O papel da neuroinflamação nas alterações comportamentais e neuroquímicas induzidas pelo estresse precoce

Abstract

Dissertação (mestrado) - Universidade Federal de Santa Catarina, Centro de Ciências Biológicas, Programa de Pós-Graduação em Bioquímica, Florianópolis, 2019.O estresse é uma resposta adaptativa que realiza mudanças fisiológicas necessárias diante de situações aversivas. No entanto, quando intenso ou prolongado, ou mesmo durante períodos críticos de desenvolvimento, o estresse pode provocar alterações neuroquímicas e comportamentais que afetam negativamente o desenvolvimento e funcionamento encefálico. Os processos neuroinflamatórios têm sido associados a mecanismos de vulnerabilidade e resiliência ao estresse. O inflamassoma NLRP3 é um complexo citosólico multiproteico ativado após diversas condições incluindo estresse e presença de patógenos, sendo responsável pela maturação e liberação da interleucina-1ß (IL-1ß) e pela ativação da resposta imune inata. Nesse sentido, o presente estudo teve como objetivo investigar o envolvimento de mecanismos neuroinflamatórios e mudanças comportamentais causadas pelo estresse precoce e seu impacto na vida adulta. O protocolo de estresse precoce consistiu na aplicação de um único episódio de estresse de restrição por 7h, seguido por uma única administração de lipopolissacarídeo (LPS 0,83mg/kg, i.p.) em camundongos fêmeas de 30 dias de idade. Foram realizados o teste do nado forçado (TNF), teste de suspensão pela cauda (TSC), teste de borrifagem de sacarose (TBS) e teste do campo aberto (TCA) para avaliar o comportamento tipo-depressivo, ansioso, anedônico, e a locomoção. As avaliações comportamentais foram realizadas 24h após o estresse precoce (período de desenvolvimento) e aos 60 dias (idade adulta). Além disso, o imunoconteúdo hipocampal dos receptores de glicocorticoides, de proteínas relacionadas ao fenótipo microglial e inflamação, Iba-1, NF-?B, e de componentes da via do inflamassoma e da via das quinureninas, foram verificados durante as duas etapas de vida dos animais. Nossos resultados demonstraram que a associação dos estressores foi capaz de induzir uma redução significativa no ganho de massa corporal dos 30 aos 45 dias de idade, que foi normalizado aos 60 dias de idade quando comparado ao grupo controle. Com relação as alterações comportamentais imediatas, o estresse precoce gerou um prejuízo locomotor a curto prazo, que não foi acompanhado de alterações no comportamento tipo-depressivo, ansioso ou anedônico. Do ponto de vista neuroquímico observamos um aumento imediato na densidade das proteínas do complexo inflamassoma NLRP3 e ASC no hipocampo, sem alteração nos níveis de pró-caspase-1, na razão caspase-1/pró-caspase-1 ou nos receptores de glicocorticoides. Contudo, o estresse precoce induziu um comportamento tipo-depressivo nos animais avaliados aos 60 dias de idade, sem alterar a locomoção, ansiedade e a comportamento hedônico. Os efeitos comportamentais tardios foram associados à normalização dos níveis de NLRP3 e ASC, e ao aumento da expressão de Iba-1 e receptores de glicocorticoides no hipocampo. Não foram encontradas alterações geradas pelo estresse precoce no imunoconteúdo da enzima indoleamina 2,3-dioxigenase-1 (IDO-1) ou do fator de transcrição nuclear NF-?B. Para tentar minimizar o impacto do estresse precoce utilizamos duas estratégias farmacológicas para inibir a via do inflamassoma NLRP3, aplicadas imediatamente após o estresse. O tratamento com Brilliant Blue G (BBG, 50 mg/kg, por sete dias) ou com glibenclamida (5 mg/kg, por 3 dias) não foram capazes de prevenir o comportamento tipo-depressivo nos animais de 60 dias. Em conclusão, o estresse precoce parece induzir uma ativação neuroimune associada à via do inflamassoma NLRP3, que pode estar associada a uma má-adaptação a longo prazo, culminando na expressão aumentada de receptores de glicocorticoides, ativação microglial, bem como comportamento tipo-depressivo. Contudo, outras estratégias farmacológicas de bloqueio da via do inflamassoma NLRP3 precisam ser testadas para estabelecer se esta via é o gatilho para as alterações tardias e se pode constituir um potencial alvo terapêutico.Abstract: Stress is an adaptive response responsible for physiological changes in the face of aversive situations. However, when intense or prolonged, or even during critical periods of development, stress can cause neurochemical and behavioral changes that negatively affect brain development and functioning. Neuroinflammatory processes have been associated with mechanisms of stress vulnerability and resilience. The inflammasome NLRP3 is a multiprotein cytosolic complex activated by damage-associated molecules, stress, and pathogens. It is responsible for the maturation and release of interleukin-1ß (IL-1ß) and the activation of the innate immune response. In this sense, the present study aimed to investigate the involvement of neuroinflammatory mechanisms and behavioral changes caused by early-life stress and its impact on adulthood. The early stress protocol consisted of applying a single episode of restraint stress for 7h, followed by a single administration of lipopolysaccharide (LPS 0.83mg / kg, i.p.) in 30-day-old female mice. The forced swimming test (TNF), tail suspension test (TSC), sucrose spray test (TBS), and open field test (TCA) were performed to assess depressive-like behavior, anxious-like behavior, anhedonic behavior, and locomotion. Behavioral assessments were performed 24h after early-life stress (during development) and at 60 days (adulthood). Also, the hippocampal immunocontent of glucocorticoid receptors, proteins related to the microglial phenotype and inflammation, Iba-1, NF-?B, and components of the inflammasome and kynurenine pathways were verified in both phases. Our results demonstrated that early-life stress was able to induce a significant reduction in body mass gain from 30 to 45 days of age, which was normalized at 60 days of age when compared to control. Concerning immediate behavioral changes, early-life stress generated short-term locomotor impairment, which was not accompanied by changes in depressive, anxious or hedonic behaviors. From a neurochemical point of view, we observed an immediate increase in the hippocampal density of NLRP3 and ASC proteins, with no change in pro-caspase-1 or caspase-1/pro-caspase-1 ratio. However, early-life stress induced a depressive-like behavior in the animals evaluated at 60 days of age, without affecting locomotion, anxiety and hedonic behavior. The late behavioral effects were associated with normalization of NLRP3 and ASC levels, but increased expression of Iba-1 and glucocorticoid receptors in the hippocampus. No alterations were observed after early-life stress on the enzyme indoleamine 2,3-dioxygenase (IDO-1) or the nuclear transcription factor NF-?B immunocontent at 30 or 60 days of age after early-life stress. In order to minimize the impact of early-life stress in neurochemical and behavioral outcomes during adulthood, we used two pharmacological strategies to inhibit the NLRP3 inflammasome pathway. The treatment with Brilliant Blue G (BBG, 50 mg/kg for 3 days) or with glibenclamide (5 mg/kg for 3 days) was not able to prevent depressive-like behavior in 60-day animals. In conclusion, early-life stress seems to induce an immediate neuroimmune activation associated with the NLRP3 inflammasome pathway in the hippocampus. These alterations may cause a long-term maladaptation, culminating in increased glucocorticoid receptor expression, microglial activation, and depressive-like behavior. However, other pharmacological strategies to block the NLRP3 inflammasome pathway need to be tested to establish whether this pathway is the trigger for late changes and if it could be a potential therapeutic target

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