O dossiê “Bioética, Meio Ambiente e Saúde Global: perspectivas científicas, epistêmicas e sociais”, publicado na Revista Humanidades &amp; Tecnologia (FINOM), elege a Bioética, especialmente com enfoque ambiental, enquanto disciplina que reúne perspectivas de diversas áreas do conhecimento (como a medicina, biologia, química, antropologia, sociologia, filosofia, direito, entre outras), pela interdisciplinaridade, permitindo avaliar os fenômenos relacionados a vida em sentido amplo, suscitando reflexões sobre a ética animal e ambiental, sociedade tecnocientífica e sustentabilidade, justiça climática e socioambiental, cidadania ecológica, entre tantos outros recortes e perspectivas possíveis

Brauner, Maria Claudia Crespo

Marques, Carlos Alexandre Michaello

Oliveira, Mateus Miguel

Zaganelli, Margareth Vetis

Portuguese

Faculdade ICESP: Sistema Eletrônico de Editoração de Periódicos

 HUMANIDADES & TECNOLOGIA (FINOM) - ISSN: 1809-1628. vol. 43- Out. /Dez. 2023 Doi  10.5281/zenodo.10069526                                                                                                                 1 Editorial dossiê “Bioética, Meio Ambiente e Saúde Global: perspectivas científicas, epistêmicas e sociais”   Carlos Alexandre Michaello Marques1 Maria Claudia Crespo Brauner2 Margareth Vetis Zaganelli3  Mateus Miguel Oliveira4   As profundas transformações oriundas da modernidade potencializaram o desenvolvimento econômico e tecnocientífico global, especialmente no séculos XX e XXI. Porém, questiona-se, quais são os custos e limites desse progresso cada vez mais exacerbado? De imediato, podemos constatar os efeitos diretos nos sistemas ecológicos e naturais, nos modos de produção e organização sociais, no consumo e, igualmente, na saúde humana, animal e ambiental. Como resposta a essa problemática, a Bioética historicamente exsurge da necessidade de repensar as práticas relacionadas ao desequilíbrio ecológico, cientifico e biotecnológico, buscando ponderar as dicotomias entre limites e possibilidades, riscos e benefícios, em respeito                                                           1 Doutor em Direito pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos – Unisinos, com Estágio Pós-doutoral em Epistemologia Moral no Programa de Pós-graduação em Filosofia da Universidade Federal de Pelotas – UFPel. Advogado, Professor e Pesquisador do Grupo Transdisciplinar em Pesquisa Jurídica para uma Sociedade Sustentável – GTJus (CCJ/UFSC). E-mail: alexandremichaello@yahoo.com.br  2 Doutora em Direito pela Université de Rennes I - França (1993); Pós-Doutorado na Universidade de Montreal 1 - Canadá (2004). Professora Associada da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Rio Grande - FURG - RS. É membro do Réseau Universitaire International de Bioéthique (RUIB) criado na França; pesquisadora do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico - CNPq; Professora convidada da Université de Toulouse - França; Université de Rennes1 - França; Université de Montreal1 - Canadá; Université Libre de Bruxelles - Bélgica; Universidade de Kyoto - Japão; Université de Lausanne - Suiça. ORCID: https://orcid.org/0000-0003-1264-9811. CV Lattes: http://lattes.cnpq.br/8721357665840871. E-mail: mccbrauner@hotmail.com 3 Doutora em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Professora Titular da Universidade Federal do Espírito Santo (UFES). ORCID: http://orcid.org/0000-0002-8405-1838. CV Lattes: http://lattes.cnpq.br/3009983939185029. E-mail: margareth.zaganelli@ufes.br  4 Doutorando em ciências jurídicas e sociais pelo Programa de Pós-Graduação em Sociologia e Direito, da Universidade Federal Fluminense (UFF), na linha de pesquisa “Conflitos Socioambientais, Rurais e Urbanos”. Mestre em Direito pelo Programa de Pós-Graduação em Direito e Justiça Social, da Universidade Federal do Rio Grande (FURG), na Linha de Pesquisa “Direitos Humanos, Diversidade e Sociedade Digital” (2023). Bacharel no curso de Direito pelo Instituto de Ensino Superior e Formação Avançada de Vitória (IESFAVI) (2020). Pesquisador do LAB.Mundos – Laboratório de Estudos sobre Mundos em Transição (CNPq/UFF). ORCID: https://orcid.org/0000-0001-6176-2402. CV Lattes: http://lattes.cnpq.br/2502036335068023. E-mail: mateus.miguel624@gmail.com   HUMANIDADES & TECNOLOGIA (FINOM) - ISSN: 1809-1628. vol. 43- Out. /Dez. 2023 Doi  10.5281/zenodo.10069526                                                                                                                 2 e respeito à ética da vida. Em consenso teórico, a origem mais remota do termo “bioética” foi atribuída ao teólogo alemão Paul Max Fritz Jahr, que, em 1927, empregou-o em seu artigo “Bioética: uma revisão do relacionamento ético dos humanos em relação aos animais e plantas”, estabelecendo o respeito a todo ser vivo e o seu reconhecimento como um fim em si mesmo. Posteriormente, algumas obras teóricas ampliaram os horizontes das discussões bioéticas, cada qual ao seu modo, destacando-se a “Ética da terra” (1930), do engenheiro florestal estadunidense Aldo Leopold; “Bioética: Ponte para o futuro” (1971), do oncologista e biólogo estadunidense Van Rensselaer Potter; e “Princípios de Ética Biomédica” (1978), do filósofo estadunidense Tom L. Beauchamp e do teólogo James F. Childress, formando o escopo para o desenvolvimento exponencial da reflexão ética aplicada às relações biomédicas, clínicas e das pesquisas com seres humanos.  Contudo, a transição entre os séculos XX e XXI trouxe consigo a insurgência de novos dilemas de ordem química, biológica, ecológica, socioambiental e da saúde coletiva, refletidos em problemas emergentes como as mudanças climáticas, crise hídrica e energética, esgotamento dos recursos naturais não renováveis, o surgimento de endemias, epidemias e pandemias, entre outras consequências em escala global que evidenciam a necessidade do resgate das reflexões bioéticas no seu sentido ambiental e ecológico, o que tem se denominado de bioética ambiental. Buscando superar dicotomias modernas entre homem e natureza, e o paradigma do antropocentrismo, teorias que proporcionem a interseção dos fenômenos tecnocientíficos aos humanísticos e sociais, ganham maior evidência na virada do século atual, com o fim de equalizar as problemáticas ambientais e sociais. Demonstrando, para isso, que ambas possuem os mesmos valores e dimensões, pois, em certa medida, são interdependentes para a constituição e manutenção vida. Postas essas considerações, o dossiê “Bioética, Meio Ambiente e Saúde Global: perspectivas científicas, epistêmicas e sociais”, publicado na Revista Humanidades & Tecnologia (FINOM), elege a Bioética, especialmente com enfoque ambiental, enquanto disciplina que reúne perspectivas de diversas áreas do conhecimento (como a medicina, biologia, química, antropologia, sociologia, filosofia, direito, entre outras), pela interdisciplinaridade, permitindo avaliar os fenômenos relacionados a vida em sentido amplo, suscitando reflexões sobre a ética animal e ambiental, sociedade tecnocientífica e sustentabilidade, justiça climática e socioambiental, cidadania ecológica, entre tantos outros recortes e perspectivas possíveis.  HUMANIDADES & TECNOLOGIA (FINOM) - ISSN: 1809-1628. vol. 43- Out. /Dez. 2023 Doi  10.5281/zenodo.10069526                                                                                                                 3 A proposta do dossiê surgiu na Disciplina de Biodireito, que integra a grade do curso de Direito, da Universidade Federal do Rio Grande (FURG), no semestre de 2022/2. Na oportunidade, a disciplina, conduzida pela professora Dra. Maria Claudia Crespo Brauner, pelo professor Dr. Carlos Alexandre Michaello Marques e pelo estagiário de docência Me. Mateus Miguel Oliveira, a temática da bioética foi trabalhada com os discentes pela perspectiva ambiental, ressaltando aspectos econômicos e sociais imbricados à Modernidade. No semestre posterior, foram articuladas potenciais propostas de trabalhos com os discentes da disciplina e divulgação da ideia para o público externo interessado, contando com o auxílio das professoras Dras. Margareth Vetis Zaganelli e Maria Célia da Silva Gonçalves. Como resultado, após cerca de 6 meses de desenvolvimento dos artigos e organização dos trabalhos, fechamos o Dossiê com ampla participação de pesquisadores de diferentes instituições, entre as quais mencionamos: Universidade Federal do Rio Grande (FURG), Universidade Federal Fluminense (UFF), Universidade Federal do Espírito Santo (UFES), Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Universidade Federal de Alagoas (UFAL), Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Universidad Nacional Mayor de San Marcos (Peru), entre outras. Os trabalhos recebidos indicam a variedade e qualidade dos temas orientados pela bioética ambiental, oportunidade em que destacamos a seguir brevemente os títulos, autores e objetivos dos 12 artigos integrantes deste dossiê temático: 1. No artigo: Un análisis al monopolio del mercado farmacéutico en Perú, Víctor Fernando Burgos Zavaleta e Mariana Lucía Burgos Jaeger (autores estrangeiros – Peru), analisam o monopólio do mercado farmacêutico que se desdobra no Peru e os impactos que ele tem desencadeado, com o intuito de fornecer uma explicação e compreender a sua dimensão pela perspectiva da bioética. 2. No artigo intitulado: Do imperativo Bioético à época do Antropoceno: por que devemos “fazer parentes”?, Mateus Miguel Oliveira (UFF) e Roberta Oliveira Lima (UFF) objetivam demonstrar que, para romper o paradigma antropocêntrico, é preciso adotar novas perspectivas e práxis que reivindiquem, por exemplo, a promoção dos direitos morais próprios da natureza como um fim em si mesmo, conforme Hans Jonas, e uma nova parentalidade interespécies no “Chthuluceno”, como proposto por Donna Haraway; 3. No artigo: Vidas dizimadas pela pesca de arrasto: uma análise da perda da biodiversidade marinha sob o prisma da bioética e da Agenda 2030 da ONU, Gabriel da Silva Goulart (FURG), Rafaela Isler da Costa (FURG), Júlia Silva Gonçalves (FURG) e Sheila  HUMANIDADES & TECNOLOGIA (FINOM) - ISSN: 1809-1628. vol. 43- Out. /Dez. 2023 Doi  10.5281/zenodo.10069526                                                                                                                 4 Stolz da Silveira (FURG) tratam da pesca de arrasto, que é considerada como a maior destruição realizada no fundo dos oceanos, que dizima a biodiversidade marinha e impacta o equilíbrio ecológico do planeta, concluindo ser uma prática predatória, capitalista e que não compromete-se com a bioética ambiental ou com os objetivos da Agenda 2030; 4. No artigo: Dignidade dos animais não-humanos: a proteção de animais em pesquisas científicas e a lei nº 11.794/08, Gláucio da Silva Teixeira Júnior (UFF), Thalita Dutra Ramos (UFF) e Margareth Vetis Zaganelli (UFES) analisam os aspectos legais da proteção dos animais em pesquisas de cunho científico, principalmente à luz da Lei nº 11.794/08, conhecida como Lei Arouca, tecendo considerações sobre o atual cenário de percepção dos direitos dos animais, bem como as questões constitucionais que envolvem o tema, tendo, como alicerce, a ideia de dignidade da vida em geral; 5. No artigo: Corporações e (ir)responsabilidade: da poluição da água, ar e solo aos impactos na saúde pública, Brenda Moreira Godoy (FURG), Pamela Maris de Andrade (FURG) e Maria Claudia Crespo Brauner (FURG) referem-se aos casos de desastres ambientais ocorridos no Brasil, causados por grandes corporações, que maximizam as mazelas presentes na sociedade e destroem o ambiente pelo excesso de poluição da água, ar e solo, causando impactos na saúde pública, indicando a necessidade de intervenção estatal para a diminuição dessas problemáticas; 6. No artigo: Natureza como bem ou recurso? Premissas sobre a exploração ambiental e o desenvolvimento das corporações, Mateus Miguel Oliveira (UFF) e Yane Lopes de Freitas (FURG) tratam da divergente compreensão da natureza enquanto bem ou recurso, imbricada às questões histórico-políticas-culturais e jurídicas dessa cosmovisão, como a Revolução Industrial, a consolidação do capitalismo e o desenvolvimento das corporações, aspectos idealizadores da modernidade que corroboram com o cenário de devastações ambientais; 7. No artigo: A relação entre o hiperconsumo e a ética ambiental: dicotomias socioambientais, Bruna de Almeida Faria (FURG), Paola do Nascimento Vicente (FURG) e Carlos Alexandre Michaello Marques (OAB/RS) objetivam analisar a relação entre o hiperconsumo e os pressupostos da ética ambiental no mundo contemporâneo, de modo que os processos utilizados para atingir este objetivo foram definir o que é o hiperconsumo, além de contextualizar como se originou e desenvolveu esse modelo; 8. No artigo: A ética ambiental como fator imprescindível à sobrevivência do planeta e dos seres humanos, Mariana Coelho Sampaio (UNIOESTE) e Carlos Alexandre  HUMANIDADES & TECNOLOGIA (FINOM) - ISSN: 1809-1628. vol. 43- Out. /Dez. 2023 Doi  10.5281/zenodo.10069526                                                                                                                 5 Michaello Marques (OAB/RS) objetivam analisar como as ações promovidas para sustentar o sistema econômico capitalista foram prejudiciais para o meio ambiente e, também, para os próprios seres humanos, considerando que a ética ambiental deve ser o elemento principal ao propor novas ações a fim de proteger o planeta; 9. No artigo A necessidade ética para a preservação natural: uma revisão acerca das contribuições da bioética e educação ambiental, Maria Claudia Crespo Brauner (FURG), Maria Eduarda Clasen da Rosa (UFSC) e Mateus Miguel Oliveira (UFF) objetivam delinear o panorama geral da contribuição bioética e educação ambiental para a ética ambiental em benefício da preservação natural, diante das características estruturantes da modernidade; 10. No artigo: Medicalização e liberdade: uma discussão ética sobre a ideia de autonomia na pandemia da covid-19 no brasil, Diego da Silva Guimarães Queiroz (UFAL), Margareth Vetis Zaganelli (UFES) e Maria Célia da Silva Gonçalves (Unb) tratam sobre as questões concernentes aos acontecimentos na pandemia da COVID-19 no Brasil e de como a medicalização foi justificada pela ideia de liberdade durante esse período, afetando drasticamente a relação médico-paciente, o que trouxe desdobramentos para o pós-pandemia; 11. No artigo: Discriminação genética e direitos fundamentais: uma revisão à luz do biodireito, Daniel Vitor Silva Queiroz (FURG), Dierick Bernini Marques Costa (FURG) e Margareth Vetis Zaganelli (UFES) questionam em que medida o Biodireito mitiga as discriminações genéticas e como seus princípios norteadores podem evitar futuros danos à humanidade, além de evidenciar a necessidade de aplicação de regulamentos norteadores; 12. No artigo: Questões morais em Bioética Clínica associadas à Cirurgia Robótica, Thalita Dutra e Silva, Caio Aramys Freitas Teodoro, Josimário Silva e Carlos Antonio de Souza Filho analisam as principais questões bioéticas existentes no âmbito da cirurgia robótica e concluem que, apesar dos inúmeros benefícios associados à cirurgia robótica, a sociedade deve lidar atentamente com essa tecnologia, uma vez que ela pode colocar em xeque princípios fundamentais da bioética, como justiça e não-maleficência. Diante dessas breves considerações, desejamos que as reflexões do presente número possam contribuir com o pensamento crítico, sensível e transformador dos leitores e leitoras no que diz respeito as causas socioambientais, humanas e animais, pois acreditamos que a ética da vida deve ser destinada para todas as vidas, com respeito, dignidade e novas percepções de respons-habilidades para o tempo presente. 

Editorial dossiê “Bioética, Meio Ambiente e Saúde Global: perspectivas científicas, epistêmicas e sociais”

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