MOREIRA, Filipe Alves

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Casa de Sarmento

 Casa de Sarmento Centro de Estudos do Património Universidade do Minho Largo Martins Sarmento, 51 4800-432 Guimarães E-mail: geral@csarmento.uminho.pt URL:  www.csarmento.uminho.pt  Este trabalho está licenciado com uma Licença Creative Commons Atribuição-NãoComercial-SemDerivações 4.0 Internacional.  https://creativecommons.org/licenses/by-nc-nd/4.0/     Revista de Guimarães Publicação da Sociedade Martins Sarmento    UM BREVE APONTAMENTO INÉDITO SOBRE A LOCALIZAÇÃO DA BATALHA DE S. MAMEDE. MOREIRA, Filipe Alves Ano: 2005-2006 | Número: 115-116   Como citar este documento: MOREIRA, Filipe Alves, Um breve apontamento inédito sobre a localização da Batalha de S. Mamede. Revista de Guimarães, 115-116 Jan.-Dez. 2005-2006, p. 191-196.  UM BREVE APONTAMENTO INÉDITO SOBRE A LOCALIZAÇÃO DA BATALHA DE S. MAMEDEFilipe Alves Moreira1Tem sido longamente discutido, por especialistas das mais diversas áreas, qual o local exacto da batalha de S. Mamede2. Por vezes apaixonada e calorosa, esta discussão tem, em última instância, origem no facto de as fontes mais antigas se referirem de forma bastante lacónica à localização da dita batalha. O presente trabalho visa fornecer uma pequena contribuição para este problema, tornando público um apontamento inédito, depois de sucinto resumo sobre os textos conhecidos.A tradição historiográfica: da Chronica Gottorum a Cristóvão Rodrigues AcenheiroA mais antiga referência que hoje conhecemos à localização da batalha que, em Junho de 1128, opôs as tropas do Infante Afonso Henriques às de sua mãe e do nobre galego Fernão Peres de Trava é registada num texto saído do scriptorium  de Santa Cruz de Coimbra em finais do século XII, a que tradicionalmente se chamava Crónica Gottorum , e  a que a critica mais recente prefere chamar Anais do Rei Dom Afonso Henriques3:«[Afonso Henriques] Commisit cum eis prelium in campo Sancti Mametis, quod est prope castellum de Vimaranes(...)»4Curiosamente, este será o único texto a registar a informação de que a batalha se deu nos “campos de S. Mamede”, designação que perdurará até hoje. Nos textos subsequentes, ou se indicará apenas a cidade de Guimarães, ou, precisando-se um pouco mais, indicar-se-á um local cuja designação não será “de São Mamede”.1 Investigador e doutorando na Faculdade de Letras do Porto2 Veja-se as referências de AMARAL, pp. 45-46.3 Em rigor, os Anais de D. Afonso Henriques são uma parte da Crónica Gottorum. Sobre este venerável texto historiográfico, são fundamentais os estudos de DAVID. Sobre a sua ideologia, MATTOSO, 1993. É igualmente útil ler as considerações tecidas por PIMENTA. Tendo-se perdido os manuscritos medievais desta obra, apenas nos é dado conhecê-la através da transcrição feita por Fr. António Brandão, um dos autores da Monarquia Lusitana, no século XVII.4 PIMENTA, pág. 30.Em data incerta, mas anteriormente aos finais do século XIII, redigiu-se um pequeno texto historiográfico que dava particular importância à figura de D. Afonso Henriques, e no qual se acolhia, provavelmente pela primeira vez, a lenda da prisão de D. Teresa em seguida e em consequência da batalha de que nos temos vindo a ocupar. Este texto está hoje perdido, mas dele derivaram, directa ou indirectamente, uma parte da Crónica de Vinte Reis (obra castelhana realizada sob orientação de Afonso X entre 1282 e 1284), o título VII do Livro de Linhagens do Conde D. Pedro  (ca. 1340) e a IV a Crónica Breve de Santa Cruz de Coimbra (manuscrito do século XV que copia um texto bastante anterior)5. Em todos eles, e sem dúvida como consequência de derivarem da mesma fonte, se indica apenas a cidade de Guimarães:«E ouieron la fazienda en Guimaranes» (Crónica de Vinte R e is f ; «E veerom aa fazenda em Guimarães» (Livro de Linhagens)7; «E entrárom e veérom aa fazenda em Guimarães» (4a Crónica B reve f.O texto cronologicamente seguinte irá fornecer uma localização mais precisa, que será retomada pela generalidade da tradição posterior. Aludimos à Crónica Geral de Espanha de 1344, redigida pelo mesmo responsável pelo Livro de Linhagens, D. Pedro Afonso, e da qual, para a secção que aqui nos interessa, se conhece apenas uma refundição realizada cerca de meio século depois. É esta crónica que pela primeira vez menciona o campo de São Redanhas:«E logo aprazarõ a batalha que fosse õ Guymaraães c o logar que dize Sã Redanhas»9A partir daqui, será esta a localização adoptada por todos os autores, até ao século XVI. É esta a informação registada tanto pela Crónica de Portugal de 1419, talvez da autoria de Fernão Lopes, como por Duarte Galvão, embora com ligeira variante em relação ao texto da Crónica de 1344:«e vierom se ajumtar em Guymarães em hum lugar que chamom Santidanhas» (Crónica de 1419)10; «(...) e vieram-se ajuntar em Guimarães,5 As relações entre estes três textos foram magistralmente tratadas por CINTRA e CATALÁN MENÉNDEZ PIDAL. Deste problema trata, igualmente, a dissertação de mestrado que apresentámos à Faculdade de Letras da Universidade do Porto.6 ASENCIO e JIMENEZ (ed.), pág. 261.7 MATTOSO (ed.), pág. 125.8 PEIXOTO (ed), pág. 112.9 ESTEVES (selecção), pág. 192.10 CALADO (ed.), pág. 10.192em um lugar que chamam Santidanhas» (Crónica de D. A fonso Henriques de Duarte Galvão)11.Na primeira metade do século XVI, é também esta a informação veiculada por Cristovão Rodrigues Acenheiro:«(...) e ambos se virão junto de Gimarais em hum Lugar que chamão Samremdanha (s/c)» (Chronicas dos Senhores Reis de Portugal)12Todavia, com o decorrer do tempo, a designação “São Redanhas” foi caindo no esquecimento, o que torna muito difícil apontar hoje em dia a sua localização13, visto que as notícias que acabámos de transcrever se limitam a dizer que tal sítio se situava perto de Guimarães. Tanto quanto se sabia, apenas Fernão Lopes, no século XV, informa um pouco mais. Efectivamente, mencionando a vinda de D. João I para conquistar Guimarães, o cronista refere-se a São Redanhas, podendo presumir-se da descrição que faz do itinerário das tropas reais que tal sítio se localizava nos arredores de Guimarães, na direcção do Porto14:«(...) e chegaram já muito noite à Veiga de São Redanhes, uma meia legoa do logar, pequena» (Crónica de D. João I, Segunda Parte, Cap. XI)15Um testemunho desconhecido sobre a localização da batalhaEste não é, contudo, o único texto onde ainda se podem colher informações mais concretas sobre tão misterioso lugar. 0  manuscrito 1198 da Biblioteca Pública Municipal do Porto, ainda inédito, inclui um Sumário de Crónicas escrito no século XVI16, o qual, embora baseado sobretudo, segundo parece17, nas crónicas que Duarte Galvão e Rui de Pina fizeram para os reinados de D. Afonso Henriques a D. João II, inclui várias informações que não estão na obra destes cronistas. Uma delas diz respeito, precisamente, a São Redanhas. Mencionando a batalha, diz o seu redactor:,1 BRAGANÇA (ed.), pág. 38. Segundo informa o responsável por esta edição, um dos manuscritos da Crónica de Galvão regista “Sam Rredanhas”, tal como a C rón ica  d e  1344.12 ACENHEIRO, pág. 18.13 Cf. AMARAL, pág. 45-46.u  Este facto tem sido lembrado por José Hermano Saraiva.15 LOPES, pág. 43.16 Agradecemos penhoradamente à Joana Gomes a grande ajuda que nos tem dado na leitura deste manuscrito.17 Temos em mãos a realização de um trabalho mais detalhado sobre este manuscrito.193« (...) ao campo omde aouverom (?) com o primcipe seu filho na veigua de Samtidanhas por omde core hum grande rio acerqua de guimarais»18.Não é possível saber-se com certeza em que se baseou o redactor para dar esta informação, mas o mais provável é que na época em que escrevia ainda fosse corrente o topónimo “São Redanhas”. Há, aliás, outros casos no texto em que ele se preocupa em precisar um pouco melhor as localizações vagas que encontrou nas crónicas que estava a resumir.Se acrescentarmos estes dados aos que nos fornece Femão Lopes, podemos presumir que São Redanhas seria nome de uma veiga, a qual se localizaria nos arredores de Guimarães, na direcção do Porto, e pela qual corria um grande rio, que não pode deixar de ser o Selho. A aceitarmos a tradição que atribui a São Redanhas a localização da batalha tradicionalmente chamada de S. Mamede, não seria muito diferente o cenário com que, em Junho de 1128, se depararam as tropas do Infante e dos nobres galegos. Quando menos, e graças a este manuscrito, ficamos a saber um pouco mais sobre São Redanhas, topónimo que no século XVI ainda seria perfeitamente conhecido.18 Folio 4v.194REFERÊNCIASACENHEIRO, Cristovão Rodrigues, Chronicas dos Senhores Reis de Portugal,Collecção de Inéditos da Historia Portugueza, Tomo V, Academia das Sciencias de Lisboa, 1824.AMARAL, Diogo Freitas do, D. Afonso Henriques. Biografia, Lisboa, Bertrand, 17a edição, 2003.ASENCIO, José Manuel Rui e JIMENEZ, Mauricio Herrero (ed.), Crónica de Veinte Reyes, Excelentisimo Ayuntamiento de Burgos, 1991.BRAGANÇA, José de (ed.), Crónica de D. Afonso Henriques de Duarte  Galvão, Lisboa, Portugália, s/d.CALADO, Adelino de Almeida (ed.), Crónica de Portugal de 1419, Aveiro, Universidade de Aveiro, 1998.CATALÁN MENÉNDEZ PI DAL, Diego, De A lfonso X  al Conde de Barcelos..., Madrid, Gredos, 1962.CINTRA, Luis Filipe Lindley (estudo e edição), Crónica Geral de Espanha de  1344, Lisboa, Academia das Ciências, 4 vol., 1951 - 1990.DAVID, Pierre, Études historiques sur la Galice et le Nord du Portugal du  VIe au Xlle siècle, Lisboa, 1947ESTEVES, Elisa Nunes (selecção e introdução de), Narrativas da Crónica  Geral de Espanha de 1344, Obras Clássicas da Literatura Portuguesa, n°23, Lisboa, Vega, 1998.LOPES, Fernão, Crónica de El-Rei D. João  I. Segunda Parte, Vol. IV, Biblioteca de Clássicos Portugueses, Lisboa, 1897 (on-line  emhttp://purl.Pt/416/1/hg-17356-p_vol4/hg-17356-p_vol4_item1/P2.html).195MATTOSO, José (ed.), Portugaliae Monum ento Histórica. Nova Série. Livro de Linhagens do Conde D. Pedro, Lisboa, Academia das Ciências, 1980 (2 volumes).MATTOSO, José, «Anais», in Dicionário da Literatura M edieval Galega e Porrtuguesa, direcção de Giulia Lanciani e Giuseppe Tavani, 2a edição, Lisboa, Caminho, 2000.PEIXOTO, Fernando Venâncio (ed.), Crónicas Breves e M em órias Avulsas de Santa Cruz de Coimbra, Lisboa, 2000.PIMENTA, Alfredo (Selecção, prefácio e notas,), Fontes M edievais da História de Portugal. Volume I. Anais e Crónicas. Lisboa, Colecção Clássicos, Sá da Costa, 1948.196

Um breve apontamento inédito sobre a localização da Batalha de S. Mamede.

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