Em busca de dragões: Mariza Peirano e a arte de ensinar antropologia

Abstract

Cheguei à hora combinada. Não precisei bater, pois a porta da sala estava, como sempre, aberta. As palavras exatas, assim como a data do encontro, perderam-se na memória. Não há, porém, como esquecer o ano, 1989, nem o diálogo curto — a concisão é uma virtude cultivada nos gestos, na escrita e na fala de minha interlocutora. Para mim, aquele foi um bom encontro, um encontro decisivo que mudaria o rumo da minha os daqueles anos de redemocratização: eu queria entender os fundamentos teóricos e os condicionantes sociais da vertente autoritária do pensamento social brasileiro do início do século XX, e assim investigar supostas articulações com a história recente do país recém-saído do regime militar. O pensamento autoritário parece formar uma espécie de matriz de sentimentos, ideias, atitudes e práticas imemoriais que, infelizmente, reverberam renovados no solo social e moral do Brasil no alvorecer do novo milênio. Naquele encontro, porém, recebi um convite à etnografia e, com o apoio que o acompanhou, senti-me encorajada a desafiar a timidez escondida no gosto que então sustentava pelo estudo teórico: saí à busca dos dragões escondidos na experiência de campo.1 Aos iniciantes da antropologia, a lição é repetida: é preciso “examinar dragões” (Peirano, 1992b, 2006b), ou seja, buscar o “sentido de surpresa”2 invariavelmente trazido pela pesquisa (Peirano, 1995c:136)

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