Inland wetlands in the lower Tagus: land uses, habitat condition and fish communities

Abstract

Tese de Mestrado, Ecologia e Gestão Ambiental, 2023, Universidade de Lisboa, Faculdade de CiênciasO aumento da população mundial e a consequente conversão de terras para agricultura e ocupação urbanística, têm vindo a acentuar a perda e degradação de habitats e o colapso da biodiversidade. As zonas húmidas de água doce são um dos ecossistemas mais ameaçados do mundo e importantes “hotspots” de biodiversidade. Constituem refúgios para diversas espécies em declínio, e fornecem diversos Serviços de Ecossistema, e múltiplos benefícios para o bem-estar humano. Estes aspetos têm vindo a ser crescentemente reconhecidos, e a conservação e restauro das zonas húmidas de água doce assume cada vez mais relevância nos planos para a inverter a perda de biodiversidade a nível nacional e regional. Esta tendência é notória nos planos da Convenção sobre Diversidade Biológica (CBD), Estratégia de Biodiversidade para 2030 da União Europeia e na Estratégia Nacional de Conservação da Natureza e Biodiversidade para 2030, que figuram como o maior desafio da política ambiental do século XXI. As zonas húmidas de água doce são particularmente importantes na região do Mediterrâneo, devido à elevada taxa de espécies endémicas ameaçadas nesta região, e à sua acrescida suscetibilidade a pressões humanas e às alterações climáticas. Identificar e monitorizar as comunidades biológicas nestes ambientes e avaliar as pressões que os afetam é por isso da maior relevância, particularmente em zonas com menor informação. A identificação e monitorização de zonas húmidas tem vindo a melhorar substancialmente nos últimos anos, em associação com o desenvolvimento de técnicas como a deteção remota, e a disponibilização de informação pelas missões de satélite Sentinel. A utilização desta informação, com elevada precisão e cobertura temporal, facilita a monitorização das alterações nos ecossistemas e permite atuar de forma mais informada nos locais com maior necessidade de conservação. O Tejo é o rio mais longo da Península Ibérica, e no seu segmento terminal, desde a Golegã até Lisboa, drena uma extensa planície aluvial. A região do Baixo Tejo, é historicamente caracterizada por inundações anuais, que transforma toda a paisagem numa imensa zona húmida, podendo inclusive isolar algumas localidades. Atualmente estas situações são cada vez menos frequentes devido à construção de barragens e regularização dos caudais do rio, as quais permitiram também a atual expansão da agricultura intensiva, mas que também terão contribuído também para o desaparecimento de várias zonas húmidas na região. Este trabalho pretendeu assim identificar as zonas húmidas de água doce que persistem atualmente no Baixo Tejo, quantificar os usos atuais do solo e as alterações que ocorreram nos últimos 10 anos nestas zonas, e caracterizar as comunidades de peixes dulciaquícolas locais. Assim, a área de estudo abrange apenas zonas de baixa altitude (≤ 50 m), sendo esta mais suscetibilidade à ocorrência de inundações, e onde existe uma maior probabilidade de ocorrência de zonas húmidas de água doce. Com base em deteção remota, e na combinação de imagens captadas pelo satélite Sentinel-2 através do Índice de Água de Diferença Normalizada (NDWI), foram identificadas 409 massas de água na região do Baixo Tejo, entre a Golegã e Lisboa. Destas, 30 apresentaram capacidade de manutenção de água durante o período seco, tendo desta forma, sido consideradas como possuidoras de potencial para albergar comunidades de peixes. Após análise in loco, foram selecionadas para amostragem 11 zonas húmidas, globalmente representativas da variabilidade de condições ambientais observadas na região do Baixo Tejo. O uso do solo entre 2007 e 2018 foi quantificado a partir das Cartas de Uso e Ocupação do Solo da Direção Geral do Território. Para facilidade de interpretação e comparação, os usos do solo foram reclassificados e agrupados em quatro classes abrangentes, designadamente, Urbano/Industrial (UI), Agricultura Intensiva (IA), Agricultura Extensiva (EA) e Áreas Naturais (NA). Especificamente, a alteração do uso do solo foi determinada a partir da diferença da representação das classes EA e NA de dois períodos distintos, em 2018 e a média do período correspondente aos anos de 2007, 2010 e 2015. Complementarmente, com base na representação da UI e IA em 2018, as zonas húmidas foram classificadas em cinco categorias pressão, de Excelente a Severamente Perturbado. Os usos e ocupação do solo nas áreas adjacentes às zonas húmidas apresentaram uma grande heterogeneidade. O uso mais representado e transversal às zonas húmidas foi a IA (em média 42.9 %), sendo muito relevante na Golegã, Santana e Setil (> 70 %). Foram também observadas percentagens elevadas(> 60 %) de NA em Gouxa, Granho e Sto Estevão, e de UI em Manique Intendente e Caniceiras, não ocorrendo esta última em Muge, Granho e Sto Estevão. Entre os períodos analisados, verificou-se um decréscimo da UI e IA nas áreas adjacentes a todas as zonas húmidas, excetuando no Setil, Caniceiras e Pinhal Novo onde a IA tem vindo a aumentar. As zonas húmidas com maior perturbação foram Golegã, Manique do Intendente e Caniceiras, com UI elevada, e Santana, Muge, Setil e Pinhal Novo, com IA elevada. As zonas húmidas classificadas em bom estado, foram Gouxa, Granho, Ota e Sto Estevão, onde tem vindo a ocorrer uma diminuição da agricultura intensiva em favor da agricultura extensiva e de áreas naturais nas áreas adjacentes. As comunidades piscícolas das 11 zonas húmidas selecionadas foram amostradas entre 6 de maio e 11 de junho de 2021, com recurso a armadilhas, redinha e pesca-elétrica. As comunidades foram caracterizadas em termos de capturas por unidade de esforço (CPUE), com base no método Multi Gear Mean Standardization, que tem vindo a revelar-se particularmente adequado no estudo da estrutura de comunidades. No total foram capturados 8 272 peixes, de cinco espécies nativas e de oito espécies nãonativas. Embora a generalidade das comunidades piscícolas locais tenham sido dominadas por espécies não-nativas, foram encontradas duas espécies classificadas como criticamente ameaçadas (CR) a nível global, nomeadamente, a Enguia europeia (Anguilla anguilla) e a Boga-de-boca-arqueada-de-lisboa (Iberochondrostoma olisiponense), em cinco e duas zonas húmidas, respetivamente. As comunidades piscícolas de Setil e Sto Estevão que mantêm conectividade direta com o curso principal do Rio Tejo, foram as únicas que incluíram uma espécie migradora e uma espécie potamódroma, respetivamente a Taínha fataça Chelon ramada e o Barbo-ibérico Luciobarbus bocagei. Por sua vez, Golegã and Gouxa que são isolados e profundos apresentaram a maior abundância de Achigã Micropterus salmoides e de Perca-sol Lepomis gibbosus. Pelo contrário, Caniceiras que é pouco profundo e mantém alguma conectividade com a rede hidrográfica em eventos de cheia, apresentou o maior número de espécies nativas, incluindo não só a Enguia-europeia e a Boga-de-boca-arqueada-de-lisboa, mas ainda o Verdemã-comum (Cobitis paludica). A Boga-de-boca-arqueada-de-lisboa foi ainda encontrada no Granho, sendo esta uma nova localização para a sua área de distribuição no baixo Tejo. Apesar da prevalência de espécies não-nativas nas comunidades locais, os resultados obtidos indicam que algumas zonas húmidas do Baixo Tejo poderão ainda servir como zonas de refúgio para espécies de peixes ameaçadas. No entanto, a colonização de espécies não-nativas nas zonas húmidas é muito preocupante e pode representar uma pressão significativa para a fauna nativa. A expansão de áreas naturais e agricultura extensiva, abrem oportunidades para implementação de melhores práticas agrícolas na vizinhança das zonas húmidas, as quais, em associação com processos de conservação e restauro, podem contribuir para inverter a tendência de expansão de espécies não-nativas e de perda de biodiversidade.Inland wetlands are widely recognized as biodiversity hotspots, and among the most threatened ecosystems worldwide. Conservation management and restauration actions are thus urgently needed in inland wetlands, especially in areas harbouring endangered endemic species. The role of inland wetlands in Lower Tagus in supporting endangered endemic fish remains unclear. This work assessed the status of inland wetlands in the region and its local fish communities. Inland wetlands were identified using the Normalized Difference Water Index with Sentinel-2 imagery. Land use and change were derived from soil use and occupation charts. Fish communities were surveyed using multiple techniques and the Gear Mean Standardization approach, and related to habitat, landscape, and land use and change. In total, 409 water bodies were identified in the Lower Tagus, 30 of which with potential to host fish. Seven out of 11 wetlands assessed were heavily disturbed, though intensive agriculture tended to reduce and be replaced by extensive agriculture and natural areas in the last years. Fish communities included five native species, but were dominated by eight non-native species. Setil and Sto Estevão were directly connected to the Tagus River and harboured Iberian barbel and Thinlip grey mullet, while the deep and isolated Golegã and Gouxa harboured Largemouth bass and Pumpkinseed sunfish and the shallow Caniceiras included threatened European eel, Southern Iberian Spined loach and Lisbon arched-mouthed nase. These results indicate that some wetlands in the Lower Tagus may act as refuge habitats for threatened fish, despite non-native fish prevalence. Efforts should focus on preserving and restoring these wetlands and in controlling non-native species spread in the region

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