de Carvalho, Priscila Lima

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  113 LEITURAS E RECEPÇÕES SOBRE AS IDENTIDADES SEXUAIS E DE GÊNERO NO ESPAÇO ESCOLAR DA COMUNIDADE DE POJUCA­BA Priscila Lima de Carvalho1  INTRODUÇÃO A pesquisa aqui exposta é  fruto do projeto de pesquisa de  Iniciação Científica e Trabalho de Conclusão  de  Curso  –  TCC,  que  teve  enfoque  nas  histórias  de  vida  e  formação  de  professores aposentados  ou  vasta  experiência  docente  da  cidade  de  Pojuca/BA.  Por  meio  das  narrativas autorreferenciais  dos  professores,  refletimos  os  processos  formativos  e  autoformativos,  as experiências formadoras, os modos de vida e a cultura de educação do contexto rural e da referida cidade.  No  processo  de  desenvolvimento  do  corpus  da  pesquisa,  deparei­me  com  histórias  de professores  que  revelaram  sua  orientação  sexual  homossexual,  desse modo,  fiz  um  recorte  do projeto  de  Iniciação  Científica  e  voltei  o  foco  da  pesquisa  para  sujeitos  homossexuais,  assim, elaborando  um  projeto  de  pesquisa  com  vista  a  problematizar  acerca  da  prática  de  leitura homoerótica,  identidades  sexuais  e  de  gênero  no  contexto  escolar  a  partir  da  análise  crítica  do discurso de professores homossexuais, para o curso do Mestrado. A  prática  de  leitura,  certamente,  constitui  um  exercício  primordial  para  poder  refletir  as diferenças, de modo que dois problemas que pretendo analisar serão condicionantes para posicionar o outro. O primeiro visa à análise literária e que partirá dos depoimentos de professores sobre como a narrativa de  ficção aborda o amor homoerótico. Para  isso,  serão  sugeridos  textos  literários para que  possam  ler  e  apresentar  a  recepção  da  obra,  impressões  e  críticas,  além  de  compreensões propícias ao tema. Segundo, serão dadas questões que apontem para as identidades de gênero e de sexualidades com a perspectiva de inserir análises que configuram sentidos ao homoerotismo.  A  leitura  dos  textos  ficcionais  é  uma  fonte  cultural  significativa  perante  as  reflexões  ativas direcionadas à diversidades de pessoas, quero dizer, partindo para o objeto da pesquisa, como os professores e alunos recepcionam textos que expressam a diversidade sexual e como lidam com esta temática?  Que  posturas  específicas  permitem,  quando  trazem,  em  mente,  diálogos  com personagens, espaços narrativos, enredos e  tramas sobre os quais são produzidos pela  literatura e pela cultura.                                                            1   Mestranda em Crítica Cultural ­ UNEB/Campus II. E­mail: prissycarvalho@gmail.com.   114 O objetivo é não somente apontar os registros de semelhanças e dessemelhanças dos sujeitos da pesquisa – docentes e discentes do ensino  fundamental da comunidade de Pojuca – BA – como perceber o grau de interpretação dado no espaço da literatura e o de percebê­lo em situações cujo poder de enunciação pode mover debates para a sala de aula, refletir a noção de identidades sexual e de gênero com o texto literário, se questionar e questionar possíveis entradas do leitor aluno para compreensões de uma realidade existente.  O fundamento da análise crítica do discurso é base de fundamento teórico para empreender como os contextos sociais estão sendo demarcados no sistema, envolvendo as faces de sexualidades e as relações de gêneros.  Portanto, a pesquisa procura entender os discursos de professores como foco de enunciação para  saber  como  falam, de onde  falam  e  se  revelam,  expõem  a  si mesmos e,  através dos  textos literários,  situam  uma  cultura  que,  também,  podem  estar  inseridos  em memórias,  experiências, resquícios de histórias nos estilos diversos de vida que, aqui, se tornam objeto de leitura.   PRÁTICAS DISCURSIVAS: MODOS DE VIDA, MODOS DE FALA, MODOS DE SER A  abordagem  teórico­metodológica  da  Análise  de  Discurso  Crítica  (ADC)  é  utilizada  nesta pesquisa,  onde  se  busca nas  vozes  dos  professores  homossexuais  identificar os  saberes  de  si,  da docência, do  seu  lugar no mundo, de  sua visão e posição  sobre  identidades  sexuais  e de gêneros através de textos literários homoeróticos. As práticas de discursos desses professores homossexuais que vivem no interior, alguns oriundos da zona rural e que atuam em sala de aula, precisando lidar com uma cultura heteronormativa e diversas formas de preconceito, sem dúvida carrega uma série de  sentidos  e  o  contato  com  a  literatura  homoerótica  irá  inculcar  nesses  sujeitos  práticas  de discursos repletas de significados de si e de sua cultura.  Se opondo a abordagem formalista, a análise do discurso se aplica ao conceito funcionalista, que utiliza estruturas linguísticas como modo de ação sobre o mundo e sobre as pessoas. Fairclough (2001), Foucault  (1997, 2003) e Bakhtin  (1997, 2002)  foram precursores na abordagem  teórica da ADC com seus escritos acerca de discurso e poder.  Bakhtin  (1997,  2002)  foi  fundador  da  teoria  semiótica  de  ideologia  sobre  a  linguagem, sustentando que a essência da  língua repousa no processo social da  interação verbal. Foi precursor da crítica ao  formalismo de Saussure  (1981) que  limitava a substância da  língua a  interioridade do sistema  linguístico.  Influenciado  pelo Materialismo  Histórico,  a  filosofia  de  Bakhtin  (1997,  2002)   115 acredita que  a  enunciação  é  a  realidade da  linguagem que preza  a  relação  indissolúvel  com  seus usuários.  Nesse sentido, a prática da leitura de textos homoeróticos é um exercício que propicia refletir sobre as diferenças de gênero e  identidades sexuais e  inculcar uma postura crítica das  impressões das  obras  literárias,  com  o  intuito  de  promover  proposições  a  respeito  de  como  os  professores homossexuais  e  do  interior  da  Bahia  se  reconhecem,  se  identificam  com  o  tema,  personagens, enredo da obra de  ficção, como poderiam adaptar e aplicar em sala de aula, como recepcionam e contribuem para a autoformação e aceitação do amor entre os iguais.  Levando  e  consideração  que  a  literatura  vem  sendo  objeto  de  estudo  de  diversos pesquisadores, como em nosso Mestrado em Crítica Cultural, onde é notado o intuito em  instaurar uma literatura menor que não é a de uma língua menor, mas antes a que uma minoria faz em língua maior, assim parafraseando Gilles Deleuze e Félix Guattari  (1977). O que está em  jogo é o  fato de essa literatura ser esvaziada de seu sentido estruturalista, hegemônico, que está presente de modo explícito  ou  implícito  e  assumir  uma  posição  pós­estruturalista  e  crítica  cultural  para  intervir  no mundo real, em favor das minorias. Uma  das  propostas  dessa  investigação,  se  configura  na  seleção  de  textos  literários homoeróticos,  esvaziando­se  do método  estrutural  de  leitura  e  interpretação,  todavia,  refletindo acerca  da  interpretação  desses  professores  em  relação  aos  textos  e  em  relação  à  posição  social diante de temas referentes ao estudo de gênero e identidades sexuais, a partir da análise crítica do discurso. O  estudo  do  texto  literário  homoerótico  na  comunidade,  tendo  em  vista  aspectos  que movem uma cultura, que critica os estilos de vida, de como estes são enunciados em obras literárias e como professores recepcionam, falam, como falam a respeito e podem aplicar em sala de aula para leitura e compreensão. A  Análise  de  Discurso  Crítica  sustentada  por  Bakhtin  (2002),  desvencilha­se  da  proposta saussuriana que separa a língua de seu conteúdo ideológico, todavia, o fundador da teoria apresenta o  meio  social  como  o  centro  organizador  da  atividade  linguística,  desfazendo,  desse  modo,  o equívoco saussuriano. É pela Filosofia marxista da linguagem que a ADC é influenciada e contempla os  princípios  ideais  para  analisar  criticamente  os  enunciados  dos  sujeitos  da  pesquisa,  que  são usados como modo de ação sobre o mundo e sobre as pessoas. Em Foucault  (2003), observamos que apesar de estarmos condenados a ordem do discurso, nos alerta a entender que temos de criar linhas de fuga, estratégias para driblar essa ordem. Desse modo, o autor menciona as interdições que se cruzam formando uma grade complexa, e reitera que   116 onde a grade é mais cerrada são nas regiões da sexualidade e as da política. Logo, evidenciamos a necessidade de buscar essas vozes de professores gays, do  interior de Pojuca/Ba, alguns de origem rural,  que  são  cerradas  e  subalternizadas.  Assim,  entendemos  o  discurso  como  controlado, selecionado e organizado. O autor ainda  reitera que, o discurso é dominado principalmente pelas instituições, onde se  inscreve aí, especificamente à minha  investigação: a escola, e ainda, os  livros didáticos, o currículo.  É cediço que no atual período da modernidade tardia, a linguagem ocupa o centro do modo de produção do capitalismo, pois, Harvey (1992) explica que, com a crise do capitalismo 1973­75 foi­se exigido  uma  nova  reestruturação  do  capitalismo,  desse  modo,  substituindo  bens  materiais  e duráveis,  pela  produção  de  serviços  baseada  em  informação  e  conhecimento  que  implica  uma economia baseada no discurso: o  conhecimento é produzido,  circula e é consumido em  forma de discurso.  Assim,  as  construções  reflexivas  de  suas  autoidentidades  a  partir  dos  depoimentos  dos professores e das  impressões e críticas a respeito da  literatura homoerótica  lida, do mesmo modo que, a identidade social construída por meio dos discursos, comprova que a ADC é um forte aliado da ciência  para  a  investigação  da  vida  social  que  visa  contribuir  para  a  superação  de  relações  de dominação. A  ideia  conceitual  de  Rizoma  de  Gilles  Deleuze  e  Félix  Guattari  (1995),  é  uma  arma metodológica que rompe e abala as estruturas e muni o crítico cultural contra os modelos prontos e formas de dominação. O conceito Rizoma poderia se resumir a tudo que é contra ao estruturalismo, “o rizoma é uma antigenealogia”.  A ADC ao se aplicar a relação interna e dialética entre discurso e sociedade, sob uma vertente funcionalista, se distanciando assim, da dicotomia saussuriana língua versus fala, tem como aliado o método rizomático, visto que é avesso à dicotomia, impedindo que caiamos na armadilha do uno, do começo  e  fim,  porém,  se  trata  de  um  mapa  aberto,  conectável  em  todas  as  suas  dimensões, desmontável, reversível, suscetível de receber modificações constantes. Por  fim,  acredito que  a prática de  leitura de  textos  literários  com  tema homoerótico é um passo  importante  para  que  possamos  conhecer  uma  cultura,  impressões  e  refletir  criticamente acerca dos discursos que serão expressos pelos sujeitos da pesquisa. Se  trata de dar visibilidade a uma minoria que sofre com uma cultura heteronormativa e cala­se perante as ordens das leis.     117 REFERÊNCIAS AGAMBEN, Giorgio. O que é o contemporâneo? e outros ensaios. Trad. Vinicius N. Honesko. Chapecó: Argos, 2009. BAKHTIN, M. Estética da criação verbal. São Paulo: Martins Fontes, 1997. BAKHTIN, M. Marxismo e filosofia da linguagem. São Paulo: Hucitec, 2002. BUTLER, Judith. Problemas de gênero: feminismo e subversão da identidade. Trad. Renato Aguiar. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2008. DELEUZE, Gilles & GUATTARI. Introdução: Rizoma. In: Mil platôs: capitalismo e esquizofrenia. Trad. Ana Lúcia Oliveira. Rio de Janeiro: Editora 34, 1995. p. 7­37. DELEUZE, Gilles. Em que se pode reconhecer o estruturalismo? In: O Século XX. Rio de Janeiro: Zahar Editores, (s/d). DELEUZE, Gilles; GUATTARI, Felix. O que é uma literatura menor? In: Kafka: por uma literatura menor. Trad. Júlio Casñon Guimarães. Rio de Janeiro: Imago, 1977. p. 25­42. FAIRCLOUGH, Norman. Discurso e mudança social. Brasília: Editora UnB, 2001a. FOUCAULT, Michel. Vigiar e punir: história da violência nas prisões. Petrópolis: Vozes, 1997. FOUCAULT, Michel. A Ordem do Discurso. São Paulo: Loyola, 2003.HARVEY, D. Condição pós­moderna: uma pesquisa sobre as origens da mudança cultural. São Paulo: Loyola, 1992. SARTRE, Jean­Paul. Marxismo e existencialismo. In: Crítica da razão dialética: precedido por Questões de método. Trad. Guilherme João de Freitas Teixeira. Rio de Janeiro: DP&A, 2002. SAUSSURE, F. Curso de Linguística Geral. São Paulo: Cultrix, 1981.   

Leituras e recepções sobre as identidades sexuais e de gênero no espaço escolar da comunidade de Pojuca - Ba

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