research

Colonialismo e história

Abstract

Assistimos hoje no campo da reflexão histórica mundial à veemência do reaparecimento do fenómeno colonial, que se tem vindo a impor não só pela sua natureza de ‘temática das minorias’ , mas também pelo duplo facto de, por um lado, permitir repensar em termos ‘pós-coloniais’, as identidades nacionais dos colonizadores e dos colonizados, cuja emancipação passou pela recuperação da sua própria história, pela afirmação da sua identidade histórica e pela preservação da sua memória, e por outro, exigir uma maior densidade interrogativa sobre a politização e a ideologização interna da História. Reflectindo sobre a importância da ‘democratização’ introduzida pela história contemporânea no palco da História, Pierre Nora (Rendez-vous de l’Histoire, 2011) sublinha uma evidência: a história mundial, que enraíza no eurocentrismo, se regista o laço apertado entre Europa/Ocidente e História, num movimento semelhante àquele que estabelece a relação profunda entre Nação e História, impõe o estudo do fenómeno colonial, cada vez mais considerado como núcleo estruturante dos processos de construção da História, das histórias nacionais (também) ocidentais. Se a articulação entre História e Ideologia regista o modo como a história do Ocidente ou a história ‘à ocidental’ foi objecto de manipulação do político e do ideológico, mostra também como as histórias das nações europeias se organizaram e se tornaram o eixo central a partir do qual se estratificou o resto da História e do Mundo. Mas o estudo do colonialismo que põe em evidência a natureza hegemónica do Ocidente, dando conta da inevitabilidade da ideologização do fabrico da História, revela hoje a necessidade de proceder à revisão da simples inscrição do colonialismo no grande registo da história nacional, reescrevendo-a à luz do fenómeno colonial. A renovação da historiografia portuguesa, a partir da década de 1840, na esteira das “mais avançadas historiografias europeias da época, fez emergir “um novo protagonista e referente identitário, a nação” (Matos, 2013) que se foi construindo baseado na ideia de uma superioridade racial/física, intelectual e cultural europeia e na organização de projectos e de práticas, que fixaram os ingredientes científico-culturais que permitiram, no século XX, materializar a hierarquização e a dominação do mundo. Escrever hoje sobre a relação entre a historiografia portuguesa e o fenómeno colonial que marcou intensamente a história nacional nos últimos dois séculos, representa uma tarefa complexa onde se cruzam silêncios e incomodidades, manipulações políticas e ideológicas, distorções documentais e fragilidades conceptuais, que exigem um trabalho árduo e crítico de reorganização de um passado marcado por preconceitos múltiplos, cujos sinais permanecem inscritos no Portugal contemporâneo

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