Malaria vectorial capacity and competence of Anopheles atroparvus Van Thiel, 1927 (Diptera, Culicidade):implications for the potencial re-emergence of malaria in Portugal

Abstract

O risco de re-emergência da malária em países da Europa Ocidental no actual contexto sócio-económico e ambiental é considerado mínimo. No entanto, durante a última década o número de casos de malária importados de regiões endémicas tem aumentado consideravelmente e vários países têm reportado o aparecimento esporádico de casos clínicos autóctones. Face às mudanças climáticas globais observadas teme-se que estas ou outras possíveis alterações ambientais induzam modificações biológicas e/ou etológicas nas espécies de mosquito vectoras do parasita aumentando a sua capacidade vectorial para a transmissão da doença. Para efectuar uma avaliação do possível impacte de alterações ambientais na re-emergência da malária é necessário começar por caracterizar a real situação das suas antigas espécies vectoras. Assim, ao avaliar a presente capacidade e competência vectorial destas espécies poder-se-á identificar os factores que poderão favorecer a re-introdução e disseminação da doença assim como obter dados entomológicos que permitam perceber quais serão as alterações ambientais de maior impacte epidemiológico. Foi com a finalidade de contribuir para o esclarecimento de algumas destas questões que se efectuou o estudo aqui apresentado. Os objectivos principais foram: (i) estimar a capacidade vectorial de Anopheles atroparvus Van Thiel, 1927 em relação à malária e analisar outros parâmetros bio-ecológicos com possível relevância para a re-introdução da doença; (ii) determinar a competência vectorial da mencionada espécie em relação à transmissão de estirpes tropicais de Plasmodium falciparum Welch, 1897. A região da Comporta apresenta algumas características que a tornam ideal como área de estudo para a concretização dos objectivos propostos: (i) foi uma antiga região palúdica, onde a malária era hiperendémica e P. falciparum a espécie de parasita mais prevalente; (ii) é uma área semi-rural com vastos potenciais criadouros de anofelíneos e é uma zona de lazer que por tal apresenta fluxos sazonais de turistas; (iii) a sua localização é relativamente próxima de Lisboa o que facilita as deslocações regulares à área de estudo. Em relação ao estudo da capacidade vectorial (C), nove seria o número máximo de inoculações potencialmente infectantes que a população local de An. atroparvus poderia ter originado se um portador de gametócitos tivesse permanecido na área por um único dia. Esta estimativa foi calculada para um ciclo esporogónico de 11 dias (compatível com desenvolvimento de P. vivax em condições ideais) e para a taxa de agressividade para o Homem máxima determinada ao longo do estudo (38 picadas/dia/Homem). Este valor de C é semelhante a estimativas obtidas para outras espécies vectoras de malária. No entanto, com excepção do mês de Agosto de 2001, o valor limite de C=1 só foi ultrapassado durante os meses de Inverno e Primavera. Isto deveu-se a elevadas taxas de paridade das fêmeas de An. atroparvus, acima de 0.95. No entanto, foi também durante estes meses que An. atroparvus registou os menores valores de abundância. Assim, e considerando que os demais parâmetros XVI que compõem a capacidade vectorial foram sobrestimados, poder-se-á concluir que a receptividade da região da Comporta à introdução da malária é relativamente baixa. Dos 2207 exemplares de An. atroparvus que foram enviados para “Nijmegen Medical Centre” para integrarem os ensaios de infecção artificial com estirpes tropicais de P. falciparum, mais de 790 efectuaram pelo menos uma refeição sanguínea infectante. No entanto, em apenas um ensaio foi conseguida a infecção experimental de fêmeas de An. atroparvus. Neste ensaio os espécimes efectuaram duas alimentações infectantes com um intervalo de sete dias entre cada alimentação. As fêmeas alimentadas foram mantidas a 26ºC, com excepção de um período de 19 h que ocorreu duas horas após a segunda alimentação. Durante esse período as fêmeas recém alimentadas foram mantidas a 21ºC. Das 37 fêmeas dissecadas, cinco apresentavam oocistos no estômago. A prevalência de infecção foi de 13.5% e o número médio dos oocistos por fêmea infectada foi de 14, variando entre 2 e 75 oocistos por estômago infectado. Assim, confirmou-se que An. atroparvus é um vector pouco competente para o desenvolvimento de estirpes tropicais de P. falciparum. As experiências não foram prolongadas para além da fase de oocisto e, assim, nenhuma conclusão pode ser retirada a respeito da formação dos esporozoitos e da sua capacidade de invasão das glândulas salivares do mosquito. No entanto, face aos resultados obtidos poder-se-á dizer que a hipótese de An. atroparvus ser uma espécie completamente refractária à infecção por estirpes tropicais de P. falciparum poderá não corresponder à total realidade. Este estudo permitiu um conhecimento actualizado da biologia e etologia da espécie An. atroparvus bem como, pela primeira vez, uma avaliação detalhada de sua capacidade e competência vectorial para a transmissão de parasitas de malária humana. Por comparação com os estudos efectuados durante o período endémico de malária, tentou-se ainda determinar se algum dos parâmetros bio-ecologicos analisados terá sofrido alterações significativas que de algum modo justifiquem uma modificação na receptividade e infectividade da população local de An. atroparvus em relação à malária. Como conclusão poder-se-á dizer que os resultados obtidos neste estudo suportam a ideia que a re-emergência da malária em Portugal é um evento possível mas improvável nas circunstâncias ecológicas actuais.In Western-European Countries the risk of malaria re-emergence under current environmental and social conditions is considered minimal. However, in the last decade the number of imported cases has increased and several autochthonous cases have been reported from malaria–free places. If the predicted global climate change or other environmental modification would cause a large increase in mosquito vectorial capacity, malaria re-emergence in Europe could become possible. To assess how environmental driven factors may be linked to the risk of re-introducing malaria in Portugal, one must start by characterising the current status of its former vectors. By studying the receptivity and infectivity of present-day mosquito populations, it will be possible to identify factors that may trigger disease emergence and spreading, as well as to provide entomological data to be used in the identification of environmental induced changes of epidemiological significance. Aiming at contributing to these goals, this study has focused on the following objectives: (i) to estimate Anopheles atroparvus Van Thiel, 1927 vectorial capacity towards malaria and analyse other bioecological parameters with relevance to the introduction of the disease; (ii) to determine An. atroparvus vector competence for tropical strains of Plasmodium falciparum Welch, 1897. The region of Comporta presents a unique setting to assess the vector capacity and competence of An. atroparvus from Portugal. It was a former malaria hyperendemic region, where P. falciparum was the most prevalent malaria parasite. It is a semi-rural area with vast numbers of mosquito breeding sites and a highly mobile human population due mainly to tourism. It is also located fairly close to Lisbon which allows frequent visits to the study area. Nine would be the maximum estimated number of new daily inoculations that could occur if an infective human host would be introduced in the area. This estimate was obtained for a sporogonic cycle of 11 days (compatible with P. vivax development under optimal conditions) and the highest man biting rate obtained in this study (38 bites per person per day). This value of C is similar to some obtained for other malaria vectors. However, due to the overestimation of most of the computed variables, one can foresee that the receptivity of the area to the re-emergence of the disease is very limited. With the exception of August 2001, the threshold of C=1 was only surpassed during winter/spring months, when parous rates were above 0.95 but abundances were lowest. Out of 2,207 An. atroparvus that were sent to Nijmegen Medical Centre to be artificially infected with the tropical strains of P. falciparum, more than 790 specimens took one or two infected blood meals. Anopheles atroparvus females infection was successful in a single experiment. These specimens took two infective feeds with a seven days interval. XIV Blood fed females were kept always at 26ºC with the exception of a 19 hours period that occurred two hours after the second blood meal and during which mosquitoes were placed at 21ºC. Out of the 37 mosquitoes that were dissected, five presented oocysts in their midguts. Prevalence of infection was 13.5% and the mean number of oocysts per infected female was 14, ranging between 2 to 75 oocysts per infected midgut. It was confirmed that An. atroparvus is, at the most, a low competent vector regarding tropical strains of P. falciparum. Artificial infection experiments were not carried out beyond the oocysts phase, thus no conclusion can be drawn regarding sporozoite formation and invasion of salivary glands. Nevertheless, An. atroparvus complete refractoriness to tropical P. falciparum strains seems less certain than at the beginning of this study. This study has produced an update on the bionomics of An. atroparvus in Portugal and, for the first time, a comprehensive assessment of its vectorial capacity and competence for the transmission of human malaria parasites. It was also attempted to determine if the biology and behaviour of this species has suffered any major switches since the time malaria was an endemic disease in Portugal. The results obtained in this study support the idea that the establishment of malaria in Portugal is a possible but unlikely event in the present ecological conditions

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