Atala Lombelo Campos, Ana Carolina

Berg, Eduardo Van den

Cerqueira, Flávio Moreira de

Quinelato, Marciano

Santos, Aparecida Célia Paula dos

Portuguese

Archives of the Faculty of Veterinary Medicine UFRGS

NOTA CIENTÍFICA Revista Brasileira de Biociências, Porto Alegre, v. 5, supl. 2, p. 1177-1179, jul. 2007  Introdução  Entre os diversos tipos florestais encontrados no Brasil, as matas ciliares destacam-se como importantes refúgios para a fauna terrestre e aquática, como corredores de fluxo gênico vegetal e animal e como meios essenciais para a proteção do solo e dos recursos hídricos. Regiões de mata ciliar sofrem impactos naturais causados pelos cursos d'água, tais como erosão e sedimentação, e também são alvos freqüentes da ação antrópica, pois estão localizadas em sítios de fertilidade relativamente superiores, muito visados para a agricultura [1]. Estas também se caracterizam pela grande heterogeneidade ambiental formando um mosaico vegetacional, com grande diversidade florística [2]. A Lei Federal 4.777 de 15 de setembro de 1965 define, em seu artigo 2º, que as florestas e demais formas de vegetação natural são consideradas de preservação permanente quando situadas ao longo de rios ou qualquer curso d’água. No entanto, as evidências apontadas com relação à importância da conservação das florestas de galeria e as proteções legais a que elas estão sujeitas, não são suficientes para a sua preservação. Sendo assim o conhecimento das espécies que compõem essas matas é muito importante para a qualidade e perenidade dos mananciais nelas existentes. O principal rio da região de São João del-Rei é o Rio das Mortes, que possui 270km de extensão ao todo. Sua bacia situa-se no planalto da Mantiqueira onde tem suas principais nascentes, sendo caracteristicamente um rio de montanha [3]. Atualmente a mata ciliar da calha do Rio das Mortes, em São João del-Rei, vem sofrendo grande devastação principalmente pela ação antrópica através do desmatamento de extensas áreas para o cultivo. A mata ciliar do rio está restrita a pequenos trechos e, mesmo assim, muito degradada, com conseqüente erosão das margens e assoreamento do leito. Tendo em vista estes fatores, o presente estudo teve como objetivo conhecer a diversidade da flora vascular de um trecho de mata ciliar às margens do Rio das Mortes. Tais informações serão úteis para qualquer tipo de ação no local que envolva a preservação e utilização desses recursos e, eventualmente, a sua recuperação.    Material e Métodos A. Caracterização da área de estudo O presente estudo foi conduzido em um fragmento florestal da mata ciliar do Rio das Mortes de cerca de 3,05ha em parte do trecho referente ao Campus Tancredo de Almeida Neves (CTAN) pertencente à Universidade Federal de São João del-Rei (UFSJ), localizado no município de São João del-Rei, Minas Gerais, nas coordenadas 21°05'58,67"S e 44°14'51,49"W e a uma altitude de 889m.  O clima da região é do tipo Cwb, segundo a classificação de Köppen, com verão úmido e inverno seco. A precipitação anual concentra-se no período de outubro a abril e o total médio está em torno de 1.400mm. A temperatura média anual é de cerca de 19ºC. A cobertura vegetal predominante na região é caracterizada como campo cerrado e cerrado [4].  B. Levantamento estrutural Foram alocadas 54 parcelas de 10x10m cada, divididas sistematicamente em 24 transecções dispostas de forma a transpor perpendicularmente o fragmento até a margem do rio. As distâncias foram de 30m entre transecções e 10m entre parcelas.  C. Levantamento florístico Em cada parcela foram registrados todos os indivíduos arbóreo-arbustivos vivos e com circunferência à altura do peito (CAP) igual ou superior a 15,7cm. Cada indivíduo foi marcado com etiqueta de alumínio numerada, sendo registrados seu número, a espécie, o valor do CAP (medido com fita métrica), e a altura total foi estimada por comparação com o podão de 3m. O diâmetro à altura do peito (DAP) foi calculado divindo-se o valor do CAP por Pi (3,1416). Os parâmetros fitossociológicos analisados foram: densidade, dominância, altura média, diâmetro Levantamento florístico e fitossociológico da mata ciliar do Rio das Mortes em São João del-Rei, Minas Gerais Ana Carolina Atala Lombelo Campos1, Aparecida Célia Paula dos Santos2, Eduardo Van den Berg3, Marciano Quinelato4 e Flávio Moreira de Cerqueira5 __________________ 1. Bolsista FAPEMIG, Discente do Curso de Ciências Biológicas do Departamento de Ciências Naturais, Universidade Federal de São João del-Rei. Praça Dom Helvécio, 74, Bairro Dom Bosco, São João del-Rei, MG, CEP36301-160. E-mail: carolinatala@hotmail.com 2. Professora Adjunta do Departamento de Ciências Naturais, Universidade Federal de São João del-Rei. Praça Dom Helvécio, 74, Bairro Dom Bosco, São João del-Rei, MG, CEP36301-160. 3. Professor Adjunto do Departamento de Biologia, Universidade Federal de Lavras. Campus Universitário, Caixa Postal 37, 37200-000 Lavras, MG, Brasil. 4. Graduado em Ciências Biológicas, Departamento de Ciências Naturais, Universidade Federal de São João del-Rei. Praça Dom Helvécio, 74, Bairro Dom Bosco, São João del-Rei, MG, CEP36301-160. 5. Bolsista CNPq, Discente do Curso de Engenharia Mecânica do Departamento de Mecânica, Universidade Federal de São João del-Rei. Praça Dom Helvécio, 74, Bairro Dom Bosco, São João del-Rei, MG, CEP36301-160. Apoio financeiro: FAPEMIG.  Revista Brasileira de Biociências, Porto Alegre, v. 5, supl. 2, p. 1177-1179, jul. 2007 1178 médio e área basal. D. Herborização do material coletado Todo material foi herborizado segundo as técnicas convencionais de Mori [5] e incorporado ao Herbário ESAL, pertencente à Universidade Federal de Lavras (UFLA).  E. Identificação do material coletado A identificação do material coletado foi feita por morfologia comparada segundo o sistema de classificação de Cronquist [6] até o nível de família. Para as categorias taxonômicas mais específicas os indivíduos coletados foram identificados com o auxílio de bibliografia especializada, consulta a especialistas e comparação com exsicatas.  Resultados Foram amostrados 459 árvores e arbustos com DAP ≥ 5cm, estimando-se uma média de 850 indivíduos/ha, distribuídos em 29 espécies, 28 gêneros e 17 famílias. As famílias que apresentaram maior riqueza em espécies foram: Leguminosae (cinco espécies), Myrtaceae (quatro), Euphorbiaceae (três), Anacardiaceae (três) e Salicaceae (duas). Essas cinco famílias detiveram 60,81% das espécies amostradas, enquanto que as outras dez famílias dividiram os 39,19% das espécies restantes. As espécies que participaram com maior número de indivíduos na composição da cobertura florestal foram: Schinus terebinthifolius Raddi (22,22%), Matayba guianensis Aubl. (13,29%), Croton urucurana Baill. (12,85%), Inga vera Willd. (7,41%), Psidium guajava L. (6,97%) e Ocotea pulchella (Nees) Mez (6,75%). Essas espécies representavam 69,49% do total de indivíduos amostrados. A Tabela 1 ilustra de forma detalhada o papel de cada espécie em um contexto geral.  Observou-se uma baixa densidade de indivíduos com DAP ≥ 5cm e uma baixa riqueza de espécies. Notou-se a ocorrência de cinco espécies exóticas dentre as 29 registradas, são elas: Syzygium jambos (L.) Alston (1,31%), Eucalyptus sp. (1,31%), Citrus sp. (1,74%), Morus nigra L. (0,44%) e Mangifera indica L. (0,22%).   Discussão Conforme destacaram Meyer et al. [7], Euphorbiaceae, Lauraceae, Leguminosae, Myrtaceae e Anacardiaceae, aparecem entre as dez famílias com maior número de espécies em áreas de florestas de galeria estudadas em Minas Gerais. Estes mesmos autores comentam ainda que as dez famílias citadas em seu estudo também foram registradas em 43 trabalhos realizados em florestas ciliares do Brasil extra-amazônico, em condições de clima e de altitude muito variáveis.  O perfil florístico do fragmento confirma a observação de Botrel et al. [1] de que as famílias de maior riqueza nas matas ciliares do Centro-Sul do Brasil são Myrtaceae, Lauraceae, Fabaceae e Euphorbiaceae. A listagem florística apresentou, ainda, muitas espécies já  reconhecidas como de ocorrência comum em matas ciliares, como Tapirira guianensis Aubl. e Casearia sylvestris Sw.  De acordo com Ricklefs [8] a diversidade é o número de espécies presentes em uma pequena área de habitat, onde a estrutura da vegetação atua como um importante fator determinante, de forma que a presença de espécies exóticas pode resultar na perda de populações nativas. Essa perda pode provocar uma homogeneização considerável da biota, ou seja, diminuição da diversidade local.  No fragmento estudado a presença de espécies exóticas pode ter relação com a baixa diversidade, apesar do pequeno número (cinco) em relação às nativas (24). Deve-se considerar também que o local trata-se de uma fazenda cuja área é destinada ao cultivo há mais de cem anos. Esses fatores podem justificar a presença de espécies exóticas frutíferas e de interesse econômico, como o Citrus sp. e o Eucalyptus sp.              A baixa densidade de indivíduos, o baixo número de espécies e baixa diversidade, a presença de espécies pioneiras e secundárias como Schinus terebinthifolius, Croton urucurana, Inga vera, Cestrum laevigatum Schltdl., Casearia sylvestris, Tibouchina candolleana (DC.) Cogn., entre outras, apontam para uma mata secundária e provavelmente em estágio de regeneração.  Agradecimentos  Ao taxonomista Douglas Antônio de Carvalho, pela valiosa ajuda; à funcionária do herbário ESAL Solange, à Rubens de Oliveira Campos e Denise Atala Lombelo Campos, pelo auxílio em campo. A FAPEMIG pela concessão da bolsa de iniciação científica.   Referências [1] BOTREL, R. T.; OLIVEIRA FILHO, A. T.; RODRIGUES, L. A. & CURI, N. 2002. Influência do solo e topografia sobre as variações da composição florística e estrutura da comunidade arbóreo-arbustiva de uma floresta estacional semidecidual em Ingaí, MG. Revista Brasileira de Botânica, 25: 195-213. [2] BERTANI, D. F.; RODRIGUES, R. R.; BATISTA J. L. F. & SHEPHERD, G. J. 2001. Análise temporal da heterogeneidade florística e estrutural em uma floresta Ribeirinha. Revista Brasilica Botanica, 24: 11-23. [3] GUIMARÃES, G. 1988. A bacia do Rio das Mortes. Revista do Instituto Histórico e Geográfico de São João del-Rei, 6: 25-43.  [4] FUNDAÇÃO CENTRO TECNOLÓGICO DE MINAS GERAIS (CETEC). 1989. Caracterização Ambiental da Bacia do Rio das Mortes. MG. Relatório Técnico Final. Vols. 1 e 2. Belo Horizonte. [5] MORI, S. A.; SILVA, L. A. M.; LISBOA, G. & CORADIN, L. 1989. Manual de manejo do herbáceo fanerogâmico. 104p.  [6] CRONQUIST, A. 1988. The evolution and classification of flowering plants. New York Botanical Garden. 556p. [7] MEYER, S. T.; SILVA, A. F. da; MARCO JUNIOR, P. de & MEIRA NETO, J. A. A. 2004. Floristic composition of trees in gallery forest of Rola-Moça State Park in Metropolitan Region of Belo Horizonte, MG, Brazil. Acta Botanica Brasilica, 18: 701-709. [8] RICKLEFS, R. E. 2003. A Economia da Natureza. Rio de Janeiro, Editora Guanabara Koogan. 503p.   Revista Brasileira de Biociências, Porto Alegre, v. 5, supl. 2, p. 1177-1179, jul. 2007 1179Espécie N P h  DA  VI  d AB  Schinus terebinthifolius Raddi 102 32 7,21 33,44 22,22% 0,27 8,61 Matayba guianensis Aubl. 61 17 8,89 20,00 13,29% 0,24 3,96 Croton urucurana Baill. 59 26 7,26 19,34 12,85% 0,15 1,35 Inga vera Willd. 34 16 9,79 11,15 7,41% 0,31 3,78 Psidium guajava L. 32 10 4,18 10,49 6,97% 0,11 0,33 Ocotea pulchella (Nees) Mez 31 10 8,13 10,16 6,75% 0,21 1,55 Celtis brasiliensis (Gardner) Planch. 18 5 6,86 5,90 3,92% 0,19 0,64 Cestrum laevigatum Schltdl. 15 8 4,87 4,92 3,27% 0,13 0,22 Rollinia emarginata Schltdl. 14 7 8,07 4,59 3,05% 0,12 0,22 Casearia sylvestris Sw. 14 8 6,07 4,59 3,05% 0,14 0,41 Tibouchina candolleana (DC.) Cogn. 14 2 5,00 4,59 3,05% 0,10 0,12 Myrsine coriacea (Sw.) R. Br.  13 6 8,23 4,26 2,83% 0,13 0,21 Citrus sp.  8 2 3,19 2,62 1,74% 0,12 0,10 Myrcia splendens (Sw.) DC. 7 6 6,43 2,30 1,53% 0,14 0,14 Syzygium jambos (L.) Alston 6 5 5,75 1,97 1,31% 0,08 0,03 Eucalyptus sp. 6 4 9,50 1,97 1,31% 0,25 0,53 Salix humboldtiana Willd. 5 2 14,80 1,64 1,09% 0,39 0,62 Sebastiania klotzchiana (Müll. Arg.) Müll. Arg. 4 2 7,75 1,31 0,87% 0,22 0,27 Lithraea molleoides (Vell.) Engl. 2 2 4,50 0,66 0,44% 0,09 0,01 Tapirira guianensis Aubl. 2 2 10,50 0,66 0,44% 0,17 0,05 Calophyllum brasiliensis Cambess. 2 2 6,25 0,66 0,44% 0,06 0,01 Cassia ferruginea (SCHRADER) Schrader ex DC. 2 2 4,50 0,66 0,44% 0,12 0,03 Morus nigra L. 2 2 5,50 0,66 0,44% 0,16 0,06 Cecropia pachystachya Trécul 1 1 11,00 0,33 0,22% 0,27 0,06 Sebastiania brasiliensis Spreng. 1 1 5,00 0,33 0,22% 0,21 0,03 Acacia recurva Benth. 1 1 7,00 0,33 0,22% 0,33 0,09 Machaerium hirtum (Vell.) Stellfeld 1 1 10,00 0,33 0,22% 0,21 0,03 Erythrina falcata Benth. 1 1 6,00 0,33 0,22% 0,05 0,00 Mangifera indica L. 1 1 7,00 0,33 0,22% 0,11 0,01 Tabela 1. Espécies de árvores com DAP ≥ 5cm amostradas em 54 parcelas de 10x10m na Mata Ciliar do Rio das Mortes, município de São João del-Rei, Minas Gerais, com seus respectivos parâmetros fitossociológicos. N = número de indivíduos; P = número de parcelas onde ocorre; h = altura média (m); DA = densidade absoluta (indivíduos/ha); VI = Valor de importância (%); d = diâmetro médio (m) e AB = área basal média dos indivíduos de cada espécie (m2).  

Levantamento florístico e fitossociológico da mata ciliar do Rio das Mortes em São João del-Rei, Minas Gerais

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