao modelo de transferência
radiativa Moderate Spectral Resolution Atmospheric Transmittance and Radiance Code
(MODTRAN), dando-se especial atenção ao caso do sensor MODIS. Os resultados
demonstraram que a utilização do método proposto por Kaufman e Remer (1994) em
regiões tropicais para a estimativa da reflectância no infravermelho médio, leva a erros que
são pelo menos da mesma ordem de magnitude do parâmetro estimado e, em alguns casos,
muito maior, quando ocorre a combinação de altas temperaturas da superfície terrestre com
baixos ângulos zenitais solares. A utilização da equação de transferência radiativa mostrouse
uma boa alternativa, desde que estejam disponíveis dados acerca da temperatura da
superfíce terrestre assim como dos perfis atmosféricos. Entretanto, nas regiões onde
ocorrem altos valores de temperatura da superfície terrestre e baixos ângulos zenitais
solares, quaisquer dos dois métodos se mostra pouco utilizável, já que nesta região a
estimativa da reflectância constitui um problema mal-posto.
Em paralelo, utilizaram-se informações sobre aerossóis de queimada para efectuar
simulações do MODTRAN que permitiram avaliar a reposta do canal do infravermelho-médio
à este tipo de perturbação do sinal, muito comum na Amazónia Brasileira. A fim de tornar o
estudo o mais realístico possível, procedeu-se à coleta de material resultante de queimadas na região Amazónica, mais especificamente em Alta Floresta, Mato Grosso, Brasil. Estes
resultado foram então integrados nos estudos em questão, possibilitando a caracterização
espectral das áreas ardidas.
Com base nos resultados obtido definiu-se uma tranformação no espaço do
infravermelho próximo e médio com o objetivo de maximizar a informação espectral de
forma a que as superfícies vegetadas pudessem ser efectivamente discriminadas e as áreas
ardidas identificadas. A tranformação baseia-se na diferença entre a reflectância nos
infravermelhos próximo e médio, em conjunto com a distância a um ponto de convergência
no espaço espectral dos infravermelhos próximo e médio, ponto esse representativo de uma
área completamente ardida. A tranformação permitiu a definição de um novo sistema de
coordenadas, o qual provou ser bastante útil no que diz respeito á identificação de áreas
ardidas. Este novo espaço de coordenadas constitui uma inovação na área dos estudos de
queimadas, já que permite ao mesmo tempo definir dois tipos de índices, o primeiro dos
quais identifica superfícies que contém ou não biomassa e o segundo identifica, de entre as
superfícies que contêm biomassa, a quantidade de água presente, podendo variar de
vegetação verde (abundância de água) até áreas ardidas (ausência de água). Além de
distiguir áreas ardidas, os índices desenvolvidos podem ainda ser aplicados em outros
casos como, por exemplo, estudos de estresse hídrico e secas.DSA/INPE; Portuguese Foundation of Science and Technology (Fundação para a Ciência e Tecnologia / FCT)(SFRH/BD/21650/2005