O entendimento de certas capacidades musicais como universais e determinadas
por processos biológicos provém da existência de constantes transculturais em relação à
música, teorias evolutivas sobre a sua origem, estudos genéticos, e estudos que
demonstram empiricamente uma apetência musical implícita em todos os seres
humanos, na ausência de perturbações do desenvolvimento ou lesões adquiridas. Sendo
a música um fenómeno cerebral, vários estudos sugerem a existência de modularidade
na cognição musical, a qual é independente de outras funções como a linguagem, e
recorre a substratos neurais fixos, corroborando as teorias biológicas da música. A
Montreal Battery of Evaluation of Amusia (MBEA) foi concebida para avaliar as
capacidades de perceção e memória musical universais e inatas, e para o diagnóstico de
amusia. Músicos profissionais treinam minuciosamente o seu ofício, e apresentam
alterações estruturais e funcionais no processamento da música. Neste trabalho, que faz
parte do estudo de normalização da MBEA para a população portuguesa, averiguámos
se a aprendizagem musical influencia o desempenho na bateria. Comparámos as
pontuações obtidas por músicos e estudantes de escolas de música em Lisboa (n = 40;
média de anos de instrução = 11,4) com as pontuações de sujeitos sem formação
musical (n = 40) nos testes de escala, contorno, intervalo, ritmo, métrica, e memória
musical, e no índice global. Os músicos conseguiram pontuações significativamente
superiores em todos os testes e índices, havendo no entanto sobreposição entre grupos.
Verificámos ainda uma correlação (r = 0,357) entre os anos de instrução musical dos
músicos e o índice global. Estes resultados contestam a validade de constructo da
MBEA, pois sugerem que a bateria não avalia somente as competências musicais inatas,
mas também habilidades passíveis de serem aprendidas formalmente e treinadas. Assim,
como ferramenta para o diagnóstico de amusia, a MBEA deve ter em conta nas suas
normas a instrução musical.The understanding that certain musical abilities are universal and determined by
biological processes is based on the evidence concerning transcultural musical
constants, evolutionary theories about their origin, genetic studies, and empirical studies
showing an implicit musical tendency in all humans without developmental disorders or
brain damage. Various studies have suggested the existence of modularity in musical
cognition, which is independent of other functions such as language, and is supported
by fixed neural correlates, in accordance with biological theories of music. The
Montreal Battery of Evaluation of Amusia (MBEA) was conceived to assess universal
and innate capacities of musical perception and memory, and to provide a tool for the
diagnosis of amusia. Professional musicians practice their trade comprehensively, and
present structural and functional brain differences in musical processing relative to nonmusicians. In our work, which is part of a larger study intended to establish norms for
use of the MBEA on the Portuguese population, we inquired whether musical learning
influences performance on the battery. We compared scores obtained by musicians and
students in music schools in Lisbon (n = 40; mean years of practice = 11,4) with those
of subjects with no musical training whatsoever (n = 40), on the scale, contour, interval,
rhythm, meter and memory tests, as well as the global index. Musicians achieved
significantly higher scores on all tests and indices than non-musicians, although there
was some overlap between groups. Furthermore, the global index scores of musicians
correlated with years of practice (r = 0,375). These results put into question the
construct validity of the MBEA, since they suggest the battery does not merely assess
innate musical abilities, but also those which can be formally learnt and practiced.
Therefore, we suggest the years of musical practice be taken into account in the MBEA
norms