Anabela Borges

Beppu, M. M.

Santinon, C.

Simões M

Vieira, M. G. A.

Portuguese

Repositório Aberto da Universidade do Porto

 1  FOTOATIVAÇÃO DE FILMES DE KAPPA-CARRAGENINA CATIONIZADA PARA PREVENIR A ADESÃO DE STAPHYLOCOCCUS AUREUS   C SANTINON1, M J V SIMÕES2, A BORGES2, M M BEPPU1, M G A VIEIRA1  1Universidade Estadual de Campinas – UNICAMP (Brasil) 2Universidade do Porto – U. Porto (Portugal) E-mail para contato: melissag@unicamp.br   RESUMO – Staphylococcus aureus é um patógeno que tem causado grande preocupação nos últimos anos por ter adquirido um perfil multirresistente aos tratamentos com antibióticos mais comuns, dificultando o tratamento das infecções e consequentemente aumentando a mortalidade dos pacientes. Na busca por alternativas mais eficazes e que evitem a criação de pressão seletiva, a terapia fotodinâmica tem demonstrado efeitos bastante promissores. Desta forma, filmes de carragenina modificada foram empregados como fotossensibilizadores e conseguiram reduzir as unidades formadoras de colônia (UFC) de S. aureus em aproximadamente 2 log10 sem irradiação e 4 log10 após a irradiação com luz visível. A irradiação com luz na região UV promoveu a redução total da culturabilidade do patógeno aderido. O ensaio de “Live/Dead” confirma que houve danificação da membrana celular com a mudança do comprimento de onda utilizado na irradiação.   1 INTRODUÇÃO Uma das grandes preocupações que vem sendo abordada nas últimas décadas é o aumento de bactérias com múltipla resistência ao tratamento com antibióticos. O Staphylococcus aureus é muito conhecido pela sua alta patogenicidade, fácil adaptação às condições ambientais e por ter desenvolvido mecanismos de resistência à maioria dos antibióticos usados contra infecções desta espécie, como os beta-lactâmicos, glicopeptídeos e oxazolidinonas (DE OLIVEIRA et al., 2020; MLYNARCZYK-BONIKOWSKA et al., 2022). Tipicamente, a autoprodução de biofilmes causada por um conjunto de bactérias é a forma mais comum de contaminação pela capacidade de adesão em diversas superfícies (GARRETT; BHAKOO; ZHANG, 2008). Sendo assim, novas estratégias devem ser desenvolvidas para a prevenção da adesão bacteriana e para o tratamento de infecções causadas por esta espécie, sobretudo evitando o uso de medicamentos ainda mais agressivos. Neste contexto, a terapia fotodinâmica é uma técnica relativamente nova que se baseia na excitação de um fotossensibilizador através da irradiação em um comprimento de onda específico, gerando espécies reativas de oxigênio e levando à inativação do patógeno, incluindo os resistentes. Os fotossensibilizadores mais comuns são os corantes sintéticos como rosa de bengala e azul de metileno, derivados de porfirinas, ftalocianinas, clorinas e alguns elementos https://proceedings.science/p/171184?lang=pt-br 2 naturais como a curcumina e a riboflavina (ALVES et al., 2015; SILVA et al., 2018). Ademais, compostos catiônicos foram recentemente aplicados como fotossensibilizadores para inativação de bactérias Gram-positivas e Gram-negativas com sucesso (HAMBLIN et al., 2002; MINNOCK et al., 2000; SCHASTAK et al., 2010).  A carragenina é um polissacarídeo atóxico extraído das algas marinhas vermelhas com excelente propriedade gelificante e amplamente utilizada nas indústrias alimentícias como espessantes e estabilizantes de iogurtes, sorvetes e queijos. A cationização deste biopolímero é realizada pela introdução de grupos amônio quaternário nas hidroxilas presentes em sua estrutura, o que promove principalmente melhorias em características físico-químicas do material e permite aplicações mais eficientes nas áreas farmacêutica e biomédica (D’AYALA; MALINCONICO; LAURIENZO, 2008; PRADO; MATULEWICZ, 2014; SANTINON et al., 2022). Neste estudo, filmes de kappa-carragenina cationizados foram submetidos à fotoativação usando diferentes tempos de contato e fontes de luz com comprimentos de onda a fim de prevenir a adesão da espécie bacteriana Gram-positiva S. aureus. As cargas catiônicas da estrutura do biopolímero foram testadas como possível fotossensibilizador. Em estudo anterior (SANTINON et al., 2023), até mesmo as formulações com o maior grau de substituição catiônico não demonstraram nenhuma atividade antibacteriana considerável para bactérias Gram-positivas e Gram-negativas devido ao caráter predominantemente negativo dos grupos OSO3- presentes na carragenina. Portanto, a técnica de fotoativação é uma alternativa para potenciar a atividade antimicrobiana aos filmes de carragenina funcionalizada. A utilização de compostos quaternários de amônio já foi reportada pela literatura como potencial fotossensibilizador (WANG et al., 2022), porém sua toxicidade elevada ainda era um empecilho em futuras aplicações. A funcionalidade dos compostos quaternários de amônio inserida em polímeros atóxicos é uma possibilidade para reverter esta limitação. 2 METODOLOGIA 2.1 Determinação dos parâmetros de irradiação Para que a fotoativação seja efetiva, deve-se existir uma correlação entre a absorbância da emissão de luz e do fotossensibilizador. Sendo assim, realizou-se uma varredura em espectrofotômetro UV-Vis (FLUOstar® Omega, BMG LABTECH) de duas formulações denominadas de K3 e K5 a fim de determinar os melhores parâmetros de irradiação para geração de espécies reativas de oxigênio. Estas formulações foram consideradas as mais promissoras pelo estudo anterior, pois apresentaram graus de substituição catiônico de 56,4 e 65,9%, respectivamente. Ambas foram preparadas a partir da kappa-carragenina comercial (Sigma-Aldrich, EUA) e a etapa de funcionalização ocorreu com a adição do reagente cationizante cloreto de glicidil trimetilamônio em meio alcalino (SANTINON; BEPPU; VIEIRA, 2023). 2.2 Avaliação do efeito da irradiação na adesão de S. aureus Contagem de Unidades Formadoras de Colônias: Os ensaios foram executados usando culturas bacterianas de S. aureus (CECT 976) com densidade óptica (OD600nm) de 0,04 ± 0,02 em meio salino (0,85%). Em microplacas de 96 poços, as suspensões foram colocadas em contato com os filmes K3 e K5 e posteriormente irradiadas de acordo com os parâmetros pré-estabelecidos. Após esta etapa, as amostras foram levadas à incubadora a 37 ºC durante 2 horas. https://proceedings.science/p/171184?lang=pt-br 3 As amostras de controle foram incubadas no escuro em temperatura ambiente seguindo os mesmos critérios. Ensaio Live/Dead (LD): Para avaliar a integridade das membranas celulares após a irradiação, utilizou-se o microscópio de fluorescência DMLB2 (LEICA Microsistemas, Alemanha) com o auxílio de uma combinação dos corantes SYTO-9 e iodeto de propídio. As imagens foram capturadas usando uma câmera CCD e o software IM50 (LEICA). As células verdes (coradas apenas com SYTO-9) indicam as células íntegras e as vermelhas (coradas com SYTO-9 e iodeto de propídio) demonstram alguma danificação da sua estrutura.  3 RESULTADOS E DISCUSSÃO 3.1 Determinação dos parâmetros de irradiação A Figura 1 exibe os picos de absorção da carragenina cationizada entre 220-300 nm, o que significa que irradiações com luz UV (<400 nm) são capazes de fotoativar mais adequadamente este tipo de material. No entanto, picos menores foram observados entre 300-400 nm, podendo ainda apresentar alguma ativação nestas zonas. Consequentemente, os métodos de irradiação foram realizados com lasers nos comprimentos de onda de 420, 365 e 254 nm. Também foram testados tempos de 10, 20 e 30 minutos com emissão da região do visível para avaliar a atividade antimicrobiana ao longo do tempo de exposição dos filmes. Figura 1: Espectro de absorção dos filmes de carragenina cationizada K3 e K5.  3.2 Eficiência da fotoativação na adesão bacteriana A Figura 2 apresenta a culturabilidade das células aderidas no filme em termos de UFC. É possível notar que a carragenina cationizada apresenta um ligeiro efeito na culturabilidade das células mesmo sem irradiação (linha de cor preta), em relação ao número de colônias inicialmente adicionadas, mas que a irradiação potencializa este efeito (linha de cor vermelha), sendo mais evidente após 30 minutos de ensaio. No entanto, verifica-se que a emissão de luz na região do visível não é considerada satisfatória, como previsto anteriormente devido ao espectro de absorbância do composto (Figura 1). Pela Figura 3, conclui-se que a fotoativação é realmente efetiva após 10 minutos de irradiação com 365 e 254 nm, onde existe uma redução da culturabilidade bacteriana de 2 log10 em comparação com os filmes não irradiados (sigla S.I.) ou até mesmo a sua inibição total. Nota-se também que a geração de oxigênio reativo pela formulação K5 é maior que a da K3, o que é esperado, visto que esta possui maior quantidade de grupos catiônicos na estrutura da carragenina. De acordo com (HAMANO et al., 1997) a quantidade desses grupos substituintes e também a posição da ligação que assumem na hora da 250 300 350 400 450 500 550 60001234AbsComprimento de onda (nm) K3 e K5Ultravioleta (UV) Luz visívelhttps://proceedings.science/p/171184?lang=pt-br 4 síntese afetam a produção fotoquímica das espécies reativas de oxigênio e, consequentemente, são responsáveis pela atividade antimicrobiana. De fato, diversos relatos na literatura apontam que fotossensibilizadores catiônicos são mais eficazes que os neutros devido à sua difusão na membrana plasmática em bactérias Gram-positivas e através do enfraquecimento da membrana externa pelo deslocamento de cátions divalentes das bactérias Gram-negativas, permitindo melhor difusão do fotossensibilizador e maior possibilidade de inativação (HAMBLIN; HASAN, 2004; MERCHAT et al., 1996; TEGOS et al., 2005). Figura 2:  Culturabilidade celular de adesão aos filmes após 10, 20 e 30 minutos de irradiação (420 nm). Os dados ilustrados na cor preta representam os filmes incubados no escuro pelo mesmo tempo.  Figura 3: Culturabilidade bacteriana usando irradiação com diferentes comprimentos de onda. A sigla S.I. corresponde aos filmes sem irradiação.  A Figura 4 permite visualizar que os filmes sem irradiação apresentam uma quantidade considerável de bactérias ainda íntegras, mas que a funcionalização da estrutura da carragenina com o agente cationizante é capaz de danificar uma parte da membrana das bactérias mesmo sem a fotoirradiação, o que não garante a morte celular completa do patógeno. No entanto, nota-se que irradiação é capaz de induzir a eliminação destes microrganismos pela redução notável no número de células que foram coradas. A quantidade de células com integridade da membrana tende a diminuir com a mudança do comprimento de onda de emissão da luz, usando o mesmo tempo de irradiação (10 minutos), conforme se encontra mais próximo do pico de absorção do composto.  0 10 20 30012345670 10 20 3001234567log (CFU/cm²)Tempo (min) K3* K3log (CFU/cm²)Tempo (min) K5* K50123456K5K3K5*K5*K5*K3*K3*S.I.254 nm365 nmlog (CFU/cm²)Comprimento de onda420 nmK3*https://proceedings.science/p/171184?lang=pt-br 5 Figura 4: Ensaio de coloração do S. aureus sem e com irradiações usando diferentes comprimentos de onda durante 10 minutos.  4 CONCLUSÃO Neste trabalho viabilizou-se a aplicação de compostos quaternários de amônio inseridos em polissacarídeos como fotossensibilizadores para a fotoativação, potencializando sua atividade antimicrobiana e mantendo sua natureza atóxica. Este perfil pode ser atrativo para aplicações mais amplas pela indústria, evitando futuros impactos no meio ambiente e até mesmo em seres humanos pelo contato com a pele. Embora não tenha apresentado completa redução da culturabilidade, a exposição do filme de carragenina cationizada com maior grau de substituição (K5) durante 30 minutos pela luz visível promoveu uma redução significativa do número de UFC aderidas de aproximadamente 58% em relação ao controle celular. Utilizando-se comprimentos de ondas menores e mais específicos, é possível inibir completamente o crescimento bacteriano. A fotoativação de diferentes moléculas, especialmente as não tóxicas, é uma alternativa acessível e prática para conter o aumento da resistência destes patógenos e, consequentemente, a gravidade das infecções.  5 AGRADECIMENTOS Os autores gostariam de agradecer à CAPES (Processos 88887.517422/2020-00 e 88887.716126/2022-00) e ao CNPq (Processos 403560/2021-7; 401767/2022-1 e 308046/2019-6) pelo apoio financeiro para o desenvolvimento deste trabalho. 6 REFERÊNCIAS ALVES, E. et al. Potential applications of porphyrins in photodynamic inactivation beyond the medical scope. Journal of Photochemistry and Photobiology C: Photochemistry Reviews, v. 22, p. 34–57, 1 mar. 2015.  Sem irradiação 420 nm365 nm 254 nmhttps://proceedings.science/p/171184?lang=pt-br 6 D’AYALA, G. G.; MALINCONICO, M.; LAURIENZO, P. Marine Derived Polysaccharides for Biomedical Applications: Chemical Modification Approaches. Molecules, 2008.  DE OLIVEIRA, D. M. P. et al. Antimicrobial Resistance in ESKAPE Pathogens. Clinical Microbiology Reviews, v. 33, n. 3, 2020.  GARRETT, T. R.; BHAKOO, M.; ZHANG, Z. Bacterial adhesion and biofilms on surfaces. Progress in Natural Science, v. 18, n. 9, p. 1049–1056, 10 set. 2008.  HAMANO, T. et al. Singlet oxygen production from fullerene derivatives: effect of sequential functionalization of the fullerene core. Chemical Communications, v. 0, n. 1, p. 21–22, 1 jan. 1997.  HAMBLIN, M. R. et al. Polycationic photosensitizer conjugates: effects of chain length and Gram classification on the photodynamic inactivation of bacteria. Journal of Antimicrobial Chemotherapy, v. 49, n. 6, p. 941–951, 2002.  HAMBLIN, M. R.; HASAN, T. Photodynamic therapy: a new antimicrobial approach to infectious disease? Photochemical & Photobiological Sciences, v. 3, n. 5, p. 436–450, 30 abr. 2004.  MERCHAT, M. et al. Meso-substituted cationic porphyrins as efficient photosensitizers of gram-positive and gram-negative bacteria. Journal of Photochemistry and Photobiology B: Biology, v. 32, n. 3, p. 153–157, 1 fev. 1996.  MINNOCK, A. et al. Mechanism of uptake of a cationic water-soluble pyridinium zinc phthalocyanine across the outer membrane of Escherichia coli. Antimicrobial agents and chemotherapy, v. 44, n. 3, p. 522–527, 2000.  MLYNARCZYK-BONIKOWSKA, B. et al. Molecular Mechanisms of Drug Resistance in Staphylococcus aureus. International Journal of Molecular Sciences, MDPI, 1 ago. 2022.  PRADO, H. J.; MATULEWICZ, M. C. Cationization of polysaccharides: A path to greener derivatives with many industrial applications. European Polymer Journal. Elsevier Ltd, 1 mar. 2014. SANTINON, C. et al. Chemical modifications in the structure of seaweed polysaccharides as a viable antimicrobial application : A current overview and future perspectives. Algal Research, v. 66, n. July, p. 102796, 2022.  SANTINON, C.; BEPPU, M. M.; VIEIRA, M. G. A. Optimization of kappa-carrageenan cationization using experimental design for model-drug release and investigation of biological properties. Carbohydrate Polymers, v. 308, p. 120645, 15 maio 2023.  SCHASTAK, S. et al. Efficient photodynamic therapy against gram-positive and gram-negative bacteria using THPTS, a cationic photosensitizer excited by infrared wavelength. PloS one, v. 5, n. 7, p. e11674, 2010.  SILVA, A. F. et al. Photodynamic inactivation as an emergent strategy against foodborne pathogenic bacteria in planktonic and sessile states. Critical Reviews in Microbiology, v. 44, p. 667–684, 2018.  TEGOS, G. P. et al. Cationic Fullerenes Are Effective and Selective Antimicrobial Photosensitizers. Chemistry & Biology, v. 12, n. 10, p. 1127–1135, 1 out. 2005.  https://proceedings.science/p/171184?lang=pt-br 7 WANG, G. et al. A new class of quaternary ammonium compounds as potent and environmental friendly disinfectants. 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Fotoativação de filmes de kappa-carragenina cationizada para prevenir a adesão de Staphylococcus aureus

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