Os autores relatam um caso de tumoração retro-peritoneal assintomática, tratado por ressecção cirúrgica e radioterapia, cujo exame anátomo-patológico definiu o diagnóstico de Doença de Castleman ou Hiperplasia Angiofolicular de Gânglio Linfático. Através da revisão bibliográfica e da própria evolução clínica do caso, tecem considerações sobre o comportamento biológico do tumor e dos possíveis mecanismos etiológicos

Denize D'azambuja R. R. Câmara

Everardo Leite Gonçalves

Miguel Cardim Monteiro

Paulo André Porto

Revista Brasileira de Cancerologia

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Rev Bras Cancerol 30(4).-41-45,1984HIPERPLASIA ANGIOFOLICULAR (DOENÇA DE CASTLEMAN)A propósito de um casoDENIZE d'AZAMBUJA R. R. CÂMARA^EVERARDO LEITE GONÇALVES'*MIGUEL CARDIM MONTEIRO^PAULO ANDRÉ PORTO®RESUMOOs autores relatam um caso de tumoração retro-peritoneal assintomática, tratado porressecção cirúrgica e radioterapia, cujo exame anátomo-patológico definiu o diagnóstico de Doençade Castieman ou Hiperplasia Angiofolicular de Gânglio Linfático. Através da revisão bibliográfica e da própria evolução clínica do caso, tecem considerações sobre o comportamento biológicodo tumor e dos possíveis mecanismos etiológicos.UNITERMOS Tumor retro-peritoneal; Hiperplasia de gânglio linfático; hamartoma de gânglio linfático.de reação do hospedeiro aomesmo agente etiológico, ouse duas entidades clínico-pa-tológicas distintas?.0 tipo hialino-vascular, maisfrequentemente encontrado, écaracterizado morfologicamen-te pelo número aumentado defolículos linfóides, não apenas restritos à porção corti-cal do gânglio linfático, masdistribuídos por todo o parên-quima, sendo esses folículostransfixados por capilares comfreqüente espessamento mural hialino, por vezes asse-melhando-se ao corpúsculo deHassal do timo e circundados por pequenos linfócitos deNo momento, tem sido aceito que esta patologia rara ede etiologia não esclarecida,possivelmente representa umprocesso reativo a agentesmeio-ambientais, provavelmente virais, principalmente quando observada em pacientescom infecção tráqueo-brônqui-ca prévia, não sendo esses pacientes distinguidos por faixa etária ou sexo.São classicamente descritas duas variantes histológicasdistintas da hiperplasia angiofolicular de gânglios linfáti-cos, não estando claro se representariam dois estágios deuma síndrome, dois padrõesINTRODUÇÃOA hiperplasia angiofolicularfoi inicialmente descrita porCastieman e colaboradores em1954, como tumoração me-diastinal volumosa, benigna ede origem linfóide. i-?Publicações posteriores demonstraram a presença destatumoração em regiões extra-mediastínicas tais como a cer-vical, a mesentérica, a retro-peritoneal e, ainda, em outrossítios anatômicos que independem da existência de gânglioslinfáticos; daí, ser ela considerada por alguns autorescomo hamartoma 3.^ Médico Cirurgião do Serviço de Cirurgia Gerai I doHospital dos Servidores do Estado. INAMPS. RJ.2 Médica Patologista do Serviço de Anatomia Patológica doHospital dps Servidores do Estado. INAMPS. RJ.^ Médico Residente do Serviço de Cirurgia Gera! / doHospital dos Servidores do Estado. INAMPS. RJ.* Médico Residente do Serviço de Cirurgia Gera! II doHospital dos Servidores do Estado. INAMPS. RJ.Trabalho realizado no Hospital dosServidores do Estado, Rio de Janeiro.Endereço do AutorMIGUEL CARDIM MONTEIROR. Nascimento e Silva, 363 4o andar22421 - Rio de Janeiro - RJ4142 Rev. Bras. de Cancerologia m N9 4 » V. 30 9 outubro/1984distribuição lamelar, concêntrica. Esse padrão lesional égeralmente assintomático e delocalização mediastínica.A segunda variante histoló-gica, tipo plasmocitário, mostra ainda a presença de folí-culos hiperplásicos, porém decentro germinativo volumoso,sendo as zonas inter-folicu lares e medulares ocupadas porninhos de plasmócitos, maduros na sua maioria, por vezesde permeio a formas imaturas e atípicas, sendo maisfreqüentemente de localização mesentérica e retroperi-toneal. Essa segunda variante égeralmente associada à sintomatologia clínica de febre e as-tenia. Laboratorialmente apresenta VHS elevada, hiper-globulinemia policlonal, hi-peraíbuminemia, hipoferremia,hipotransferrinemia e ocasional presença de anticorpo an-ti-eritropoietina circulante, relacionados à anemia refratá-ria por veses observada nesses casos.O caso em questão foi 0primeiro estudado no Hospitaldos Servidores do Estado,INAMPS, RJ. Devido à raridade e principalmente aosdiagnósticos diferenciais a serem considerados, acreditamosque essa patologia merece algumas breves considerações.xia moderadas. Nega dor abdominal, febre, icterícia, anemia,náuseas e vômitos durante toda a evolução da doença.A perda de 5 quilos de pesonão pode ser . consideradaimportante pois a pacipnte seguia dieta hipocalórica.Nascimento, desenvolvimento e histórias fisiológica, familiar e patológica pregressa nãodemonstraram dados significativos. Gesta IV para IV.Exame físico revelou paciente obesa, com bom estado geral, lúcida, em decúbitoindiferente no leito com mu-cosas úmidas e coradas. Pressão arterial e pulso normais.Distribuição pilosa bastanteacentuada (pêlos grossos e negros), principalmente nosmembros e abdome. Ausênciade adenomegalias palpáveis.Demais regiões do corpoexaminadas sem achados significativos. Abdome globoso, simétrico, flácido, depressível,indolor à palpação superficiale profunda. Fígado e baçoimpalpáveis. Presença de tu-moração ao nível do flancodireito, arredondada, de consistência endurecida, medindocerca de 15x12 cm, de limites precisos, indolor, não aderida ã parede abdominal anterior, fixada aos planos profundos e bastante móvel nosentido lateral. Ausência derechaço lombar e punho-per-cussão indolor. Toque retalnormal. Internada no Serviço de cirurgia geral para esclarecimento diagnóstico.Radiografias dos campospleuro-pulmonares normais.Radiografias simples do abdome revelaram opacificação doflanco e fossa ilíaca direitos.Ultrassonografia abdominalmostrou uma massa retro-pe-ritoneal sólida, medindo12x10 cm, ao nível da junção flanco-fossa ilíaca direita,provavelmente de origem gan-glionar e adenomegalias peri-aórticas medindo em média3cm. Exame ginecológico revelou leucorréia e inconti-nência urinária'discretas. Umaurografia excretora demonstrou eliminação simultânea decontraste por ambos os rins,mas mostrou deslocamentomediai e anterior do 1/3médio do ureter direito. Radiografias contrastadas do esôfago, estôipago e duodeno etrânsito do delgado foramnormais. Exame proctológicoe  clister opaco sem anormalidades. Os exames laboratoriais revelaram resultadosde bioquímica, hemogramacompleto e sedimento urináriosem alterações. Parecer cardio-lógico constatou risco cirúrgico grau I.Após os preparos de rotina, a paciente foi submetida a uma laparotomia exploradora por meio de incisãoparamediana direita, supra-infra umbilical pararretal interna. Exploração cavitária sistematizada, demonstrou linfo-nodos da cadeia peri-aórticahipertrofiados de cor avermelhada, medindo cerca de2cm aproximadamente, aderidos aos tecidos adjacentes.Tumoração retro-peritoneal decor pardo-avermelhada, medindo 12x10cm, de consistênciafibro-elástica,aderida à aponeurose do músculo psoas direito, ureter eveias cava, ovariana e ilíaca.Após liberação do tumor dasestruturas citadas, foi realizada ressecção ampla em mono-bloco dos linfonodos peri-ilía-cos, aórticos e do tumorcom a aponeurose musculare gordura adjacentes. Toda aárea ressecada foi delimitada por meio de clips metál icos. Drenagem da cavidade por contra-abertura lateraldireita e fechamento da parede por planos. A peça cirúrgica foi enviada ao Serviço de Anatomia Patológica.(Figura 1).Pós-operatório semi complicações, com deambulação einício de alimentação oralprecoces.encapsulada.APRESENTAÇÃO DO CASO:Paciente do sexo feminino,branca, 37 anos, viúva, dolar, natural do estado da Paraíba, procedente do Rio de Janeiro. Em janeiro de 1983veio à consulta no ambulatório de cirurgia geral coma queixa de "tumoração nabarriga". Relata a paciente quehá um ano, quando fazia dieta para emagrecimento, notoutumoração no flanco direito,arredondada, móvel e indo-.lor, concomitante com 0 aparecimento de hipertricoseacentuada do abdome e membros. Seis meses depois, notouaumento progressivo do tumor e constipação intestinalde até 5 dias, que se acompanhavam de astenia e anore-ANATOMIA PATOLÓGICAPC (165424). Material ma-croscopicamente representadopor segmento de tfecido amarelado, lobulado, untuoso e43Monteiro et al.Hiperplasia angiofolicularquenas dimensões, são de localização cortica.1, (Figura 2),mostrando centro germinativoativado, centrado por estrutura capilar com freqüente espes-samento mural por materialhialino PAS positivo, (Figura 3), sendo a porção periférica constitufda por pequenos l infócitos com arranjoregular concêntrico, configurando aspecto em bulbo de cebola. As regiões interfolicu-lares e medular mostram-sepredominante-constitufdasmente por plasmócitos maduros, tendo de permeio ocasionais l infócitos, histiócitose raros imunoblastos, ao ladode proliferação de células deendotélio hiperplásico. (Figura 4). Nesas áreas, é observada positividade pela técnicada avidina-biotina-peroxidasecom anti-lgG, anti-lgM e anti-IgA, de padrão citoplasmáti-co. (Figura 5). Os gângliosl infáticos peri-aórticos enviados, mostraram padrões dehiperplasia l inforreticular eextensas áreas de hemorragiarecente, não apresentando alterações significativas, assimcomo o tecido adiposo peri-tumoral.O diagnóstico conclusivofoi de Fliperplasia Angiofol icular do gânglio l infático, depadrão transicional, com áreastanto concordantes com o tipo hialino-vascularcom a variante plasmocitária.quantoFIGURA 1 - Peça cirúrgica. Tumor encapsulado.DISCUSSÃOAlguns aspectos merecemser considerados no que tangea essa patologia. Já pela vasta sinonímia existente, (hiperplasia gigante do gângliol infático, hamartoma linfóideangiomatoso, hamartoma dogânglio l infático, hemolinfo-nodo gigante, etc.), constatamos a dificuldade dos autores revisados em estabelecerem etiologia definida paraesta condição ̂ ^ > lo.O achado, como parece sero nosso caso, de formas mistas sugestivas de transiçãocom características de ambas as variantes classicamenteFIGURA 2 - Visão panorâmica da porção corticai.Folículos secundários esparsos. Zona interfolicular alargada. (HEx200).maduro envolvendo gângliol infático de arquitetura alterada à custa predominantemente de acentuado alargamento das áreas interfol i-culares sendo a porção medular de celularidade aumentada. Os folículos linfóidespresentes, escassos e de pe-elástico, medindo 8x7x6cmcom superfície do corte representada na porção central por tumoração nodularesbranquiçada, firme-elástica,sobre-elevada. aparentemen-encapsulada, medindo4x3x2,5cm. Microscopicamente observa-se tecido adiposote44 Rev. Bras. de Cancerologia 0 Ní> 4 0 V. 30 0 outubro/t984É  conhecido 0 potencialdo tecido linfóide dedesenvolver em face de estímulo, em localizações ectópi-cas como manifestação deinfecção crônica. Não parece haver no nosso caso, relação com possível iatrogenia,como observado, por Moraise colaboradores 7 porém, a relação temporária de mudançade hábitos alimentares e progressão volumétrica do tumor é notada n.Não obtivemos nenhum relato de infecção prévia dequalquer etiologia, como também não conseguimos correlacionar a concomitância doaparecimento do tumor com ahipertricose acentuada e comausência de sintomatologia clínica importante.Os achados histológicos relatados são característicos daDoença de Castiemian. O exame anatomo-patológico foidefinitivo para 0 diagnóstico,uma vez que insuspeitadoquando do exame clínico eda cirurgia. Acreditamos queos diagnósticos diferenciais aserem considerados como os del infomas foiiculares, timomas,plasmocitomas. Doença deHodgkin e linfadenopatias an-gioimunoblásticas, possam serrealizados com segurança, mesmo num laboratório de rotina, sem a necessidade douso de técnicas sofisticadas,mas através de critérios mor-fológicos bem definidos.O tratamento de escolha em •ambas as formas da Doençade Castieman é a remoçãocirúrgica da tumoração, 0 queresulta em pronta remissão dossintomas e normalização dasalterações laboratoriais, quando presentes.A resposta desses tumores àradioterapia é discutida. Contudo, o tipo hialino-vasculare o padrão transicional, geralmente multicêntrico, podem apresentar excelente resposta radioterápica s.s.Nosso paciente como já citado, não apresentava a sintomatologia clínica e as anormalidades laboratoriais descritas nas publicações revisadas.seFIGURA 3 — Detalhe do foiículo mostrado na figura 2.Notar centralização por estrutura vascular de paredeespessada e arranjo linfocitário periférico. (HE  x 400).FIGURA 4 — Zona interfolicular. Predomínio de plas-mócitos em meio a ocasionais imunoblastos (PAS x 600).descritas, certamente indica,ao nosso ver, alguma relação entre as duas formasclássicas.tária represente um estágio inicial ativo e a variante hial ino-vascular um estágio tardio,,isso considerando a etiologiareacional, inflamatória, inclusive quando da localizaçãoextra-nodal.Keller e colaboradores^, sugerem que a variante plasmoci-45Monteiro et al.Hiperplasia angiofolicularResembling Thymoma. Cancer 9 :822-830, 1956.2. CASTLEMAN, B.; Case Records ofthe Massachussets General Hospital. Case 40011. N. Engi J. Med.250 : 26-30, 1954.3. PEMBERTON, J. ET AL: GiantHaemolhyph Nodes. Report of twocases. Surg. Clin. of N. Amer. 30 :1147-1153,1950.4. KELLER,L.; CASTLEMAN, B.: HyaHne-Vas-cular and Plasma Cell Types ofGiant Lymph Node Hyperplasia ofthe Mediastinum and Other Loca-tions. Analysis. Cancer, 29 : 670.-683, 1972.5. NORDSTROM, D.A. R.; HOCHHOLZER,G.: HAMED,H. T.; HOWARD, B. L,; PlasmaCell Giant Lymph Node Hyperplasia Responding to Radiation The-Am. J. Roentgenol. 130rapy.169-171, Jan, 1978.6. MARTI, M. B. ET AL; Multicen-tric Giant Lymph Node Hyperplasia. Cancer 1 ; 808-810, 1983.7. MORAIS, J. C. O.; PIRMEZ, C,;PULCHERI, W.; FRANCO, C. A. B.:Hiperplasia Angiofolicular de Gânglio Linfático. Relato de dois casos.Nouv. Presse Méd. Ed. Bras. 183-FIGURA 5 - Mesmo campo da figura 4. Incubaçãoanti igG (avidina-biotinaperoxidase x 400).Todavia, quatro meses apósa cirurgia, um exame ultras-sonográfico revelou formaçãoexpansiva retro-peritoneal, pe-ri-aórtica direita alta, caracterizando lesão de origem mul-ticêntrica.Optamos então pelo tratamento radioterápico, em dose de 4000 rds, em toda acadeia l infática retro-peritoneal peri-aórtica, após o qualnovo exame ultrassonográficorevelou remissão completa datumoração.Nosso tempo de follow-upainda é pequeno para avaliações, porém as condições clínicas da paciente continuaminalteradas, não apresentandoaté 0 momento nenhuma evi-comdência de recidiva,SUMMARYA report of a cadings.Considerations aboREFERÊNCIAS BIBLIOB.;1. CASTLEMAN,MENENDEZ, V.; -189, 1982.8. TUNG, K. S. K.; Mc CORMACK,L. J.; Angiomatous Lymphoid Ha-Report of Five Casesmartoma.no acompanhamento ambulatorial.I/Vith a Review of the Literature.Cancer. April, 20, 1967.9. FISCHER, E.: SIERACKI, J. C.;GOLDEMBERG, D. 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Hiperplasia Angiofolicular (doença de castleman): a propósito de um caso

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Hiperplasia Angiofolicular (doença de castleman): a propósito de um caso

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