Introdução: A violência conjugal é uma realidade que afeta milhares de mulheres mundialmente, sendo fenômeno complexo e devastador, que causa danos físicos, morais, psicológicos, emocionais e sociais às pessoas envolvidas. Estudo desenvolvido em países sul-asiáticos indicam que o contexto social permeado por normas conservadoras e patriarcais, associado a altos índices de pobreza extrema e analfabetismo colaboram para que 50% das mulheres vivenciem a violência conjugal (Carneiro, 2021). No Brasil, segundo o Ministério da Saúde, aproximadamente 30% das mulheres sofrem algum tipo de violência ao longo da vida, a maioria, por meio da prática das expressões física e sexual pelo parceiro íntimo. O mesmo estudo alerta ainda que os parceiros ou ex-parceiros íntimos são os autores da violência em 38% dos feminicídios no país (Barbosa, 2021). Apesar da violência conjugal representar um desrespeito aos direitos humanos, muitas mulheres permanecem durante anos nesta condição. Estudos indicam que a permanência em um contexto de violência relaciona-se a influência das questões de gênero, envolvimento com álcool e/ou outras drogas, vulnerabilidade social, dependência econômica, esperança de mudança na relação e a falta de apoio na rede de atenção (Carvalho, 2021; Cunha, 2008; Dahlberg, 2007). No que se refere a rede de apoio para o enfrentamento da violência, considera-se duas vertentes essenciais, a saber: a rede institucional, formada pelos serviços e instituições, e a rede social, integrada por amigos e familiares (Carneiro, 2021). No que tange ao suporte promovido pela família no processo de enfrentamento da violência conjugal, a literatura aponta que é essencial para o fortalecimento da mulher e, inclusive, quando ausente, determinante para permanência no seio de uma relação conjugal norteada pela violência. Nesse contexto, a família é considerada uma unidade de apoio, um espaço de acolhimento e proteção que desempenha papel importante no apoio e suporte para o enfrentamento do agravo (Souza, 2021). Objetivo: identificar o posicionamento da família da mulher diante a violência conjugal. Metodologia: Pesquisa de abordagem qualitativa, recorte do projeto “Tecnologia Social de Cuidado a Mulheres no Contexto de Violência Conjugal”. O cenário do estudo foi a Ronda Maria da Penha (RMP) dos municípios de Lauro de Freitas e Senhor do Bonfim, localizados na Bahia, Brasil. Colaboraram com a pesquisa 22 (vinte e duas) mulheres com história de violência conjugal e assistidas no serviço acima citado por meio da medida protetiva de urgência. Os dados foram coletados através de entrevista e quatro grupos focais, ocorridos com apoio de formulário e gravador de voz. O material gravado foi transcrito na integra no programa Microsoft Word e sistematizado a partir da análise temática proposta por Bardin. Esta representa técnica amplamente utilizada na análise de dados qualitativos, sendo organizada em três etapas, a saber: pré-análise, exploração do material e codificação e a categorização do material e interpretação dos resultados (BARDIN, 2011). Visando garantir o anonimato das colaboradoras, a identificação identitária (nome) das mulheres foi substituída pelas iniciais do nome do município, seguida pela ordem das entrevistas. O projeto respeitou todos os aspectos éticos constantes na resolução 466/2012 e foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Estadual da Bahia, sob parecer circunstanciado nº 4.933.325. Resultados: As participantes da pesquisa tinham de 20 a 59 anos de idade. A maioria se autodeclarou parda, com 2º grau completo, parcialmente dependente, com residência própria e renda inferior a um salário mínimo. Os relatos das mulheres em situação de violência conjugal permitiram compreender que o posicionamento da família diante a violência conjugal está organizado em duas categorias temáticas: O apoio no processo de enfrentamento da violência conjugal e O não apoio no processo de enfrentamento da violência conjugal em decorrência da influência das concepções de gênero. O apoio no processo de enfrentamento da violência conjugal ocorreu por meio da adoção de práticas para proteger a mulher dos episódios de violência conjugal; a cobrança do rompimento do vínculo conjugal, a adoção de ações para o fortalecimento da mulher e o apoio na busca pelos serviços da rede. No vivido das mulheres, o não apoio relacionou-se às concepções de gênero que naturalizam a violência no cotidiano conjugal, a descredibilização do relato feminino de violência e a julgamentos sobre o comportamento e/ou decisões da mulher no âmbito conjugal. Conclusão: Os resultados do estudo sinalizam assimetrias no posicionamento da família diante a ciência da vivência de violência conjugal pela mulher. Compreendendo que o apoio a ser promovido por esta rede é essencial para a saída da violência, o conhecimento de que algumas mulheres não vivenciam apoio nesta instituição enaltece a importância da atuação das outras instâncias da rede de apoio, a exemplo, amigos e equipamentos da rede de atenção. Para além, ao sinalizar que o não apoio relaciona-se a concepções de gênero que naturalizam à violência, vislumbra-se que a família de mulheres em situação de violência é também público que demanda por ações com vista a desnaturalizar a violência no cotidiano conjugal