Texto sobre Renato Ferraz escrito por seu amigo Trípoli F. B. Gaudenzi

F. B. Gaudenzi, Trípoli

Portuguese

Portal de Periódicos da UNEB

	41 RENATO FERRAZ: AMIGO E PARCEIRO  Conheci Renato José Marques Ferraz no Colégio Nossa Senhora da Vitória, dos Irmãos Maristas, onde fazia meu Curso Secundário, embora não tivéssemos um relacionamento direto, visto frequentar ele um curso mais adiantado, àquela época.  Com minha inclinação natural para assuntos históricos, no decorrer das leituras instigadas pelo Professor de Língua e Literatura, deparei-me com Os Sertões de Euclydes da Cunha, leitura que muito me impressionou e que, tempos depois, resultou na decisão de uma releitura e na tentativa de ilustrar todo aquele drama, visando facilitar, através de uma figuração narrativa, a melhor compreensão sobre aquela importante página da sua própria História. Assim, nos anos de1990, iniciei os primeiros estudos e levantamento de dados que me levariam à elaboração do que chamei de Projeto Canudos: conjunto de informações de variadas fontes ligadas a historiadores nacionais e estrangeiros. que se interessaram por esse evento, até então tão pouco contemplado pela historiografia oficial brasileira. Alguns meses depois, na fase final do trabalho, com o atelier em natural desordem, uma pilha de desenhos ocupava a mesa central e telas de diversos tamanhos se apoiavam pelas paredes. O que fazer com esses trabalhos? Sugeriram-me procurar o Professor José Calasans Brandão da Silva, o Historiador de Canudos, no seu Núcleo Sertão - de saudosa memória - na Universidade Federal da Bahia e, na Universidade do Estado da Bahia, o Centro de Estudos Euclydes da Cunha (CEEC), o que fiz. Qual não foi a minha surpresa ao encontrar no CEEC o Professor Renato Ferraz, ao lado de um grupo de pioneiros nesses estudos euclydianos, com o objetivo central de promover estudos sistemáticos e aprofundados sobre a Epopeia de Os Sertões no seu cenário natural, transformado num campus avançado da UNEB, na cidade de Canudos.  O Professor Renato Ferraz muito se interessou quando lhe falei do meu projeto e aquiesceu ao meu convite de visitar os trabalhos no atelier, o que aconteceu poucos dias depois. Acredito que tenha ficado bem impressionado por que exclamou, ao final da visita: “É Canudos rediviva!” Estava, assim, denominada a futura coleção de imagens que seria montada para exposições que vieram a percorrer inúmeras instituições no Brasil e museus no 	42 exterior. Para isso, convidei o Professor Renato para ser o Curador dessas obras, pois ninguém melhor do que ele poderia fazê-lo: era Antropólogo, Historiador, conhecedor de Arte (fora Diretor do Museu de Arte Moderna da Bahia) e Especialista no tema de Canudos, além de conhecedor de todo o cenário onde o drama se desenvolveu.  A época era propícia a manifestações culturais e o apoio da Secretaria de Cultura e Turismo do Estado da Bahia/Bahiatursa, graças à ativa participação de Renato Ferraz nas negociações com outras Secretarias de Estado, instituições culturais do Brasil e do exterior; sua atuação foi fundamental para a montagem e para o sucesso das exposições que se seguiram ao longo dos anos 90, tendo o experiente Professor José Calasans sempre presente quando consultado sobre dúvidas ou incertezas a respeito dos convites recebidos ou mesmo das exposições sugeridas aqui ou acolá. Renato Ferraz tinha uma qualidade natural para fazer contatos, negociar a partilha dos custos da produção: telefonava para agências transportadoras, providenciava a embalagem e a guarda das obras, os contatos de recepção e de expedição, os roteiros a serem seguidos, os protocolos a serem cumpridos etc., sobretudo quando se tratava de mostras no exterior. Tomou um grande susto quando houve um atraso na chegada das obras no Aeroporto José Martí, em Havana; outro susto maior - que, aliás, também não pude evitar de ter  - quando, em Paris, o Órgão Governamental de recepção de obras de arte chegadas do exterior, situado no Petit Palais, atrasou na liberação, ocasionando grande atraso no levantamento da exposição; providenciou a ida da exposição de Colônia para Berlim por terra, cancelando a via aérea bastante mais cara; em São Paulo, ao lado do Museu da Imagem e do Som, achou ótima a ideia e reforçou com os responsáveis uma apresentação do cantor Jereba, o que deu grande animação ao evento; ainda quando da exposição no Palácio do Catete, no Rio de Janeiro (aquele mesmo de onde o então Presidente Prudente de Morais ordenara a destruição final de Canudos), providenciou queijos de cabra do Semiárido de Canudos para serem degustados nos jardins do palácio, acompanhados de vinho da região de Juazeiro do São Francisco, o que se constituiu num sucesso à parte. Navegamos com a sua Curadoria por ares e mares ao longo dos anos 90, começando nas inesquecíveis Semanas Culturais de Canudos, onde se deu a primeira Exposição na cidade de Canudos (1991) e, em seguida, por Unidades da UNEB em várias regiões do Estado, através de entendimentos diretos do Prof. Renato com os Diretores locais. Seguiram-se pedidos de várias instituições culturais brasileiras ao Curador e todas foram atendidas dentro do possível: Universidade Federal de Sergipe, 	43 Aracaju; Universidade Estadual do Vale do Acaraú; Sobral, Ceará, Conjunto Cultural da Caixa Econômica Federal, Brasília; Museu do Estado do Ceará, Fortaleza; Espaço de Arte da Prefeitura de Quixeramobim, Ceará; Espaço Cultural do Banco do Brasil, Rio de Janeiro; Museu Euclydiano de São José do Rio Pardo, São Paulo; Museu do Solar Ferrão, Centro Histórico, Salvador; Museu Palácio Rio Negro, Manaus, Amazonas; Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ); Museu de Arte da Bahia, Salvador, finalizando em Paris, no Museu Nacional de História Natural, Pavillon de l´Homme, com o patrocínio da UNESCO, da Embaixada do Brasil na França, da Secretaria de Cultura e Turismo do Estado da Bahia e da Universidade do Estado da Bahia.  Em todos os momentos, agradáveis, bons e menos bons, inerentes a uma exposição itinerante dessa natureza, cujo único objetivo era de cunho cultural, ou seja, difundir aspectos da nossa História moderna que vieram amalgamar e fazer melhor entender a nossa História Contemporânea. Como disse Renato Ferraz na apresentação do Catálogo desta Exposição: “... Daí que, além de exemplar como obra de síntese histórica, esta Exposição, que batizamos de Canudos Rediviva, tem o poder quase mágico de nos fazer “ver”. E é sempre muito mais difícil “ver” do que “falar”. Era uma personalidade por vezes intransigente nas suas convicções, mas fiel na amizade e sensível na alma. O sucesso alcançado no Projeto Canudos, que atingiu horizontes muito além dos esperados, deveu-se, não somente à sensibilidade do Governo do Estado da Bahia, através a sua Secretaria específica naquele momento, mas, também, às condições existentes de um cenário favorável no País, que vieram facilitar o trabalho dos artistas criadores e de “pessoas especiais”, como Renato Ferraz que, muitas vezes, mais que simples curadores, cuidadores ou mesmo conservadores, intermediavam os processos culturais imaginativos e que transformavam um sonho em realidade. Sem dúvida alguma, Renato Ferraz foi uma dessas pessoas.  Trípoli F. B. Gaudenzi Salvador, Junho, 2022. 

RENATO FERRAZ: AMIGO E PARCEIRO

https://revistas.uneb.br/index.php/canudos/article/download/14895/10042

RENATO FERRAZ: AMIGO E PARCEIRO

Abstract

Similar works

Full text

Available Versions

Portal de Periódicos da UNEB