Throughout its history, many were the times the European project was pronounced dead. From 1992 Danish blockage to the Maastricht Treaty to the French and Dutch „No‟s to a European Constitution in 2005, the spectre of faltering political institutions for shaping an integrated economy seems to rise stronger every time.
The hypothesis of this dissertation is that the European project is well captured by Polanyi‟s thesis of the Double Movement. The institutional architecture of European integration, it is argued, triggers a process of market disembeddedness. This architecture is characterized by an asymmetry between negative integration advanced by supranational enforcement of the Single Market and intergovernmental governance of positive (market-shaping) integration.
As a result, particularly after the Maastricht Treaty, domestic institutions have been pressured to comply with market requirements. At the same time, however, protective countermovements arose to reembed a disembedded economy.
This dissertation is structured as follows: Chapter 1 explores Polanyi‟s thesis of the Double Movement; chapter 2 builds on the Varieties of Capitalism approach to identify distinct market embedding institutions in Europe (according to these differences, a set of countries is chosen in order to monitor the process of market disembeddedness); chapter 3 outlines the hypothesis of asymmetric integration; chapter 4 identifies institutional arenas in which market is disembedded; chapter 5 assesses the impact upon market-embedding institutions of the selected economies and identifies protective countermovements.
The dissertation concludes by drawing implications that may contribute to the ongoing debate over European integration.A construção de um Mercado Europeu foi, desde cedo, uma questão muito mais popular e exequível do que a da construção de uma integração política. Desde cedo, contudo, que os mais proeminentes europeístas como Delors ou Schuman defenderam que uma União económica não seria possível sem instituições políticas à escala Europeia que salvaguardassem a coesão social dos efeitos do mercado livre. Ao longo da sua história, o aprofundamento da integração económica foi marcado por bloqueios e convulsões que iam denunciando a resistência das sociedades relativamente a um Mercado Único Europeu sem uma Europa Social. Do „não‟ Dinamarquês ao Tratado de Maastricht, em 1992, à rejeição da Constituição Europeia nos referendos populares em França e na Holanda, em 2005, muitas foram as vezes que o projecto Europeu foi tido por condenado, traído por um mercado que tinha ido longe demais e pelo espectro da questão política.
Esta dissertação parte da intuição inicial de que a arquitectura institucional da integração Europeia consubstancia uma determinada economia política que Polanyi (1947) designa por Obsoleta Mentalidade Mercantil.
A Obsoleta Mentalidade Mercantil traduz a ideia de que a maximização do lucro individual e o princípio do laissez-faire correspondem a uma natureza humana e ordem social espontânea, sobre a qual instituições não mercantis (políticas, regulatórias, etc.) exercem constrangimentos artificiais; criar condições para a instalação de um mercado competitivo e sem distorções (“artificiais”) no sistema de formação de preços com base na oferta e na procura seria, portanto, condição suficiente (e ideal) para a coordenação dos actores sociais e económicos. Nada há, contudo, segundo Polanyi, de mais contrário à realidade. A Economia assenta em instituições histórica e culturalmente determinadas, e o mercado deve ser compreendido como um padrão de relacionamento parametrizado por essas estruturas social e historicamente determinadas e incrustado nelas. O que é artificial é, portanto, a desincrustação do padrão de mercado dessas estruturas.
Particularmente, a ingenuidade e utopia de um tal projecto residem em que ele ignora a realidade daquilo que Polanyi designa por Mercadorias Fictícias. Trabalho, terra e moeda não foram produzidos para serem vendidos e organizados segundo o mecanismo do mercado. Isto é muito intuitivo relativamente ao trabalho humano: se o valor da mercadoria é definido pela interacção entre procura e oferta, então a mercadoria trabalho tem de estar sujeita a ser deixada de parte, sem nenhum valor atribuído, na circunstância de não haver procura e utilização para ela; isto, como é evidente, não pode ser feito sem arriscar a vida do indivíduo que é o “portador” dessa mercadoria.
A mercadoria fictícia trabalho (nesta dissertação, iremos apenas focar-nos na desincrustação do mercado do ponto de vista da mercadorização do trabalho) é desmercadorizada por instituições colectivamente determinadas que definem noções de vida e de oportunidades de bem-estar que devem ser reconhecidas aos indivíduos dessa sociedade, independentemente do funcionamento do mercado. Ao mesmo tempo, contudo, estas instituições limitam a completa organização do trabalho num mercado, produzem atrito a que o seu valor reflicta a interacção entre a oferta e a procura. Reside aqui o paradoxo do mercado, ao mesmo tempo que estas instituições garantem que o seu funcionamento não resulta na destruição do indivíduo e na desagregação do tecido social, é o próprio mercado que pede que o trabalho (elemento essencial da actividade económica) esteja disponível e organizado num mercado competitivo.
A criação desse mercado, contudo, ao contrário do que a Obsoleta Mentalidade Mercantil do laissez-faire quer fazer parecer, não tem nada de natural, não corresponde a nenhuma característica ou tendência essencial do mercado para se instalar como mecanismo de coordenação dos indivíduos em sociedade; antes corresponde a um processo altamente artificial de remoção dos parâmetros instalados pelas instituições referidas que colocam obstáculos e produzem atritos. Esse processo artificial de remoção de entraves à organização social num mercado competitivo, importa frisá-lo, é um processo de decisão de remoção desses parâmetros: o mercado é criado legislativa e judicialmente.
A artificialidade desta construção resulta em que o mercado nunca pode ser inteiramente desincrustado das estruturas sociais que o parametrizam e que, em particular, que desmercadorizam a actividade humana. Ao mesmo tempo que decisões políticas e judiciais criam e fazem avançar o princípio organizacional do mercado, reacções espontâneas surgem sob as mais variadas formas para recalibrar o tecido institucional de forma a puxar o mercado de volta para uma posição incrustada. É este o fundamental da economia política polanyiana do Duplo Movimento que irá informar a nossa análise: o mercado é criado; a reacção social para reincrustá-lo é espontânea – “o laissez faire foi planeado; o planeamento não” (Polanyi, 2001[1944]: 147, minha tradução)
A hipótese que esta dissertação se propõe a investigar é, neste quadro, a seguinte: A história da integração Europeia pode ser contada nos termos da narrativa polanyiana do Duplo Movimento.
Para tanto, esta dissertação estruturar-se-á da seguinte forma: (1) o primeiro capítulo desenhará a economia política polanyiana do Duplo Movimento que servirá de quadro teórico à leitura do projecto Europeu, aqui serão identificados elementos conceptuais estratégicos que estruturarão e orientarão toda a dissertação (a noção de uma perspectiva da economia como um processe assente em instituições; o conceito de instituições de incrustação do mercado e desmercadorização do trabalho – relações industriais e Welfare States -, a artificialidade da desincrustação do mercado e o carácter defensivo e desarticulado do segundo movimento).
O (2) segundo capítulo partirá da abordagem à economia enquanto processo institucional e da noção de instituições de desmercadorização do trabalho trabalhadas no capítulo 1), e identificará que configurações estas instituições assumem de facto nas economias políticas europeias (deste trabalho, um conjunto de países será seleccionado, pelas suas especificidades institucionais, com vista a uma mais próxima monitorização do processo de desincrustação, ao longo de toda a dissertação).
O (3) terceiro capítulo exporá a arquitectura institucional que desencadeia a desincrustação do mercado nas economias políticas europeias; esta arquitectura caracteriza-se por configurar uma assimetria fundamental entre os modos de governação das liberdades de mercado (supranacional-hierárquico) e os modos de governação da construção de instituições de incrustação do mercado à escala Europeia (negociações intergovernamentais). Em particular, identificar-se-á o período pós-Maastricht como o ponto marcante da habilitação desta estrutura de integração assimétrica, que marca a transição, na história da integração Europeia, para uma fase em que esta passa a adereçar as instituições domésticas de desmercadorização do trabalho; assinalar-se-á também o papel estratégico desempenhado pelo Tribunal de Justiça da União Europeia nesta estrutura, assim como no processo de criação do Mercado único e, sobretudo, no processo da sua desincrustação das instituições domésticas.
O (4) quarto capítulo exporá como esta estrutura de integração assimétrica se traduziu em actos específicos de criação de mercado. Focar-nos-emos nas liberdades económicas que foram consolidadas com Maastricht: o princípio da livre provisão de serviços, o princípio de liberdade de estabelecimento e princípio da livre circulação de capitais. Estas garantias configuram a criação de um mercado único para a provisão de serviços e para a governação corporativa desincrustado das estruturas colectivas de relações industriais. Este quarto capítulo mostrará também como as liberdades de Mercado, no contexto de integração assimétrica, ameaçam os arranjos institucionais domésticos para desmercadorização do trabalho que se baseiam no financiamento colectivo (no modelo continental de segurança social, baseado em contribuições relacionadas com a participação no trabalho) e/ou no financiamento público (baseado nas receitas fiscais); no contexto de integração assimétrica exposto no terceiro capítulo, o mercado único desencadeia uma “concorrência de regime” (Scharpf, 2001, 2006), traduzida em pressões sobre os custos não salariais do trabalho (o que afecta particularmente os modelos de segurança social baseados nas contribuições do trabalho), e em concorrência fiscal (Ganghof and Genschel, 2007, Genschel et al. 2009). Finalmente, este capítulo prestará ainda atenção às pressões adicionais sobre as instituições dos países da zona euro pela União Económica e Monetária; especificamente, dando conta de como o paradigma subjacente ao Pacto de Estabilidade e Crescimento constrange ainda mais a opção de financiamento público dos Welfare States.
Finalmente, o quinto (5) capítulo divide-se em três momentos cruciais. O primeiro identificará tendências de mudança institucional nos campos das instituições de incrustação do mercado (i.e. relações industriais e Welfare States) das economias políticas escolhidas no capítulo 2, que são consistentes com os elementos identificados no quarto capítulo. O segundo momento identificará tendências de reincrustação ao nível de cada uma destas economias, no quadro da distinção polanyiana entre a artificialidade do primeiro movimento de criação de mercado e o segundo movimento defensivo, composto por iniciativas desarticuladas e focadas em dar uma resposta de reincrustação a estímulos de mercadorização particulares. O terceiro momento identificará sinais do segundo movimento à escala Europeia, e avaliará criticamente o seu alcance, no âmbito da integração assimétrica.
Finalmente, desta análise da integração europeia como hipótese polanyiana serão retiradas conclusões que possam constituir contributo à construção de uma solução europeísta e democrática para os actuais problemas e estrangulamentos da construção Europeia, não só relativamente à actual crise das dívidas soberanas, mas, mais profundamente (e porque se considera que esta é muito mais uma crise de configuração institucional do que uma crise localizada nos problemas de endividamento externo de algumas economias), relativamente ao problema estrutural da integração assimétrica