Fiddler crabs impact the structure of the benthic macroinvertebrate community and the spatial distribution of foraging shorebirds in tropical intertidal mudflats

Abstract

Tese de mestrado, Biologia da Conservação, Universidade de Lisboa, Faculdade de Ciências, 2019Os engenheiros de ecossistemas são organismos que transformam ou criam habitats, afetando muitas outras espécies. Os ecossistemas intertidais estão entre os mais produtivos do planeta e têm um papel vital na sobrevivência de muitos vertebrados, nomeadamente peixes e aves. A sua importância é especialmente relevante para aves costeiras migradoras fora da época de reprodução uma vez que várias espécies apenas se alimentam de macroinvertebrados bentónicos presentes nestas áreas. O caranguejo-violinista, Afruca tangeri, é descrito como um engenheiro de ecossistemas em bancos de vasa intertidais, onde tem impactes importantes, nomeadamente na alteração das características biogeoquímicas do sedimento e do ciclo de nutrientes. Além destes impactes, o caranguejo-violinista integra a dieta de grande parte das aves costeiras presentes no seu habitat, o que o torna um recurso muito importante. Este estudo visou investigar a influência que as populações de caranguejo-violinista têm na estrutura da restante comunidade de macroinvertebrados bentónicos e dos seus principais predadores, as aves costeiras, no arquipélago dos Bijagós, Guiné-Bissau. O estudo decorreu em Adonga, no Parque Nacional de Orango, no arquipélago dos Bijagós. Para cumprir os objetivos foram selecionados dois tipos de área: com elevada e com baixa densidade de caranguejos. Em ambos os tipos de áreas, procedeu-se à amostragem da comunidade de macroinvertebrados bentónicos utilizando cores de sedimento. Posteriormente todos os invertebrados recolhidos foram identificados ao nível taxonómico mais baixo possível e, para cada tipo de área, foi determinada a diversidade e riqueza da comunidade assim como a densidade, biomassa total e biomassa disponível para as aves (5 cm superficiais do sedimento) de cada taxon identificado. Foi também realizada uma amostragem da comunidade de aves costeiras recorrendo a parcelas marcadas em ambos os tipos de área analisadas e procedendo a contagens (intervaladas de uma hora) no período de 2h antes a 2h depois do pico da maré vazia. Posteriormente, para cada tipo de área, foi calculada a riqueza e diversidade da comunidade de aves costeiras e a densidade de cada uma das espécies de aves costeiras contadas. Foram ainda descritos e comparados o comportamento alimentar e a dieta de quatro espécies de aves: Maçarico-galego (Numenius phaeopus), Tarambola-cinzenta (Pluvialis squatarola), Perna-vermelha-comum (Tringa totanus) e Borrelho-grande-de-coleira (Charadrius hiaticula) com base em vídeos (3-4 mins) de indivíduos em alimentação. Com o objetivo de caracterizar as populações de caranguejo-violinista em cada tipo de área foram efetuados vídeos em 60 quadrados de amostragem. Posteriormente, os vídeos foram analisados e para cada tipo de área determinou-se a densidade, rácio sexual e distribuição das classes de tamanho das populações de caranguejo e ainda o rácio caranguejo/tocas nas áreas de elevada densidade de caranguejos. Por fim caracterizámos os dois tipos de área em termos de granulometria (percentagem de finos) e conteúdo de matéria orgânica do sedimento. Áreas com elevada densidade de caranguejos demonstraram um maior conteúdo em finos e matéria orgânica no sedimento. Nestas mesmas áreas, as comunidades de aves costeiras e macroinvertebrados apresentaram menor riqueza, diversidade e densidade, e, no caso dos macroinvertebrados, menor biomassa total e biomassa disponível para as aves. A comunidade de macroinvertebrados bentónicos em áreas com baixa densidade de caranguejo é dominada pelos poliquetas sedentárias das famílias Cirratulidae, Maldanidae e Capitellidae e pelos bivalves das famílias Veneridae (maioritariamente Pelecyora isocardia) e Lucinidae. Nas áreas com elevada densidade de caranguejo, as espécies acima referidas encontram-se também entre as mais abundantes, sendo ainda de mencionar os poliquetas errantes da família Nereidae e a substituição dos bivalves Lucinidae pela família Solecurtidae (maioritariamente Tagelus adansonii) como segundo bivalve mais abundante. É ainda de notar que os caranguejos-violinista tornam-se um dos taxa mais abundantes em áreas com elevada densidade de caranguejo, ultrapassados apenas pelo bivalve P. iscocardia. Não obstante, os caranguejos-violinistas são, isoladamente e com uma margem muito significativa, o taxon com os maiores valores de biomassa nestas áreas. Foram encontrados ainda 13 taxa em áreas com baixa densidade de caranguejo que estão completamente ausentes em áreas com elevada densidade de caranguejo. A comunidade de aves costeiras em áreas com elevada densidade de caranguejos é caracterizada pela dominância de Maçarico-galego (Numenius phaeopus), Perna-vermelha-comum (Tringa totanus), Maçarico-das-rochas (Actitis hypoleucos) e Íbis-sagrada (Treskiornis aethiopicus), sendo que o Maçarico-das-rochas ocorre quase exclusivamente nestas áreas. Todas estas espécies consomem preferencialmente caranguejos-violinista. Em contraste, em áreas com baixa densidade de caranguejos, a comunidade de aves costeiras é dominada por Pilrito-de-bico-comprido (Calidris ferruginea), Seixoeira (Calidris canutus), Borrelho-grande-de-coleira (Charadrius hiaticula), Pilrito-das-praias (Calidris alba), Pilrito-de-peito-preto (Calidris alpina) e Pilrito-pequeno (Calidris minuta), sendo este último quase exclusivo destas áreas. Todas estas espécies predam principalmente poliquetas, bivalves e/ou gastrópodes. As restantes espécies não demonstraram diferenças significativas na densidade entre áreas, sendo elas Fuselo (Limosa lapponica), Ostraceiro (Haematopus ostralegus), Tarambola-cinzenta (Pluvialis squatarola), Borrelho-de-testa-branca (Charadrius marginatus), Perna-verde (Tringa nebularia) e Rola-do-mar (Arenaria interpres). À exceção da Tarambola-cinzenta, todas as aves em alimentação nas áreas com baixa densidade de caranguejos apresentaram uma maior taxa de bicadas, mas essa diferença não se traduziu num maior sucesso alimentar. Praticamente não foram encontradas diferenças na dieta das aves entre áreas, à exceção de um maior consumo de bivalves/gastrópodes em áreas com baixa densidade de caranguejos por parte do Maçarico-galego e um maior consumo de bivalves/gastrópodes em áreas com elevada densidade de caranguejo por parte da Tarambola-cinzenta. Houve, no entanto, uma grande proporção de presas não identificadas devido ao seu pequeno tamanho e à distância a que os vídeos foram filmados. Nas áreas com elevada densidade, as populações de caranguejo-violinista são constituídas por indivíduos de classes de tamanho maiores, sendo que caranguejos com uma largura de carapaça superior a 1 cm são quase exclusivos destas áreas. Encontrámos ainda um rácio sexual enviesado para o número de fêmeas nestas áreas e um dos menores rácios caranguejo/toca alguma vez descrito. Não encontrámos diferenças significativas de tamanho entre machos e fêmeas de caranguejo-violinista. Este estudo destaca os possíveis efeitos das populações de caranguejo-violinista no seu habitat, particularmente mostra a existência de grandes diferenças na composição da comunidade de macroinvertebrados bentónicos e aves costeiras entre áreas com baixa e elevada densidade de caranguejos. Com o conhecimento adquirido após a realização deste estudo é possível prever a estrutura mais provável da comunidade de aves costeiras presentes numa área do arquipélago dos Bijagós com base apenas na presença de caranguejo-violinista e, daí, prever qual a importância dessas áreas para cada espécie de ave costeira presente. Apesar de uma grande proporção de espécies de aves costeiras incluir caranguejo-violinista na sua dieta, a maioria das espécies tende a evitar as áreas com elevadas densidades de caranguejos. A presença de caranguejos-violinistas e o seu impacto nos macroinvertebrados e nas aves podem, portanto, ser muito relevantes numa perspetiva conservacionista já que esta espécie de caranguejo está amplamente distribuída nos Bijagós, a segunda área mais importante para aves costeiras invernantes na África Ocidental.Ecosystem engineers are organisms able to transform or create habitats, indirectly affecting many other species. Fiddler crabs Afruca tangeri (Eydoux, 1835), have been described as ecosystem engineers of intertidal mudflats, delivering important impacts, namely by changing sediment biogeochemical characteristics and nutrient cycling. This study aimed to investigate the influence of the fiddler crab populations in the structure of the remaining benthic macroinvertebrate communities as well as on the spatial distribution of their main predators, i.e. shorebirds, in the Bijagós archipelago, Guinea-Bissau. To achieve this, we selected areas with high densities of fiddler crabs and areas with low density/absence of crabs and compared the diversity and density of macroinvertebrates and shorebirds between these areas. In addition, we described foraging behavior of four shorebird species in both types of areas. Study areas were further characterized by determining the granulometry and organic matter content of the sediment. Areas with high crab density were characterized by finer sediments and higher organic matter content. Both the macroinvertebrate and shorebird communities presented significantly lower diversity and densities in areas showing high crab density. Except for the Grey plover, all birds foraging in areas with low crab densities showed higher pecking rates, although we found no differences in the overall feeding success. This study highlights the diverse effects of fiddler crab populations on their habitat, in particular by modifying the composition of the benthic macroinvertebrate fauna and associated shorebird communities. Although fiddler crabs are known to be an important prey item for many shorebird species, overall, high crab density areas are avoided by the majority of species within the shorebird community. Results from this study may be extremely relevant from a conservation perspective as fiddler crabs are widespread in the intertidal mudflats of the Bijagós archipelago, the second most important area for wintering shorebirds in West Africa

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