Chapadeiro, Edmundo

Lopes, Edison Reis

Mesquita, Paulo Miguel de

Pereira, Fausto Edmundo Lima

Portuguese

Cadernos Espinosanos (E-Journal)

Rev. Inst. Med. trop. São Paulo CDU 616.937.3 6(6):287-291, novembro-dezembro, 1964 INCIDÊNCIA DE "MEGAS" ASSOCIADOS À CARDIOPATIA CHAGÃSICA Edmundo CHAPADEIRO (1), Edison Reis LOPES (2 ), Paulo Miguel de MESQUITA (3 ) e Fausto Edmundo Lima PEREIRA ( 4 ) RESUMO É estudada a incidência da associação cardiopatia chagásica-"megas" no Triângulo Mineiro. Em 133 cardiopatas chagásicos crônicos observaram-se 13 casos de megaesôfago, 13 casos de megacolo e somente 1 caso de mega-estô-mago. Outras megalias não foram observadas. Casos de "megas" não associados à cardiopatia chagásica não foram encontrados. Concluem pela existência de diferenças regionais nessa associação e as causas dessas diferenças necessitam maior investigação. INTRODUÇÃO Em nosso meio, parece geralmente aceita a etiologia chagásica dos "megas". Os ar-gumentos a favor dêste ponto de vista são de ordem clínica (VILLELA 41 ; ALMEIDA PRADO 2 ; PELLEGRINO & BORROTCHIN 29 ; NUNAN, REZENDE & CANELAS 24 ; PORTO 31 ; BRASIL 5 ; RASSI & CARNEIRO 34 ; FINOCHIA-RO lO; REZENDE & RASSI 37 ; MAURICIO 22 ; GoooY & HADDAD 14 ; REZENDE 36 ), epide-miológica ( GARCIA 13 ; DoRIA 9 ), sorológica (LARANJA, DIAS & NoBREGA 21 ; FREITAS 1l; PELLEGRINO & BoRROTCHIN 29 ; FREITAS }R.12; REZENDE 35 ; REZENDE & RASSI 37 ; PRATA 32 ), anatômica (KÕBERLE & NADOR 20 ; Ki:iBER· LE 16, 17 , 18 , 19 ; PENHA,& K6BERLE 30 ; PRA-TA 32 ) e experimental ( OKUMURA & col. 25 ; OKUMURA, FONSECA & CORRÊA NETTO 27 ; OKUMURA & CoRRÊA NETTO 26 ; ALCÂNTA-RA 1 ). Todavia, de acôrdo com RAMOS 33 , os dados até agora obtidos são insuficientes para se demonstrar uma relação como cau-sa e efeito entre infecção chagásica e "me-gas". Entre outros argumentos salienta êste Autor que se admite existirem diferenças regionais muito nítidas na associação doen-ça de Chagas-"megas". Há zonas, como ocorre no Rio Grande do Sul, com índices de alta positividade da reação de Guerreiro e Machado com alterações eletrocardiográfi-cas, mas sem megas"; na Venezuela (J AFFÉ 15 ) apesar de também existir a car-diopatia chagásica, não foram observados "megas". Dentro do próprio território ar-gentino parecem existir também diferenças quanto a incidência da associação de doen-ça de Chagas-"megas" (NICOLA 23 ; ROMANA, TORRES & TORNICO 39 ; BAISTROCCHI 3 ) , Tendo em vista as discrepâncias citadas e, na tentativa de trazer mais um subsídio à elucidação do problema, com a finalidade de apurar possíveis diferenças regionais, re-solvemos investigar, no Triângulo Mineiro, em nosso material de necropsia, a incidên-cia de "megas" associados à cardiopatia chágásica. Departamento de Patologia (Prof. E. Chapadeiro) - Faculdade de Medicina do Triângulo Mineiro, Uberaba, Minas Gerais, Brasil. Trabalho realizado com o auxílio da COSUPI. (1) Professor-catedrático. (2-3) Assistentes. ( 4) Monitor. 287 CHAPADEIRO, E.; LOPES, E. R.; MESQUITA, P. M. de & PEREIRA, F. E. L. - Incidência de "megas" associados à cardiopatia chagásica. Rev. Jnst. Med. trop. São Paulo 6:287-291, 1984. MATERIAL E MÉTODOS O material de estudo consta de 133 indi-víduos portadores da cardiopatia chagásica crônica, residentes no Triângulo Mineiro T-XBELA I Incidência da cardiopatia chagásica de acôrdo com o sexo (318 necropsias) Sexo N.• de % cardiopatias Masculino 97 72,9 Feminino ......... 36 27,1 Totais ............ 133 100 dentre 318 necrópsias realizadas no Depar-tamento de Patologia da Faculdade de Medi-cina do Triângulo Mineiro, distribuídos de acôrdo com o sexo (Tabela I). O diagnós-tico de cardiopatia chagásica cromca foi estabelecido pelos achados anatômicos ma-cro e microscópicos. Em todos os casos fo-ram examinadas tôdas as vísceras e tomadas suas principais medidas. RESULTADOS Os resultados estão resumidos na Tabe-la II. Como se pode observar, dos 133 ca-sos de portadores de cardiopatia chagásica crônica, 13 estavam associados ao megaesô-fago e igual número ao megacolo. Apenas 1 caso de mega-estômago foi observado. So-mente em 2 casos (protocolos 165 e 242) havia associação cardiopatia-megaesôfago-megacolo e unicamente em 1 caso (proto-colo 236) havia associação cardiopatia-mega-esôfago-megacolo-mega-estômago. Outras for-mas de "megas" (bronquiectasias, megaduo-deno, etc.) não foram notadas em nosso material. O total de casos de "megas" as-TABELA II 288 N.• de ordem 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 21 22 23 Incidência de "megas" associados à cardiopatia chagásica 1 Protocolo 14 17 18 28 78 85 165 167 170 176 178 190 206 236 239 242 268 284 293 294 409 428 448 Total de necropsias . . . . . . . . . . . . . . . . 318 Total de cardiopatias . . . . . . . . . . . . . . . 133 Sexo Idade \ Cardiopatia 1 M 40 + M 31 + M 31 + M 45 + M 50 + F 46 + M 17 + F 19 + F 31 + M 30 + F 30 + M 62 + F 48 + M 33 + F 22 + M 58 + M 63 + M - + M - + M 62 + F 59 + F 51 + M 22 + 23 Mega-esôfago + + + + -+ + ---+ --+ + + + -+ + ---13 Totais ...................... 1 Megacolo ----+ -+ + + + -+ + + -+ -+ --+ + + 13 Mega-estômago ------------+ ---------1 CHAPADEIRO, E.; LOPES, E. R.; MESQUITA, P. M. de & PEREIRA, F. E. L. - Incidência de "megas" associados à cardiopatia chagãsica. Rev. Inst. Med. trop. São Paulo 6:287-291, 1964. TABELA III Incidência de "megas" de acôrdo com o sexo Sexo N.• _de % "megas" Masculino 15 65,2 Feminino . . . . . . . . . 8 34,8 Totais ............ 23 100 sociados à cardiopatia chagásica foi de 17,3%. A incidência quanto ao sexo está resumi-da na Tabela III, onde se pode notar pre-dominância no sexo masculino. DISCUSSÃO Nossos achados confirmam de modo ge-ral, aquêles já conhecidos na literatura, obti-dos através de dados clínicos, epidemiológi-cos, sorológicos, experimentais e sobretudo anatômicos, ou seja, a grande incidência de "megas", especialmente megaesôfago e megacolo, na doença de Chagas. De outro lado, nenhum caso de "mega" não associa-do à cardiopatia chagásica foi observado. Todavia, a incidência, observada por nós (17,3%) é bem menor do que aquela obser-vada por KoBERLE 18 ; em 250 chagásicos crônicos observou 69 casos de megacolo, 62 casos de megaesôfago e 7 casos de gastro• megalia, além de outros "megas". Em vista dêstes resultados, parece-nos po-dermos concluir que em nosso material a associação de "megas" com doença de Cha-gas é menor que a observada por aquêle Autor 1 8, embora ambas as observações te-nham sido feitas no Brasil Central. Parece não haver dúvidas, portanto, quanto à dife-renças regionais na associação "megas"-doen-ça de Chagas, como admitem alguns auto-res. Assim é que, na Bahia, PRATA 32 , em 57 necrópsias de portadores de miocardite chagásica crônica observou 3 casos de "me-gas", ou seja, 5,2%. Por outro lado, no Rio Grande do Sul, apesar dos altos índi-ces da tripanossomose (BRANT & col. 4 ) pa-recem faltar "megas" ( RAMOS '33 ). Ressal-te-se, ainda, que na Venezuela, onde é fre-qüente a cardiopatia chagásica, ao que pa· rece, faltam "megas" (J AFFÉ 15 ). Admitidas· essas diferenças regionais, res-ta saber a que atribuí-las. À diferenças ra-ciais? Ao ambiente? À dieta? À cêpas diversas do tripanossoma? Por outro lado nossos achados confirmam, em bases anatômicas, as observações já an-tigas de PARlSI 28, CoRRÊA NETTO 6, FREI-TAS }R. 1 2, REZENDE & RAssr 37 , de que há maior incidência de "megas" nos homens do que nas mulheres, do mesmo modo ocor-rendo em relação à cardiopatia chagásica (DÉCOURT & col. 7 ; TRANCHESI & col. •0 ; DE MARTIN0 8 ; ROJAS 38 ). SUMMARY I ncidence o/ "megas" associated to chagasic cardiopathy. The authors study the incidence of the association Chagas' cardiopathy-"megas" in Triângulo Mineiro, Minas Gerais. They observed 13 cases of megaesophages, 13 cases of megacolon and only 1 case of me-gastomach in 133 patients with chronic Chagas' cardiopathy. Other "megalies" were not found. Cases vf "megas" not associated to Chagas' cardiopathy were not observed. They conclude for the existence of regional differences in this association and the cau-ses of these differences need to be inves-tigated. AGRADECIMENTOS Agradecemos ao Dr. J arbas Barbosa e às Srtas. Zilah Tiveron e Dinah Araujo de Souza pela assistência técnica prestada. REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS 1. ALCANTARA, F. G. - Molêstia de Chagas experimental. Lesões viscerais. Comunica-ção a I Reunião da Secção Regional da Sociedade Brasileira de Patologistas. Ube-raba, abril, 1964. 2. ALMEIDA PRADO, A. - Mal de engasgo ou doença de Chagas? São Paulo méd. 1:95, 1945. 3. BAISTROCCHI, J. D. - Megacolon: su tra-tamiento. El Dia Médico 17:476-478, 1945. 289 CHAPADEIRO, E.; LOPES, E. R.; MESQUITA, P. M. de & PEREIRA, F. E. L. - Incidência de "megas" associados à cardiopatia chagásica. Rev. Inst. Med. trop. São Paulo 6:287-291, 1964. 4. BRANT, T. C.; LARANJA, F. S.; BUSTA-MANTE, F. M. & MELO, A. L. - Dados serológicos e eletrocardiográficos obtidos em populações não selecionadas de zonas endê-micas de Doença de Chagas no Estado do Rio Grande do Sul. Rev. brasil. malariol. doenças trop. 9:141-148, 1957. 5. 6. 7. 8. 9. 10. 11. 12. 13. 14. 15. 16. 17. 18. 290 BRASIL, A. - Aperistalsis of the esopha-gus. Rev. brasil. Gastroenterol. 7:21-44, 1955. CORRÊA NETTO, A. - Patogenia, diagnós-tico e tratamento do megaesôfago. São Paulo, Ed. Nacioncil, 1935. DÊCOURT, L. V.; RODOVALHO, O.; DIAS, J. C.; CORRÊA, I. L. A.; TISI, O. G.; RAMOS Jr., J. E. ,& TRANCHES!, B. -Miocardite crônica chagásica. ,1rq. brasil. Cardiol. 1: 333-339, 1948. DE MARTINO, E. - Aspectos clínicos da doença de Chagas. Anais do Congresso In-ternacional sôbre Doença de Chagas 3: 879-889, 1962. DORIA, O. B. S. - Conduta na oclusão aguda do megacolon. Rev. brasil. Gastro-enterol. 5:379-392, 1953. FINOCHIARO, J. - Megacolo total: con-tribuição para a' etiopatogenia dos megas. Med. cir. farm. 269:377-388, 1958. FREITAS, J. L. P. - Contribuição para o estudo da moléstia de Chagas por pro-cessos de laboratório. Tese, São Paulo, 1947. FREITAS Jr., S. V. - Megaesôfago e me-gacolo no Brasil Central. Rev. clín. Cientí-fica 19:411-424, 1950. GARCIA, E. ln FINOCHIARO, 1958. GODOY, R. A. & HADDAD, N. - Tempo de trânsito esofágico em portadores de mo-léstia de Chagas. Congresso Internacional sôbre Doença de Chagas, Rio de Janeiro, julho 1959. JAFFÉ, R. über Befunde an den Herzganglien bei Chagas-Myokarditis. Klin. Wschnschr. 39:1083-1084. KõBERLE, F. - Patogénese dos megas. Rev. goiana med. 2:101-110, 1956. KõBERLE, F. - Patologia da moléstia de Chagas. Medicina CARL. 1:73-98, 1962. KõBERLE, F.- - Pathologic anatoiny of enteromegaly in Chagas disease. Meeting of the Bockus Alumni International Society of Gastroenterology 2:92-110, 1962. 19. KõBERLE, F. - Patogenia do megaesô-fago brasileiro e europeu. Rev. goiana meel. 9: 79-116, 1963. 20. KõBERLE, F. & NADOR, E. - Etiologia e patogenia do megaesôfago no Brasil. Rev. paulista med. <17:643-661, 1955. 21. 22. 23. 24. 25. 26. 27. 28. 29. 30. 31. 32. LARANJA, F. S.; ÓIAS, E. & NOBREGA, G. - Estudo eletrocardiográfico de 81 ca-sos de megaesôfago. Primeiro Congresso Panamericano de Medicina, Rio de Janeiro, setembro, 1946. MAURíCIO, J. V. - Doença de Chagas: alguns aspectos clínicos e cardiológicos. Anais elo Congresso Internacional sôbre Doença de Chagas 3: 885-891, 1962. NICOLA, C. P. - E! megasigma. El Dia Médico 20:1125-1128, 1948. NUNAN, B.; REZENDE, C. L. & CANE-LAS, A. - Contribuição ao tema Doença de Chagas na infância. Anais ela III Jor-nada Brasileira de Pi.ericultiira e Pedia-tria, 1954. OKUMURA, M.; BRITO, T.; SILVA, L. H. P. da; SILVA, A. C. da & CORRÊA NETTO, C. - The pathology of experimental Cha-ga's disease in mice: I. Digestive tract changes with a reference to necrotizing ar-teritis. Rev. Inst. Med. trop. São Paulo 2: 17-28, 1960. OKUMURA, M. ,& CORRÊA NETTO, A. C. - Etiopatogenia do megacolo chagáslco. Contribuição experimental. Rev. Hosp. Clín. Fac. Med. Univ. São Paulo 18:351-360, 1963. OKUMURA, M.; FONSECA, C. & CORRÊA NETTO, A. C. - A patologia da doença de Chagas experimental em camundongos brancos; III. Contribuição ao estudo radio-lógico dos colos. Rev. Hosp. Clín. Fac. Med. Univ. São Paulo 18:73-78, 1963. PARIS!, R. - ln CORRÊA NETTO, A. -1935. PELLEGRINO, J. & BORROTCHIN, M. -Inquérito sôbre doença de Chagas no Hos-pital da Santa Casa de Belo Horizonte. Mem. Inst. Oswalelo Cruz <16:419-457, 1948. PENHA FILHO, P. D. ,& KõBERLE, G. -Megaesôfago chagásico. Estudo quantitati-vo do plexo de Auerbach. Rev. goiana med. 5:185-192, 1959. PORTO, C. Gastropatia chagásica crô-nica. Nota prévia. ,Rev. goiana med. 1:43-54, 1955. PRATA, A. - Relação etiológica entre doen-ça de Chagas e megaesôfago. Anais do Congresso International sôbre a Doença de Chagas <l:1316-1336, 1963. CHAPADEIRO, E.; LOPES, E. R.; MESQUITA, P. M. de & PEREIRA, F. E. L. - Incidência de "megas" associados à cardiopatia chagásica. Rev. Inst. Med. trop. Sáo Paulo 6:287-291, 1964. 33. RAMOS, J. - Moléstia de Chagas. Hospi-tal (Rio de Janeiro) 58:9-28, 1960. 34. RASSI, A. & CARNEIRO, O. - Estudo clí-nico, eletrocardiográfico e radiológico da cardiopatia chagásica crônica. Análise de 106 casos. Rev. goiana med. 2:287-296, 1956. 35. REZENDE, J. M. - Megaesôfago por Doen-ça de Chagas. Rev. goiana med. 2:295-314, 1956. 36. REZENDE, J. M. - Megaesôgafo e molés-tia de Chagas. VII Congresso Internacio-nal de Medicina Tropical e Malária, Rio de Janeiro, setembro, 1963. 37. REZENDE, J. M. & RASSI, A. - Com-prometimento do esôfago na moléstia de Chagas. Hospital (Rio de Janeiro) 53 :9-28, 1958. 38. ROJAS, G. M. Cardiopatia chagásica crônica en Venezuela. Anais do Congresso Internacional sôbre Doença de Chagas 3:943-1001, 1962. 39. ROMANA, C.; TORRES, A. & TORNICO, R. A. - ln RAMOS, 1960. 40. TRANCHES!, B.; NUSSENZWEIG, I.; TRAN-CHES!, J.; CAVALHEIRO DIAS, J.; TISI, O. G. & LION, M. F. - A etiologia das cardiopatias em São Paulo. Arq. brasil. cardiol. 4:31-44, 1951. 41. VILLELA, E. - A ocorrência da moléstia de Chagas nos hospitais de Belo Horizonte e na população de seus arredores. An. Fac. Med. Univ. Minas ,Gerais 2:1-15, 1930. Recebido para publicação em 24/7/1964. 291 

Incidence of “megas” associated to chagasic cardiopathy

https://www.revistas.usp.br/rimtsp/article/download/202296/186365

Incidência de "megas" associados à cardiopatia chagásica

Abstract

Similar works

Full text

Available Versions

Cadernos Espinosanos (E-Journal)