Poluição por microplásticos em ambientes dulçaquícolas: ingestão e efeitos em invertebrados bentónicos

Abstract

Microplastics can be defined as “any synthetic solid particle or polymeric matrix, with regular or irregular shape and with size ranging from 1 μm to 5 mm, of either primary or secondary manufacturing origin, which are insoluble in water”. The growing demand and consequent production of plastic products both at microscale (e.g., personal care products) and at macroscale with inappropriate disposal subsequent degradation in the environment has turned microplastics into global emergent pollutants of the aquatic environment. In fact, the levels of microplastics that have been found in river and lake sediments, raise concern about ingestion and potential negatives effects of microplastics in aquatic benthic invertebrates, particularly those who feed on particulate matter. Possible effects at different levels of biological organisation (sub -organismal up to community level s) are still overlooked , as well as the study of the toxic effects of microplastics to invertebrate biota under relevant exposure scenarios, especially considering climatic change. Therefore, the objective of this thesis was to evaluate the effects of irregularly shaped pol y ethylene microplastics (one of the polymer type microplastics most produced and found in aquatic sediments) using a holistic approach that combines sub -organismal, organismal, population and community level responses, aiming to produce relevant ecotoxicol o gical data for risk assessment of microplastics in freshwaters. First, a quantitative and qualitative assessment of the ingestion of microplastics was evaluated in two model aquatic species, the dipteran Chironomus riparius and the endobenthic oligochaet e Lumbriculus variegatus, as these species feed on particulate matter, being prone to ingest microplastics. Along with the assessment of the ingestion of microplastics, the effects (both at sub -cellular and organismal level) were assessed in an attempt to link ingestion and potential deleterious effects induced by the particles per se. Activation of immune response (phenoloxidase activity), oxidative stress and damage , as well as , effects on life -history traits (larval growth and development) , were observed in C. ripariu s and associated to the augmented ingestion and retention of microplastics in their gut when compared to L. variegatus, which only presented slight evidence of oxidative stress and no effects on reproduction. The combined exposure of microplastics with natural stressors was then performed in Chironomus riparius (the most sensitive species ). Temperature, salinity and food shortage were used as natural stressors relevant under climate change scenarios and that could modulate the ingestion and induced effects of microplastics in relevant exposure scenario s . The results show that interactions between microplastics exposure and these natural stressors are complex and mainly additive and antagonistic effects were observed. However, results also identified conditions (low temperatures and severe food shortage) where sub - lethal effects of MPs to natural populations of C. riparius can be stronger than predicted by standard toxicity assays. These combined exposures revealed that under different environmental conditions, toxicity of MPs is not simply a reflection of internal concentrations of particles. Conceivably the main research gap that subsists is the investigation on the ecological effects of microplastics. For that purpose, this thesis performed a mesocosms approach addressing the effects at the community structure and ecosystem functioning, vital to deliver higher - tier risk assessments . This higher -tier approach (i.e., using artificial streams inoculated with natural benthic invertebrate communities) showed that the exposure to a pool of different -sized polyethylene microplastics affected the macroinvertebrate community structure, mainly by reducing the abundance of deposit -feeders and grazers. The ingestion of microplastics by different invertebrate feeding groups correlated positively with the effects as deposit -feeders and grazers presented the higher number of microplastics inside the organisms’ guts. A slight reduction in primary production was observed and may be a possible direct effect of microplastics on periphyton growth. Only slight effects were observed in terms of leaf litter decomposition signalling that the exposure to polyethylene microplastics might not have affected feeding behaviour of shredders or in turn that exposure period was too short to reveal trait -mediated indirect effects . In conclusion, the present thesis demonstrates that microplastics can be ingested by some aquatic macroinvertebrates and that enhanced ingestion can potentially pose a risk to natural invertebrates’ population. Despite considerable interspecific variation in sensitivity to polyethylene microplastics, their presence in sediments can alter community structure and represent a risk to ecosystem functioning at the long -term. The present thesis confirms that immune responses and oxidative stress as key molecular initiating event s in microplastic toxicity, shows that assessing the internal concentrations of plastic particles is critical for a correct evaluation of effects in biota and highlights the need to incorporate more invertebrate species and relevant exposure conditions for an accurate risk assessment of microplastics in freshwaters.Os microplásticos podem ser definidos como “qualquer partícula sólida de origem sintética ou matriz polimérica, de forma regular ou irregular e com tamanho entre 1 μm to 5 mm, tanto de origem de produção primária como secundária e que são insolúveis em água”. A crescente procura por este tipo de produtos e consequentemente a sua maior produção, tanto à microescala (p. ex.: produtos de higiene pessoal), como à macroescala com descarte incorreto e consequente degradação no meio ambiente, tornaram os microplásticos num poluente emergente do ambiente aquático à escala global. Assim sendo, os níveis de microplásticos que têm vindo a ser encontrados nos sedimentos de rios e lagos geram preocupação acrescida relativamente à sua potencial ingestão e efeitos gerados por esta em invertebrados bentónicos, particularmente aqueles que se alimentam de matéria orgânica particulada. Existe ainda pouca informação relativamente aos possíveis efeitos provocados pelos microplásticos nos diversos níveis de organização biológica (desde o nível suborganismal até à comunidade), bem como, em relação aos efeitos dos microplásticos em invertebrados sob cenários relevantes de exposição, em especial considerando as alterações climáticas. Assim, o principal objetivo desta tese foi o de avaliar os efeitos de microplásticos com forma irregular de polietileno (um dos polímeros mais produzidos no mundo e também dos mais encontrados nos sedimentos de rios e lagos), usando uma abordagem holística que combina respostas ao nível sub-organismal, organismal, populacional e da comunidade, pretendendo deste modo facultar informação ecotoxicológica relevante que possa ser usada na avaliação de risco dos microplásticos em ambientes dulçaquícolas. Para tal, a ingestão de microplásticos foi avaliada em termos quantitavos e qualitativos em duas espécies bentónicas -modelo, o díptero Chironomus riparius e o oligoqueta Lumbriculus variegatus, que sendo espécies que se alimentam de matéria particulada, estarão mais suscetíveis à ingestão de microplásticos. Paralelamente à avaliação da ingestão de microplásticos, foram também avaliados os efeitos (tanto a nível sub-celular como ao nível do organismo) numa perspetiva de relacionar ingestão e efeitos. Os principais efeitos observados prenderam-se assim com a ativação da resposta imune (medida através da atividade da fenoloxidase), stress e dano oxidativo, bem como efeitos ao nível do ciclo de vida em C. riparius (diminuição do crescimento larvar e atraso no desenvolvimento). Estes efeitos foram assim relacionados com a maior ingestão de microplásticos, quando comparada com a ingestão observada em L. variegatus, que somente apresentou sinais ligeiros de stress oxidativo e ausência de efeitos na reprodução. A espécie mais sensível, Chironomus riparius, foi então exposta a microplásticos em combinação com diversos stressores naturais. Os stressores naturais escolhidos foram a temperatura, salinidade e limitação da disponibilidade de alimento, sendo estes relevantes em cenários de alterações climáticas, e capazes de alterar a ingestão e consequentemente os efeitos provocados pelos microplásticos. Os resultados demonstram que as interações decorrentes da exposição conjunta de microplásticos com os stressores naturais são complexas, sendo que os efeitos observados foram maioritariamente aditivos ou antagonísticos. Contudo, sob determinadas condições como baixa temperatura e significativa limitação da disponibilidade de alimento, os efeitos sub -letais dos microplásticos nas populações naturais de C. riparius poderão ser mais severos que o previsto pelos ensaios ecotoxicológicos padronizados. Estes efeitos combinados revelaram ainda, que sob determinadas condições ambientais, os efeitos tóxicos dos microplásticos poderão não ser simplesmente um reflexo das concentrações de microplásticos encontrada s no interior dos organismos. A avaliação dos efeitos ecológicos da exposição a microplásticos é possivelmente , a principal lacuna que subsiste na investigação. Assim, esta tese procurou colmatar essa lacuna, com recurso a um ensaio usando rios artificiais (mesocosmos), em que foram estudados os efeitos na estrutura da comunidade de invertebrados bentónicos, bem como nas funções providenciadas pelo ecossistema, vitais para uma melhor avaliação de risco. Esta abordagem demonstrou que a exposição a microplásticos de polietileno de diversos tamanhos afetou a estrutura da comunidade, sobretudo através da redução da abundâ ncia de invertebrados coletores de depósito e raspadores. A ingestão de microplásticos pelos diferentes grupos funcionais de invertebrados correlacionou -se positivamente com os efeitos, uma vez que coletores de depósito e raspadores apresentaram o maior número de microplásticos no seu interior . Foi ainda observada uma ligeira redução na produção primária que poderá estar relacionada com um efeito direto dos microplásticos no crescimento do perifíton. De igual modo, observou -se apenas uma ligeira redução na decomposição da folhada, sendo este efeito indicativo de que a exposição a microplásticos de polietileno poderá não afetar significativamente o comportamento alimentar dos fragmentadores, ou em alternativa o tempo de exposição poderá ter sido demasiado curto para que estes efeitos indiretos se possam ter manifestado. Em conclusão, a presente tese demonstra que os microplásticos podem ser ingeridos pelos macroinvertebrados de água doce e representar um risco para as populações naturais. Apesar de se ter verificado uma considerável variação interespecífica na sensibilidade aos microplásticos de polietileno, a sua presença nos sedimentos pode alterar a estrutura das comunidades de macroinvertebrados bentónicos e alterar o funcionamento dos ecossistemas a longo prazo. A presente tese comprova também que a resposta imune e o stress oxidativo são eventos -chave de início a nível molecular na toxicidade dos microplásticos, e demonstra que a avaliação das concentrações internas dos microplásticos é crucial para uma correta avaliação dos efeitos nos organismos. Salienta -se ainda a necessidade da incorporação de mais espécies de invertebrados, assim como, de cenários relevantes de exposição para uma avaliação de risco mais precisa dos microplásticos nos ecossistemas dulçaquícolas.Programa Doutoral em Biologia e Ecologia das Alterações Globai

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