Impacts of Veterinary and Human Medicinal Products in Groundwater Ecosystems

Abstract

Tese de mestrado, Biologia Humana e Ambiente, 2022, Universidade de Lisboa, Faculdade de CiênciasOs ecossistemas subterrâneos são uma importante fonte de água potável, da qual a maioria da população mundial depende. Os aquíferos são explorados para atividades como a agricultura e indústria, além dos usos domésticos, sofrendo enormes pressões pelas quantidades extraídas, e pela poluição que os atinge. Entre estes poluentes encontram-se os fármacos, administrados em humanos e animais, que os irão metabolizar e excretar através das fezes e urinas. Assim, as águas subterrâneas recebem compostos originais e metabolitos resultantes do metabolismo destes fármacos, sendo que ambas as formas poderão impactar o equilíbrio dos ecossistemas subterrâneos. Os efluentes domésticos e hospitalares são uma importante fonte de poluição, assim como a agricultura, que utiliza com frequência estrume contaminado com estes fármacos. Tudo isto atinge as águas subterrâneas por percolação e infiltração. O ecossistema subterrâneo é caracterizado pela completa escuridão, elevada humidade e temperatura estável. Este ecossistema possui ainda cadeias tróficas truncadas, característica que leva a que exista pouca redundância nas funções desempenhadas por cada organismo. Devido à escuridão que caracteriza este ecossistema, existe ainda ausência de produção primária de origem fotossintética, sendo que quando existe produção primária, esta é de origem quimiolitotrófica. Estes ecossistemas possuem assim uma dependência dos compostos orgânicos externos que surgem das escorrências e da ação da gravidade. Adicionalmente, os organismos que habitam estes ecossistemas possuem eles próprios características adaptativas similares, tais como a despigmentação, o metabolismo lento, a ausência de visão, o alongamento dos apêndices, elevada longevidade, e a produção de menos ovos, ainda que maiores. Estas espécies possuem um elevado grau de endemismo, pelo que se encontram mais suscetíveis a eventos catastróficos. Estes ecossistemas subterrâneos tão enigmáticos quanto desconhecidos, fornecem serviços de ecossistemas fundamentais. Para além de consistirem uma importante reserva de água potável, estes ecossistemas procedem à purificação de água e à manutenção do ciclo de nutrientes, possível devido aos animais que nestes ecossistemas habitam e que se alimentam de biofilmes e bactérias. Estes ecossistemas fornecem ainda refúgio a várias espécies, e são importantes locais espirituais e turísticos. De momento, as indicações pela Agência Europeia do Medicamento sugerem a realização de testes ecotoxicológicos em organismos de superfície, como substitutos aos organismos subterrâneos, os troglóbios (terrestres) ou estigóbios (aquáticos). Na avaliação de risco ambiental são considerados os três níveis tróficos: produtores primários, consumidor primário e consumidor secundário. Ainda que nos ecossistemas aquáticos de superfície o nível trófico dos produtores primários (fotossintéticos) pode ser considerado bem representado, tal não acontece no ecossistema subterrâneo. Na determinação do quociente de risco ambiental de um certo fármaco para o ecossistema subterrâneo, é necessário a utilização de dois fatores de avaliação: para a obtenção do valor mínimo em que o organismo subterrâneo é afetado é necessária a divisão do valor mínimo em que o organismo de superfície é afetado por 10; para a obtenção da concentração existente nos aquíferos é necessária a multiplicação por 0,25 ao valor encontrado nas águas superficiais. A divisão pelo fator de avaliação de 10 tem o objetivo de proteger os organismos subterrâneos, considerados mais vulneráveis, enquanto a multiplicação pelo fator de 0,25 tem o intuito de considerar a percolação e infiltração nos solos, que poderão diminuir a concentração de fármacos ao longo do percurso até aos aquíferos. Ainda assim, as diferenças fisiológicas e metabólicas existentes entre os organismos de superfície e os organismos estigóbios levantam dúvidas sobre a adequação das indicações atuais da Agência Europeia do Medicamento para a proteção dos ecossistemas subterrâneos. O objetivo principal desta dissertação é aumentar o conhecimento científico na área da avaliação de risco e gestão ambiental, através do estudo do impacto dos fármacos diclofenaco de sódio e acetaminofeno no estigóbio Proasellus lusitanicus, uma espécie aquática cavernícola endémica do centro de Portugal. O estudo da mortalidade do P. lusitanicus após exposição a diclofenaco de sódio, um anti-inflamatório não-esteróide frequentemente encontrado nas águas subterrâneas, foi efetuado através de. um teste ecotoxicológico que. consistiu num teste sem limite temporal, sendo o término determinado pela estabilidade do fármaco ou pela observação da cessação da mortalidade. Esta abordagem foi complementada com a exploração de quatro cenários para o cálculo do quociente de risco para o fármaco diclofenaco de sódio. O cálculo do quociente de risco consiste na divisão da concentração do fármaco quantificada numa massa de água pela concentração em que se prevê não haver efeito no organismo. Assim, no cenário 1 e 3, a concentração medida nas massas de água foi estimada através da análise de literatura, enquanto no cenário 2 e 4 foi estimada com recurso a uma base de dados, disponibilizada pela Agência Europeia do Ambiente. A concentração em que não se prevê qualquer efeito no organismo foi estimada no cenário 1 e 2 através das indicações da Agência Europeia do Medicamento, e no cenário 3 e 4 através do teste ecotoxicológico realizado com estigóbios da espécie P. lusitanicus. Os resultados indicam que P. lusitanicus possui uma tolerância inicial elevada ao fármaco diclofenaco de sódio. No entanto, esta tolerância vai diminuindo à medida que o período de exposição aumenta. Entre os quatro cenários calculados, aquele que apresenta um quociente de risco maior foi o cenário calculado consoante as indicações da Agência Europeia dos Medicamento. Este resultado sugere que as indicações atuais são adequadas para a proteção dos ecossistemas subterrâneos. Esta dissertação estudou também os efeitos subletais do fármaco acetaminofeno, um fármaco usado com frequência, e um contaminante recorrente das águas subterrâneas. Os efeitos subletais foram estudados através da quantificação de biomarcadores relacionados com a defesa, o stress oxidativo, a neurotoxicidade, e a produção de energia, após uma exposição de 14 dias a acetaminofeno. Após a exposição, foram analisados os níveis ou atividade dos biomarcadores glutationa total, glutationa Stransferase, peroxidase lipídica, sistema de transporte de eletrões, colinesterase e proteína total. O estudo dos níveis ou atividades de biomarcadores de dano e de defesa após exposição a acetaminofeno, quantificados nesta espécie pela primeira vez, indicam que este estigóbios possui um mecanismo de destoxificação adequado, visível pelas diferenças existentes na glutationa total e na glutationa Stransferase. Este mecanismo de destoxificação permitiu evitar dano celular em concentrações sub-letais, visível pela ausência de diferenças na peroxidase lipídica, no sistema de transporte de eletrões, e na colinesterase. Até ao momento, as indicações existentes para a proteção do ecossistema cavernícola parecem ser adequadas para o efeito, sendo necessário ter em conta que os estigóbios utilizados nestes estudos são adultos, e que indivíduos mais juvenis poderão ser mais sensíveis a estes fármacos. Adicionalmente, é necessário ter em atenção que estes estudos foram realizados para concentrações de apenas um fármaco, e não para a mistura de vários em simultâneo, como tantas vezes ocorre nas águas subterrâneas. Estes estudos não permitem tirar conclusões sobre o efeito destes fármacos na fertilidade desta espécie, um fator que pode interferir nos números de uma população, nem concluir sobre o efeito conjunto do aumento da temperatura e da exposição a fármacos na sobrevivência e mortalidades destes indivíduos. Esta dissertação representa o primeiro esforço no sentido de compreender o efeito pernicioso dos fármacos em organismos de águas subterrâneas em Portugal, testando os seus efeitos em espécies endémicas. Estudos futuros são fundamentais para tentar preencher estas e outras lacunas existentes, que levarão à produção de indicações mais adequadas para a proteção dos enigmáticos ecossistemas subterrâneos tantas vezes esquecido, ainda que tão importante.Groundwater is an important source of fresh water, with the majority of world population depending on it. This resource sustains activities such as agriculture, industry, and domestic use, and suffers pressures from the high amount of water extracted, agriculture pollution, industry and domestic effluents, and hospital sewages, through percolation and leachate. This ecosystem is characterized by darkness, high humidity, and stable temperature, with truncated trophic chains and no primary photosynthetic production. This ecosystem is inhabited by organisms with unique traits, such as depigmentation, slow metabolism, and blindness, among others. Furthermore, groundwater ecosystems provide important ecosystem services, such as water purification, nutrient cycling, and cultural services. Currently, guidelines suggest using surface species as a proxy for groundwater organisms, the so-called stygobitic species, after using an assessing factor of 10 to account for the vulnerability of these species. This dissertation aims to increase the scientific knowledge in groundwater environmental risk assessing and management, by studying the mortality of diclofenac sodium and sublethal effects of acetaminophen in stygobitic species Proasellus lusitanicus. Besides studying mortality, by using a Time-Independent assay, this dissertation focused on sublethal effects as well, by quantifying levels and activity of defence and stress biomarkers. This species shows a remarkable tolerance to diclofenac sodium, which decreases over time of exposure. Furthermore, the current guidelines for groundwater ecosystem’s protection are adequate. By studying defence and stress biomarkers after a 14-day exposure of acetaminophen, it was show that this species has a successful detoxification mechanism. This helps to explain this species’ tolerance to diclofenac sodium. In the future, more studies are necessary to better understand the impacts of these groundwater pollutants

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