Bracagioli Neto, Alberto

Fedrizzi, Tiago Zilles

Vieira, Carmem Lucas

Portuguese

Lume 5.8

  Cadernos de Agroecologia – ISSN 2236-7934 - Anais do XI Congresso Brasileiro de Agroecologia, São Cristóvão, Sergipe - v. 15, no 2, 2020. Engenharia Natural e Sistemas Agroflorestais: ferramentas efetivas no controle de erosão hídrica no Arroio Dilúvio em Porto Alegre (RS) Natural Engineering and Agroforestry Systems: effective tools to control water erosion in Dilúvio stream in Porto Alegre (RS)  FEDRIZZI, Tiago Zilles1; VIEIRA, Carmem Lucas2, BRACAGIOLI NETO, Alberto³. ¹Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Rural (PGDR/UFRGS), tiagozfedrizzi@gmail.com;  2Orgânica's - MEI, clucasvieira@gmail.com; Departamento de Silvicultura e Horticultura, Faculdade de Agronomia (UFRGS), abracagioli@gmail.com   Eixo temático: Manejo de Agroecossistemas de Base Ecológica  Resumo: Os Sistemas Agroflorestais, SAFs, são modelos mistos de produção, no qual são conjugadas demandas de valoração de produtos cultivados para alimentação, fornecimento de matérias primas, energia, provimento de serviços ecossistêmicos e preservação ambiental. Estes modelos de produção estão sendo empregados, de modo crescente, para a recuperação de áreas degradadas, especialmente para a recuperação de solos em áreas rurais e periurbanas. Ao lado de um SAF implantado e consolidado há mais de uma década no Campus da Faculdade de Agronomia/UFRGS na cidade de Porto Alegre/RS, foi diagnosticado um processo de erosão no talude fluvial limítrofe, o qual ameaçava avançar para interior da área do SAF, reduzindo a área e comprometendo a estabilidade geotécnica. De forma integrada ao SAF foram concebidas técnicas de Engenharia Natural incorporando espécies nativas tanto para a composição das bioestruturas, como para a recomposição da Área de Preservação Permanente degradada. O projeto foi considerado uma proposta pioneira e inovadora para o município. Palavras-chave: Talude fluvial; Estabilização; Bioestruturas; Meio urbano.   Introdução  As ocupações antrópicas desenfreadas e não planejadas, sejam estas em centros urbanos ou mesmo em cidades e vilarejos do espaço rural, podem acarretar em uma pressão de impacto sobre determinados ecossistemas causando assim desequilíbrios ambientais e problemas sociais. Com a supressão da mata ciliar, a estrutura edáfica que atuava como um “escudo” composto por raízes, solo, microbiota e matéria orgânica, acaba sendo fragilizada e ficando suscetível a processos erosivos.  O seguinte artigo visa apresentar o resumo do Projeto de Recuperação de Áreas Degradadas (PRAD) a ser executado às margens do Arroio Dilúvio em Porto Alegre, num trecho localizado dentro da Faculdade de Agronomia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, com o objetivo de estudar a capacidade de recuperação da área que passa por forte processo de erosão utilizando técnicas da engenharia natural, recuperação de mata ciliar e implantação de sistema agroflorestal.   Contextualização e metodologia    Cadernos de Agroecologia – ISSN 2236-7934 - Anais do XI Congresso Brasileiro de Agroecologia, São Cristóvão, Sergipe - v. 15, no 2, 2020. O Arroio Dilúvio tem suas nascentes localizadas em Viamão (RS), município o qual faz divisa com Porto Alegre. Ambos os municípios apresentam bacias hidrográficas de efetiva relevância no que diz respeito à contribuição direta e composição do sistema de drenagem que alimenta o lago Guaíba, local onde se realiza a captação da água pública, sendo a bacia hidrográfica do Arroio Dilúvio uma das mais importantes. De acordo com dados apresentados pelo “Programa de Revitalização do Arroio Dilúvio: um futuro possível”, firmado entre UFRGS e PUC em 2011, ações de degradação e poluição ocorrem ao longo de todo o percurso desde as nascentes, com o despejo de aproximadamente 50 mil metros cúbicos de solo e resíduos sólidos realizados diretamente no corpo hídrico por ano.  Quanto ao local de execução do projeto, foi realizada uma proposição para uma área dentro da Faculdade de Agronomia da UFRGS, à beira do Arroio Dilúvio onde a área prevista para intervenções técnicas perfazem doze metros de extensão por três metros de altura, totalizando aproximadamente 36 m². A área sofre com seguidos desmoronamentos do talude por não possuir mata ciliar, ocasionando o transporte de sedimentos, o que acaba por gerar frequentes manutenções e custos tanto econômicos quanto ambientais pela retirada do material ao longo de seu curso pelos órgãos municipais responsáveis (Figura 1).  Neste sentido, de acordo com Durlo & Sutili (2005), a Engenharia Natural, também chamada de Engenharia biológica ou Bioengenharia de Solos, tem como premissa básica o conhecimento das exigências e características biológicas da vegetação, especialmente no tocante à sua capacidade para a solução de problemas técnicos de estabilização de margens e encostas.  O uso de material vegetal vivo ou inerte pode ser combinado com a construção de obras de grande simplicidade, caracterizando estas técnicas mistas. Para o preenchimento da cratera e nivelamento com as margens adjacentes são adotadas técnicas de revestimento integral das margens denominada Parede Krainer. Esta obra consiste numa parede vegetada de madeira, com estrutura simples ou dupla, construída com a sobreposição ordenada de materiais vegetais inertes, assentados sobre uma base de fragmentos de rocha e composto orgânico ou aterro, cujas dimensões devem ser definidas de acordo com as características do terreno e do fluxo de água, para que não sejam arrastados em períodos de inundações e enchentes. Entre as camadas de toras serão dispostos materiais de propagação vegetativa coletados de espécies específicas, com potencial biotécnico para este tipo de problemática. Para a área em questão será construída uma parede dupla, visando ao melhor reforço e consolidação do talude.  De acordo com Sousa e Sutili (2013) as plantas desempenham um papel fundamental para o sucesso destas intervenções técnicas. Segundo os autores, a utilização de material vegetal autóctone presente no local de intervenção permite atender ao critério de restaurar os elementos naturais e o ecossistema envolvido. Para o projeto em questão foram selecionadas espécies vegetais nativas encontradas no local como o fumo-bravo (Solanum mauritianum Scop.) e a lantana (Lantana camara), assim como a caliandra-vermelha ou sarandi (Calliandra brevipes Benth.),  sarandi-branco (Phyllanthus sellowianus) e a aroeira-pimenta (Schinus terebinthifolius). Estas   Cadernos de Agroecologia – ISSN 2236-7934 - Anais do XI Congresso Brasileiro de Agroecologia, São Cristóvão, Sergipe - v. 15, no 2, 2020. espécies já apresentam uso consagrado para obras de Engenharia Natural no estado do Rio Grande do Sul (DURLO e SUTILI, 2005; KETTENHUBER et al., 2013). Como recomendação técnica fundamental foi orientado que o plantio das mudas ocorresse no final do inverno e/ou início da primavera, período no qual as médias pluviométricas são mais elevadas e, portanto, proporcionam melhor estabelecimento das plantas pelo reduzido estresse hídrico. Além disto, as temperaturas mais amenas neste período reduzem as taxas de evapotranspiração, não necessitando a instalação de um sistema de irrigação para as mudas e estacas de propagação vegetativa.     Figura 1. A) Detalhe do processo erosivo no talude fluvial; B) Croqui esquemático com detalhes do local; C) Exemplo de um talude recém-tratado com a parede Krainer; D) Aspecto desejado ao final de um ano após a execução (Elaboração: Vieira, C.L. 2015).   Com a estabilização do talude pelas técnicas implementadas, a sucessão vegetal pode ser pensada através de sistemas de cultivo que visem à recuperação biológica, como os sistemas agroflorestais (SAF’s). Os SAF’s são formas de uso e manejo dos recursos naturais nos quais espécies lenhosas utilizadas em associação deliberada com cultivos agrícolas ou com animais no mesmo terreno, de maneira simultânea ou em sequência temporal” (CATIE/OTS, 1986). Assim sendo, tais sistemas possuem características flexíveis a serem adaptados aos mais diversos contextos e situações, bem como no que diz respeitos aos objetivos: produção de alimentos, sombra para os animais, recuperação de áreas degradadas, estabilizar taludes e margens de córregos, lagos e áreas ambientalmente frágeis.  Resultados e discussão    Cadernos de Agroecologia – ISSN 2236-7934 - Anais do XI Congresso Brasileiro de Agroecologia, São Cristóvão, Sergipe - v. 15, no 2, 2020. A proposta de estabilização do talude fluvial baseada em técnicas de Engenharia Natural e no emprego de espécies vegetais nativas encontradas localmente e cultivadas no SAF para a composição de obras e recomposição da APP foi encaminhado à Fundação Estadual de Proteção Ambiental (FEPAM) como Plano de Recuperação de Área Degradada (PRAD). Este modelo de intervenção técnica em um curso de água urbano foi muito bem avaliado pelo órgão ambiental, sendo aprovado e considerado uma referência pioneira e inovadora para a recuperação de outras áreas degradadas no município de Porto Alegre, especialmente aquelas localizadas às margens de corpos hídricos (Licença de Autorização Geral nº 00160/2017 - DL).   Um dos pontos de maior impacto positivo na avaliação dos licenciadores foi o fato de que, após a realização das intervenções técnicas, seria possível considerar a estabilização do processo de erosão hídrica no talude fluvial, a vegetação plenamente desenvolvida na APP e o aspecto paisagístico recomposto. Além disto, a área do SAF ganharia estabilidade geotécnica, sendo possível restaurar a fertilidade, elevar o teor de matéria orgânica na camada superficial do solo, assim como promover um resgate das funções ecológicas básicas como o provimento de espécies lenhosas e semi-lenhosas de floração abundante para os agentes polinizadores. Junqueira et al. (2013) destacam para o fato de os Sistemas Agroflorestais apresentarem como ponto forte o potencial em explorar a capacidade das árvores para fornecerem proteção ao solo contra a ação erosiva da água da chuva incidindo diretamente sobre a superfície, assim como promover o fornecimento de matéria orgânica na forma de serrapilheira. Corroborando com o autor supracitado, Alves (2009) ressalta que deve haver a correta escolha das espécies arbóreas e dos demais componentes do sistema para a recuperação de solos degradados, nos quais os sistemas agroflorestais podem ser aplicados em diferentes modelos e formas sobre as áreas consideradas. Verifica-se a sinergia em unir técnicas de Engenharia Natural com os SAFs, pois ambas têm no componente vegetal o seu ponto central de concepção dos modelos e desenhos técnicos para o controle dos processos erosivos, estabelecimento de cobertura vegetal e o resgate de funções ecossistêmicas básicas no ambiente degradado.     A proposta apresenta o mérito de poder ser replicada para outros trechos do Arroio Dilúvio e de outros cursos de água urbanos que apresentem problemas de degradação das margens e erosão por solapamento do talude fluvial, servindo como projeto piloto referencial em escala de microbacias. É possível também a sistematização da área com espécies de interesse econômico para que possam, inclusive, ser manejadas por agricultores familiares em áreas de preservação. Os custos previstos considerando material construtivo (troncos, arames, areia), material de consumo (óleo, combustível) e material de propagação vegetal (mudas, estacas) e de Serviço (mão de obra, retroescavadeira) são estimados em R$ 5.500. Onde pelo fato de itens como mão de obra e retroescavadeira que seriam os itens passíveis de maior custo, serem fornecidos pela Superintendência de Estrutura (Suinfra) da Universidade onde se desenvolve o estudo. Estima-se que dentre mudas e estacas de potencial de propagação, sejam necessárias um total de 435 sendo 15 destas mudas de Caleandra; 20 mudas de arbóreas nativas; 100 mudas de gramínea não   Cadernos de Agroecologia – ISSN 2236-7934 - Anais do XI Congresso Brasileiro de Agroecologia, São Cristóvão, Sergipe - v. 15, no 2, 2020. invasora - Paspalum millegrana ou Chrisopogon zizanioide; 300 Estacas e feixes vivos. A proposta, de custo inferior, se comparado às técnicas tradicionais de Engenharia Civil, possui execução relativamente fácil, se configurou de suma relevância no que diz respeito à importância na busca de sistemas que se mostrem produtivamente eficazes e ambientalmente adaptados aos ambientes urbanos impactados pela ação humana.  Conclusões  A proposta técnica de integrar a recuperação de área de APP degradada com a estabilização biotécnica de talude fluvial incorporando espécies nativas se apresenta como uma ferramenta eficiente, utilizando e mobilizando recursos locais e de baixo custo. O projeto piloto foi bem avaliado pelo órgão ambiental, preenchendo uma lacuna em termos de corpos hídricos urbanos degradados na cidade de Porto Alegre, podendo ser replicado em outros contextos. A proposta de unir SAFs para a revegetação de planícies de inundação degradadas em grandes capitais, sendo fonte de material vegetal nativo necessário à composição de bioestruturas, se mostrou capaz de sanar uma inadequação ambiental pública. Como proposta inovadora e pioneira, no entanto, verifica-se a necessidade de um aprofundamento do corpo técnico dos órgãos ambientais municipais e estaduais, de modo que sejam incorporadas como propostas para a recuperação de áreas degradadas.   Referências Bibliográficas  ALVES, L.M. Sistemas Agroflorestais (SAF's) na restauração de ambientes degradados. Trabalho de Conclusão da Disciplina Estágio em Docência. Universidade Federal de Juiz de Fora - Programa de Pós-Graduação em Ecologia Aplicada ao manejo e Conservação de Recursos Naturais. 2009. 18 p.  DURLO, M.A.; SUTILI, F.J. Bioengenharia: Manejo Biotécnico de Cursos de Água. Porto Alegre: EST Edições, 2005. 189 p.: il.  JUNQUEIRA, A.C.; SCHLINDWEIN, M.N.; CANUTO, J.C.; NOBRE, H.G.; SOUZA, T. M. Sistemas agroflorestais e mudanças na qualidade do solo em assentamento de reforma agrária. Rev. Bras. de Agroecologia. (8): 102-115 (2013).  KETTENHUBER, PL.; SOUSA, R.S.; DENARDI, L.; SUTILI, F.J. Plantas lenhosas com potencial Biotécnico para uso em obras de Engenharia Natural no Brasil. Rev. Ciência & Ambiente. Universidade Federal de Santa Maria - UFSM. v. 1, n.1 (jul. 1990). Santa Maria: Semestral. n. 46/47 (jan./jun. e jul./dez. 2013). p. 95 - 110.  OTS/CATIE. Sistemas Agroforestales: principios y apllicaciones en los tropicos. San Jose: Organización para Estudios Tropicales/ CATIE, 1986. 818p    Cadernos de Agroecologia – ISSN 2236-7934 - Anais do XI Congresso Brasileiro de Agroecologia, São Cristóvão, Sergipe - v. 15, no 2, 2020. SOUSA, R.S.; SUTILI, F.J. Aspectos técnicos das plantas utilizadas em Engenharia Natural. In.: Rev. Ciência & Ambiente. Universidade Federal de Santa Maria - UFSM. v. 1, n.1 (jul. 1990). Santa Maria: Semestral. n. 46/47 (jan./jun. e jul./dez. 2013). p. 32 - 71. 

Natural engineering and agroforestry systems : effective tools to control water erosion in Dilúvio stream in Porto Alegre (RS)

https://lume.ufrgs.br/bitstream/10183/254733/1/001161318.pdf

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