Fuchs, Flávio Danni

Arquivos Brasileiros de Cardiologia

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Lume 5.8

443Hipertensão Arterial Sistêmica.Epidemiologia e Fatores de RiscoFlávio Danni FuchsO risco que a elevação da pressão arterial (PA)representa para o sistema cardiovascular e outros órgãos ébem conhecido. O estresse hemodinâmico decorrente deregimes de pressão, sustentadamente elevados, originacardiopatia, nefropatia  e retinopatia hipertensivas, além dese constituir em um dos principais fatores para as doençasaterotrombóticas 1-4.O estabelecimento da prevalência  desse fator de  riscotem sido objeto de preocupação de muitos países. No Brasil,faltam estudos representativos de todo o país, tendo asinvestigações restringido-se a cidades 5,6, trabalhadores 7 ea um estudo representativo de um estado 8. Não sedescreveu, ainda, a evolução das taxas de prevalência emnenhuma destas comunidades.O estudo de fatores associados à prevalência e,mesmo, à incidência de novos casos, é outro objetivo deinvestigações internacionais. A caracterização daquelesfatores orienta a prevenção primária de hipertensão arterial(HA) 9,l0. No Brasil, poucos avaliam a associação de fatorescomo idade, sexo, grupo étnico, nível sócio-econômico,fumo, consumo de álcool e padrões de ingesta salina coma prevalência de HA 5,7,11,12.Neste estudo, é descrita a taxa de prevalênciacontemporânea de HA em Porto Alegre, (RS), permitindocompará-la com a da década de 70. Avalia-se, também, aassociação de HA com diversos fatores biológicos,demográficos e de exposição ambiental. São destacados o papeldo sal e do álcool, submetidos a investigações específicas naUnidade de Farmacologia Clínica de Porto Alegre.Estudo de prevalência e fatores associadosO  estudo de prevalência teve base populacional. Oprocesso de amostragem aleatória proporcional deu-se porestágios múltiplos e por conglomerados, a partir de dadosdo IBGE relativos ao censo de l980. Foram seguidoscritérios de pesquisa epidemiológica.Os critérios de inclusão foram ter 18 anos completosou mais e residir no domicílio sorteado. Definiu-se, comoresidente aquele que dormia pelos menos 4 vezes porsemana no local. Dos 1.188 selecionados, foramentrevistados l.09l indivíduos (91,9%).A equipe de pesquisa foi treinada em condiçõessimuladas e reais, sob supervisão. Para controle daqualidade, l0% de entrevistados foram visitados pelossupervisores. O questionário continha questões referentesa dados pessoais, sócio-econômicos, história familiar deHA, uso de fármacos, tabagismo, medidas antropométricas(peso, altura, circunferência braquial, cintura e quadril),aferidos com balanças portáteis e trenas, sendoconsideradas normas técnicas padronizadas 13,14. A PA foimedida, no início e no final da entrevista, com manômetrosaneróides periodicamente calibrados contra manômetros demercúrio, e com atenção a normas técnicas 15,16. Codificaçãometiculosa, digitação sob programas de consciência, revisãomanual de l0% dos questionários e análise das freqüências,dos valores extremos e de relações entre variáveis garanti-ram a qualidade dos dados analisados.A  comparação de variáveis demográficas aferidasneste estudo, como sexo, idade e renda, com as fornecidaspelo censo de 1991 e PNAD-90, confirmam que a amos-tra é representativa de Porto Alegre.O índice de massa corporal médio de toda amostra foide 25,2 (± 4,7) kg/m2, tendo 305 (28,0%) um índice supe-rior de 27,0. A escolaridade média foi de 7,9 (± 4,0) anos,sendo que 72 (6,6%) nunca freqüentaram a escola e 251(23,0%) tinham pelo menos o curso superior incompleto,62 (5,7%) disseram-se analfabetos, 179 (15,5%) abusavamdo álcool, 383 (35,l%) eram fumantes e 194 (17,8%) ex-fumantes.A prevalência da hipertensão arterial sistêmica (HAS)foi de 12,6% (IC=10,6 a 14,6), pelo critério de 160/95mmHg, subindo para 19,2% (IC=16,9 a 21,5) quando seadicionaram os indivíduos  com PA normal usando anti-hipertensivos. Pelo critério de 140/90mmHg, asprevalências correspondentes foram de 25,8 (23,2 a 28,4)e de 29,8% (IC= 27,1 a 32,5).  Dos indivíduos, 11%stavam usando anti-hipertensivos, estando 58,9% com apressão controlada frente ao critério de 160/95mmHg e35,5% quando se considerou a pressão de 140/90mmHg.Pelo critério de 160/95mmHg, 57,75 dos 137 hipertensossabiam ser hipertensos. A prevalência de HA aumentoucom a idade e foi maior nos obesos, com história familiarde HA, de  menor escolaridade  e abusadores de álcool(consumo >30g/dia). Em modelo de regressão logística, foidemonstrado que estas características tinham associaçãoindependentes das demais.O presente estudo permite descrever com acuidade aprevalência contemporânea de  HAS na região urbana dePorto Alegre, atualizando os obtidos por Achutti e col nadécada de 70 8, que demonstrou não haver evoluçãofavorável dos índices de prevalência. Também detectou uminsuficiente conhecimento do diagnóstico por parte dosentrevistados e um grau de controle entre os tratados aindanão satisfatório. O estudo de Araraquara 6 apresenta taxasde prevalência acentuadamente mais elevadas, sugerindoque os fatores de risco para a doença devem ser maisfreqüentes na cidade do interior de São Paulo.Por fim, esta investigação confirmou, em nosso meio,a  associação de HA com fatores de risco bem conhecidos,com especial destaque para o abuso de álcool, umaexposição ambiental potencialmente removível.444 Arq Bras Cardiolvolume 63, (nº 5), 1994Fuchs FDHipertensão arterial sistêmicaAbuso de sal. Investigações específicasA influência do consumo de quantidades excessivas de salsobre a elevação da PA com a idade é bem conhecida 17.Faltam, entretanto, explicações consistentes sobre a forteassociação entre as quantidades ingeridas e a prevalênciade HA quando se consideram diferentes sociedades e afraca associação em estudos realizados em uma mesmasociedade 18. A interação entre a sobrecarga salina e apredisposição familiar para HA é uma explicação plausível,pois restringiria a associação aos descendentes dehipertensos.Em vários estudos experimentais em humanos l9-21,estudamos o papel da dieta com diferentes  níveis deingestão salina sobre o comportamento da PA devoluntários jovens, predispostos ou não, familiarmente,para HA. A principal conclusão daqueles estudos 2l foi deque os predispostos apresentam  uma elevação transitóriada PA  quando submetidos à sobrecarga de cloreto de sódio.Esta observação encadeia-se com a demonstração de querepetitivos aumentos funcionais da resistência vascularperiférica, determinados por expansão de volume eaumento de débito cardíaco, podem propiciar hipertrofiaarteriolar e aumento sustentado da PA 22 .No estudo de prevalência anterior referido, investigou-se se o mesmo fenômeno poderia ser detectado em jovensvivendo fora de condições experimentais. Em 1/3 dosentrevistados coletou-se a urina de 12h da noite, deter-minando-se a excreção total de sódio. Caracterizou-se apredisposição familiar em forte, quando dois familiares de1º grau eram hipertensos, e não-forte, a todas as demaiscondições. A correlação quase instantânea entre a PAaferida de dia e o sódio excretado à noite, mostrou-sesignificativa somente entre os predispostos familiarmente.Além disso, demonstrou-se uma interação entre apredisposição familiar e a quantidade de sódio excretada:quando a primeira era forte e as quantidades excretadasaltas (representativas de  uma alta ingestão no dia anterior),a PA era mais alta do que a dos indivíduos em todas asoutras condições (predisposição forte com excreção baixae predisposição não-forte com excreção alta ou baixa). Estesresultados mostram que as condições de laboratório operamno cotidiano, fotografando um momento do processo deinstalação da HAS.Abuso do álcool. Investigações específicasA associação entre o abuso de bebidas alcoólicas e aprevalência de HA está bem estabelecida 23 e foi tambémobservada no estudo de prevalência anteriormente descrito.Os mecanismos pelos quais o álcool, um vasodilatador,aumenta a PA, não estão esclarecidos. Em um experimentocom voluntários jovens normotensos, aprovado nasinstâncias éticas pertinentes, avaliou-se o efeito agudo daingestão de  15, 30 e 60g de  etanol, e de  uma soluçãocontrole, sobre a PA registrada por 24h através de moni-torização ambulatorial (MAPA). Um discreto efeito hipo-tensor e taquicardizante foi observado, em proporção àdose, nas horas que se sucederam à ingestão. Na madru-gada, entretanto, houve nítido amortecimento do decrésci-mo fisiológico da PA, especialmente no grupo que ingeriu60g. Este pós-efeito, originalmente observado e presente-mente submetido à publicação, fornece uma explicação paraa HA induzida por álcool: os abusadores crônicos estariamsubmetidos a um repetitivo processo de aumento da PA porvasoconstrição nos períodos de depuração  do álcool,propiciando o desenvolvimento de alterações vascularescrônicas e aumento autônomo da PA.Referências 1. The Pooling Project Research Group - Relationship of blood  pressure, serum cho-lesterol, smoking habit, relative weight and ECG abnormalities to incidence ofmajor coronary events: final report of the Pooling Project.   J Chron Dis 1978;31: 201-306. 2. MacMahon S, Peto R, Cutler J et al - Blood pressure, stroke, and coronary heartdisease. Part 1. Prolonged differences in blood pressure: perspective observationalstudies corrected  for the  regression dilution bias. Lancet l990; 335: 765-74. 3. Kannel WB - Some lessons in cardiovascular epidemiology   fromFramingham.Am J Cardiol l976; 37: 269-81. 4. 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Hipertensão arterial sistêmica : epidemiologia e fatores de risco

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