Distúrbios naturais em córregos de cabeceira do bioma Cerrado : uma abordagem estrutural e funcional

Abstract

Tese (doutorado)—Universidade de Brasília, Instituto de Ciências Biológicas, Programa de Pós-Graduação em Ecologia, 2019.Escopo e objetivos Córregos de cabeceira fornecem importantes serviços ecossistêmicos para ambientes aquáticos a jusante, com intermédio da comunidade de macroinvertebrados bentônicos para decomposição e a disponibilização de matéria orgânica e nutrientes na coluna d’água, bem como, na transferência de energia aos níveis superiores da cadeia trófica. A comunidade de invertebrados é moldada pela reduzida disponibilidade de luz e pelo regime hidrológico sensível aos eventos de precipitação que caracterizam os córregos de cabeceira florestais. Para entender como a estrutura e as interações tróficas da comunidade de macroinvertebrados são influenciadas pelas características do habitat, conduzimos três estudos de caso em córregos de cabeceira florestais no Brasil Central. No primeiro estudo, o monitoramento realizado em quatro córregos na escala de microhabitats permitiu identificar atributos funcionais (traits) da comunidade de macroinvetebrados que foram sensíveis e tolerantes às mudanças sazonais no regime hidrológico (estação chuvosa e seca). No segundo estudo de caso, verificamos o efeito da sazonalidade na transferência de energia dos recursos basais (biofilme, seston e serapilheira) para os invertebrados, utilizando a metodologia com isótopos estáveis de carbono (C) e nitrogênio (N). O monitoramento em campo foi realizado no mesmo arranjo utilizado para o primeiro estudo, permitindo a comparação dos nichos isotópicos dos macroinvertebrados entre as estações chuvosa e seca. No terceiro estudo, avaliamos como os fatores top-down (pastejo) e bottom-up (luz e nutriente) atuam no desenvolvimento do biofilme e se a atividade fotossintética determina o fracionamento isotópico do carbono no biofilme. Para tanto, a densidade de macroinvertebrados pastejadores foi controlada com pulsos elétricos em quatro córregos, dois oligotróficos e dois enriquecidos em nutrientes. Estruturas eletrificadas (exclusão de roçadores) e não eletrificadas (com raspadores) foram implementadas em áreas abertas e sombreadas em cada córrego. Assim como os invertebrados coletados nas estruturas não eletrificadas, o biofilme extraído em ambas as estruturas (eletrificadas e não eletrificadas) foi submetido à análise do isótopo estável carbono. Matéria seca livre de cinzas (AFDM) e concentração de clorofila-a do biofilme também foram analisadas. A presente tese foi desenvolvida sob a autorização do Sistema de Autorização e Informação em Biodiversidade (SISBIO) nº 56144 e do Sistema Nacional de Gestão do Patrimônio Genético e do Conhecimento Tradicional Associado (SISGEN) nº de cadastro A018ECD. Conclusões Sazonalidade e gradiente de luz são forças seletivas para a comunidade de macroinvertebrados bentônicos nos córregos de cabeceira florestais. A alteração hidrológica sazonal demonstrou a dependência dos macroinvertebrados quanto à conformação dos microhabitats, favorecendo traits tolerantes ao estresse hidráulico na estação chuvosa. A redução na disponibilidade de alimentos na estação chuvosa refletiu em redução na diversidade de recursos alimentares assimilados pelos macroinvertebrados, além do aumento na redundância funcional da comunidade. Na estação seca, traits sensíveis apresentaram condições adequadas de desenvolvimento, preditas principalmente pelo acúmulo de serapilheira. Com isso, o estresse hidráulico mostrou-se importante para o entendimento da composição da comunidade de invertebrados, principalmente em função da dependência da serapilheira para fornecimento de alimento, habitat e refúgio. Com relação ao gradiente de luz, invertebrados pastejadores foram indiretamente favorecidos pelas condições ambientais que resultaram em aumento da produtividade primária e mudanças no fracionamento isotópico do carbono no biofilme. É importante destacar que esses córregos são naturalmente sombreados e oligotróficos e as mudanças na cobertura florestal ripária podem promover fluxos de energia a partir de recursos autóctones, afetando as características e o funcionamento da teia alimentar e a capacidade desses em fornecer serviços ecossistêmicos associados à manutenção da qualidade da água.Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq); Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES); Fundação Rufford e Fundação de Amparo à Pesquisa do Distrito Federal (FAP-DF).Background and goals Headwater streams provide important ecosystem services for downstream aquatic environments, mediated by the benthic macroinvertebrates community that favors the decomposition and availability of organic matter and nutrients in the water column. The structure and functioning of the invertebrate community are shaped by the reduced availability of light and by the hydrological regime sensitive to precipitation events that characterize the forest headwater streams. To understand how the structure and trophic interactions of the macroinvertebrate community are influenced by habitat features, we conducted three studies case in forest headwater streams in Central Brazil. In the first study, the monitoring of four microhabitat streams allowed the identification of functional traits of benthic macroinvetebrates that were sensitive and tolerant to seasonal changes in the hydrological regime (rainy and dry seasons). In the second case study, we verified the effect of seasonality on the transfer of energy from the basal resources (biofilm, seston and litter) to invertebrates, through the methodology using stable isotopes of carbon (C) and nitrogen (N). Field monitoring was performed in the same arrangement used for the first study, allowing the comparison of the isotopic niches of the macroinvertebrates between the rainy and dry seasons. In the third study, we evaluated how the top-down (grazing) and bottom-up factors (light and nutrient) act in the development of the biofilm and whether the photosynthetic activity of the biofilm determines the isotopic fractionation of carbon. For that, the density of grazers macroinvertebrates was controlled with electric pulses in four streams, two oligotrophic and two enriched in nutrients. Electrified structures (scraper exclusion) and non-electrified structures (with scrapers) were implemented in open and shaded areas in each stream. Like the invertebrates collected in the non-electrified structures, the biofilm extracted in both structures (electrified and non-electrified) was subjected to stable isotope carbon analysis. Ash-free dry matter (AFDM) and chlorophyll-a concentration of the biofilm were also analyzed. Conclusions Seasonality and light gradient are selective forces for the community of benthic macroinvertebrates in forest headwater streams. The seasonal hydrological alteration demonstrated the dependence of the macroinvertebrates on the conformation of the microhabitats, favoring traits tolerant to the hydraulic stress in the rainy season. The reduction in food availability in the rainy season reflected a reduction in the diversity of food resources assimilated by the macroinvertebrates, in addition to the increase in the functional redundancy of the community. In the dry season, sensitive traits presented adequate conditions of development, predicted mainly by the accumulation of litter. Thus, hydraulic stress was important for the understanding of the composition of the invertebrate community, mainly due to the dependence of the litter for food supply, habitat and refuge. Regarding the light gradient, grazer invertebrates were indirectly favored by environmental conditions that resulted in increased primary productivity and changes in carbon isotopic fractionation in the biofilm. It is important to note that these streams are naturally shaded and oligotrophic and changes in riparian forest cover can promote energy flows from autochthonous resources, affecting the characteristics and functioning of the food web and their ability to provide ecosystem services associated with maintenance of the water quality

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