Cruz, Sérgio Nuno da Silva Ravara Almeida

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Repositório Institucional da Universidade de Aveiro

36  CONTABILISTA 229COLABORAÇÃO ISCA-UARealizações de utilidade socialNão existe uma definição concreta de «realizações de utilidade social.» Podemos dizer que são um conjunto de benefícios de natureza social que as empresas proporcionam aos seus trabalhadores. Estaremos perante gastos aceites em sede do IRC e excluídos de tributação em sede do IRS. Por Sérgio Ravara Cruz*| Artigo recebido em abril de 2019O artigo 43.º do CIRC versa sobre «realizações de uti-lidade social.» Esta dispo-sição permite que o reconhecimen-to contabilístico de determinados gastos, não sendo aceites fiscal-mente pelo artigo 23.º do CIRC, pos-sam ser dedutíveis na determinação do resultado fiscal, justificado pela função social desempenhada pela empresa. Não existe uma definição de «rea-lizações de utilidade social.» De uma forma genérica, podemos dizer que são um conjunto de be-nefícios de natureza social que as empresas proporcionam aos seus trabalhadores (dependentes), aos “seus” reformados e aos respeti-vos familiares (a delimitação será o de agregado familiar constante no CIRS?). O n.º 1 do artigo 43.º do CIRC exige que estes benefícios «tenham ca-ráter geral e não revistam a nature-za de rendimentos do trabalho de-pendente ou, revestindo-o, sejam de difícil ou complexa individuali-zação relativamente a cada um dos beneficiários.» Portanto, estare-mos perante gastos aceites em sede do IRC e excluídos de tributação em sede do IRS (veja-se por exem-plo, as alíneas b), d) e e) do n.º 1 do artigo 2.º-A do CIRS)1. De acordo com o n.º 1 do artigo 43.º do CIRC incluem-se, neste âmbito, os gas-tos referentes a «depreciações ou amortizações e rendas de imóveis, relativos à manutenção facultativa de creches, lactários, jardins-de--infância, cantinas, bibliotecas e escolas.»2  O n.º 9 prevê uma ma-joração de 40 por cento dos gas-tos relativos a «creches, lactários e jardins-de-infância» (a deduzir no campo 774 do quadro 07 da de-claração modelo 22; a inscrever no campo 412 do quadro 04 do anexo D). Dentro da lógica desta disposi-ção, tipifica o n.º 15 que se incluam os «gastos suportados com a aqui-sição de passes sociais em benefí-cio do pessoal do sujeito passivo.»Segundo a alínea a) do n.º 2 do artigo 43.º do CIRC, estas realiza-ções abarcam, também, os seguros de acidentes pessoais, de vida, de doença ou saúde e as contribuições para fundos de pensões e equipa-ráveis ou para quaisquer regimes complementares de segurança social, «que garantam, exclusi-vamente, o benefício de reforma, pré-reforma, complemento de reforma, benefícios de saúde pós--emprego, invalidez ou sobrevi-vência a favor dos trabalhadores da empresa»3. A alínea b) prevê a pos-sibilidade de o benefício do seguro de doença ou de saúde se estender aos reformados e respetivos fami-liares. Porém, os benefícios tipifi-cados no n.º 2 estão dependentes do preenchimento, em simultâ-neo, de um conjunto de requisitos formais estabelecidos no n.º 4 – destaca-se o caráter de generali-dade e a necessidade de se estabe-lecer critérios objetivos e idênticos para todos os trabalhadores (sobre ABRIL 2019  37COLABORAÇÃO ISCA-UAeste último aspeto, ver, nomea-damente, informação vinculativa 3021/2018, de 6 de dezembro de 2018).Por exemplo, a informação vincu-lativa n.º 213/2019, de 21 de março de 2019, esclarece que são de cará-ter geral «as realizações de utili-dade social colocadas à disposição de todos os trabalhadores perma-nentes da empresa, sem qualquer distinção, podendo, no entanto, as mesmas visar só os trabalhadores inseridos em determinadas clas-ses profissionais mas, neste caso, apenas em cumprimento de ins-trumento de regulamentação cole-tiva de trabalho.» De acordo com o mesmo despacho, o requisito é, igualmente, preenchido «quando não beneficiem das realizações de utilidade social os trabalhadores abrangidos que comuniquem por escrito tal intenção à empresa.» Deste modo, «o requisito do cará-ter geral consiste […] em aferir […] se um mesmo universo de pessoas beneficia, em condições de igual-dade, da mesma oferta.» Portanto, o relevante é se à generalidade dos trabalhadores foi dada a possibili-dade da sua fruição, independen-temente de poder não ser aceite por alguns. O exposto reforça e de-senvolve o parecer dado na infor-mação vinculativa 2 957/2008, de 22 de outubro de 2008.Caso as exigências formais sejam verificadas, o gasto é aceite até ao limite de 15 por cento «das des-pesas com o pessoal contabiliza-das a título de remunerações, or-denados ou salários respeitantes ao período de tributação» (n.º 2). Atendendo à informação vincula-tiva n.º 695/1996, de 21 de junho de 1996, «são consideradas despe-sas com o pessoal todas as despe-sas que, tendo a natureza genérica de remunerações, sejam objeto de descontos obrigatórios para a Se-gurança Social ou para qualquer regime substitutivo.» O limite re-ferido ascende a 25 por cento, «se os trabalhadores não tiverem direi-to a pensões da segurança social» (n.º 3).Entende-se que o artigo 43.º do CIRC tem um enquadramento fle-xível, e não fechado, por duas ra-zões: no início do n.º 1 é utilizada a expressão «incluindo»; e a meio dessa disposição é estabelecida a possibilidade de se considerar como gasto fiscal «outras realiza-ções de utilidade social como tal reconhecidas pela Direcção-Geral dos Impostos.» Assim, pode con-siderar-se que as informações vin-culativas emitidas pela AT sobre estas matérias não se circunscre-vem, apenas, à entidade requeren-te, revestindo-se de um despacho de caráter geral aplicável a qual-quer entidade, podendo ser enten-dido como uma extensão dos casos tipificados no artigo 43.º do CIRC. Neste contexto enquadram-se as informações vinculativas seguin-tes:•2 321/2017, de 28-07-2017 – Os COLABORAÇÃO ISCA-UA38  CONTABILISTA 229gastos incorridos com almoços convívio entre os trabalhadores, incluindo o jantar de Natal, e com a colocação à disposição destes de água, café, snacks, sumos e fruta podem enquadrar-se no âmbito do n.º 1 do artigo 43.º do CIRC, desde que: revistam caráter geral; visem o bem-estar dos trabalhadores; e, sejam de difícil individualização relativamente a cada um dos tra-balhadores (o que impede a tribu-tação em sede do IRS). •3 262/2018, de 29-10-2018 – apesar do n.º 1 do artigo 43.º do CIRC ti-pificar que os gastos relacionados com cantinas integram as realiza-ções de utilidade social, cumpri-dos os pressupostos estabelecidos na lei, esta informação despacha no sentido que tal, também, se verifica quando a confeção das refeições é subcontratada. Por conseguinte, neste tipo de casos, é aceite como gasto fiscal «de-signadamente as depreciações do imóvel afeto à cantina e o custo das refeições entre outros», ape-sar de as refeições serem subcon-tratadas a terceira entidade, mas consumidas em cantina própria da entidade. Portanto, o âmbito social deve ser analisado em sentido lato, en-globando o lazer. Atente-se que a alínea b) do n.º 1 do artigo 2.º-A do CIRS estabelece que estão fora do âmbito de tributação «os be-nefícios imputáveis à utilização e fruição de realizações de utilidade social e de lazer mantidas pela en-tidade patronal, desde que obser-vados os critérios estabelecidos no artigo 43.º do Código do IRC.» Esta é uma redação mais recente (adita-da pela Lei n.º 82-E/2014, de 31 de dezembro) que a do artigo 43.º do CIRC (outrora artigo 40.º do CIRC até à republicação originada pelo Decreto-Lei n.º 159/2009, de 13 de julho). Nesse sentido, os almoços convívios dos trabalhadores – e até com familiares – e o jantar de Natal passaram a estar tipificados como realizações de utilidade social. Por certo, haverá outras situações que poderão ficar contidas por estes ar-tigos. Numa realidade em que com fre-quência se fala da «sociedade mo-derna» ou da «responsabilidade social das empresas», a legislação fiscal analisada define as regras que delimitam os gastos suportados pe-las empresas com a promoção de políticas de apoio aos trabalhadores, ex-trabalhadores reformados e res-petivos familiares, nomeadamente na proteção na velhice, saúde, edu-cação e na criação de condições que propiciem o bem-estar dos seus tra-balhadores.*Professor adjunto no ISCA-UANotas:1 Neste cruzamento de códigos fiscais, também, poder-se-ia desenvolver as implicações em sede do IVA das situa-ções que provocam gastos aceites pelo artigo 43.º do CIRC. Se algumas estão isentas do IVA, por força do artigo 9.º do CIVA, outras há que estão sujeitas a IVA e que, em regra, não será dedutí-vel, nos termos dos artigos 20.º e 21.º do CIVA.2 Ao nível do apoio concedido pelas em-presas à educação dos dependentes dos seus trabalhadores veja-se a informa-ção vinculativa n.º 508/2018, de 29-06-2018, que se encontra em consonância com as últimas alterações à lei fiscal.3 Sobre estes benefícios, para além das informações vinculativas indicadas no corpo do artigo, existem outras, como por exemplo: 3409/2005, de 19-01-2016; 1172/2015, de 02-05-2016; 726/2016, de 30-09-2016; 3439/2016, de 02-06-2017; 3688/2016, de 27-06-2017; 1166/2017, de 07-12-2017; 3021/2018, de 06-12-2018; 201/2019, de 04-03-2019.

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