'Revista Brasileira de Hematologia e Hemoterapia (RBHH)'
Abstract
A despeito da alta cobertura do pré-natal no Brasil, análises sobre o cuidado adequado
identificam baixos percentuais de acesso das mulheres a esse tipo de serviço. Fatores de
ordem socioeconômica e demográfica, com destaque para a raça/cor, têm caracterizado as
desigualdades de acesso das mulheres ao cuidado pré-natal adequado, embora não haja
consenso na literatura de que as mulheres negras têm o pior acesso ao cuidado adequado.
Tem-se como objetivo geral comparar a utilização do cuidado pré-natal adequado entre
mulheres negras e brancas no Brasil, e como objetivos específicos caracterizar as mulheres
usuárias do cuidado pré-natal segundo a raça/cor e outros fatores sociodemográficos; estimar
a magnitude da adequação global do cuidado pré-natal; verificar a associação entre o índice
padronizado de adequação do cuidado pré-natal e a raça/cor e verificar associação entre os
indicadores de processo do cuidado pré-natal adequado e a raça/cor. Estudo de abordagem
quantitativa, do tipo transversal, de base populacional, realizado com dados da Pesquisa
Nacional de Saúde. A amostra foi constituída por 1851 mulheres com 18 anos ou mais de
idade, residentes no Brasil. Construiu-se um índice de adequação do cuidado pré-natal com
base nas mensurações do escore Z, classificados em três níveis: adequado, intermediário e
inadequado. O pré-natal adequado foi definido tomando como referência as recomendações
mínimas propostas pelo Programa de Humanização do Pré-natal e Nascimento e pelo Manual
técnico de atenção ao pré-natal de alto risco, sendo que os índices de adequação do pré-natal
compuseram as variáveis dependentes. A variável raça/cor foi constituída pelos grupos negra e
branca e considerada como variável independente principal e as características
sociodemográficas das mulheres como covariáveis. A análise estatística foi realizada mediante
obtenção das medidas de tendência central (média e mediana), desvio- padrão, frequência
(absolutas e percentuais), prevalência e odds ratio. A verificação da associação entre as
variáveis dependentes e independentes foi realizada mediante a análise bivariada tabular e por
meio da regressão logística multinível, estimando-se, desta forma, o odds ratio (OR) e seu
respectivo intervalo de confiança de 95%. Em todas as análises estatísticas adotou-se o nível
de significância de 5% (p ≤ 0,05). Os resultados apontaram que mulheres negras possuem
menor chance de iniciar o pré-natal antes da 12ª semana, realizar mais de 6 consultas, realizar
teste HIV, realizar VDRL, realizar exame das mamas e receber orientações quanto à gestação,
parto e aleitamento materno. Os achados também evidenciaram associação entre a raça/cor e a
idade, escolaridade, renda, ocupação, paridade e utilização do serviço público. Encontramos
10,8% de adequação global do cuidado pré-natal e associação estatisticamente significante
entre a raça/cor das mulheres e o índice de adequação pré-natal (OR= 0,45; IC95%:0,30-
0,67). Conhecer os grupos vulneráveis e seu perfil de utilização dos serviços de saúde é
ferramenta fundamental para o planejamento de ações direcionadas à eliminação das
desigualdades. Este estudo poderá contribuir para formulação de políticas de atenção às
mulheres com base nas reais condições do acesso ao cuidado adequado, segundo a raça/cor,
assim como elucidar quais os fatores que concorrem para a baixa cobertura do pré-natal
adequado.Despite the wide coverage of prenatal care in Brazil, analyses on adequate care have
identified low percentages of women’s access to this type of service. Socio-economic and
demographic aspects, with emphasis to race/color, have characterized the inequalities of
women’s access to adequate prenatal care, although there is not a consensus in literature that
black women have poorer access to adequate prenatal care. The general objective is to
compare the use of adequate prenatal care among black and white women in Brazil, and as
specific objectives to characterize women users of prenatal care according to race/color and
other socio-demographic factors; estimate the magnitude of the global adequacy of prenatal
care; verify the association between the standardized index for prenatal care adequacy and
race/color and verify the association between the indicators of adequate prenatal care process
and race/color. A population based study with a quantitative cross-sectional approach,
performed with data from the National Health Survey. The sample was formed by 1851
women, ages 18 and above, resident in Brazil. An index of prenatal care adequacy was
established based on score Z measurements, classified in three levels: adequate, intermediate
and inadequate. Adequate prenatal care was defined taking as reference the minimum
recommendations proposed by the Prenatal and Birth Humanization Program and the
technical manual for high risk prenatal care, whereby the prenatal care adequacy indexes
formed the dependent variables. The race/color variable was established by groups of black
and white women and considered as the main independent variable and the sociodemographic
characteristics of the women as co-variables. The statistical analysis was
performed by obtaining the Measures of Central Tendency (mean and median), standard
deviation, frequency (absolute and percentages), prevalence and odds ratio. The verification
of the association between dependent and independent variables was performed using tabular
bivariate analysis and through multilevel logistic regression, estimating, in this manner, the
odds ratio (OR) and respective confidence interval of 95%. For all the statistical analysis, the
level of significance of 5% (p ≤ 0.05) was used. The results point out that black women have
less chance of beginning prenatal care before 12 weeks of gestation, have 6 or more
consultations, carry out the HIV test, perform VDRL exam, breast exams or receive guidance
in relation to gestation, childbirth or breast-feeding. The findings also evidence the
association between race/color and age, schooling, income, occupation, parity and the use of
public service. A 10.8% of global adequacy of prenatal care was observed and statistically
significant association between race/color of women and the prenatal care adequacy index
(OR=0.45; CI 95%: 0.30-0.67). To understand the vulnerable groups and their profile in the
use of the health services is a fundamental tool for planning actions guided towards the
elimination of inequalities. The present study can contribute towards formulating policies for
attention to women based on actual conditions of access to adequate care, according to
race/color, as well as clarifying which factors contribute towards the low coverage of
adequate prenatal care