Breve introdução à publicação, nesta Machadiana digital, das duas colunas “Vespas Americanas” publicadas em junho de 1864 na revista Semana Ilustrada e inéditas em livro, assinadas por Gil, pseudônimo utilizado na juventude por Machado de Assis

Korytowski, Ivo

Portuguese

Periódicos científicos  (Universidade Federal do Espírito Santo)

KORYTOWSKI, Ivo. As “Vespas Americanas” de Machado de Assis. 63 Machadiana Eletrônica, Vitória, v. 8, n. 16, p. 63-66, jul.-dez. 2025.        AS “VESPAS AMERICANAS” DE MACHADO DE ASSIS   Ivo Korytowski Pesquisador independente   Resumo: Breve introdução à publicação, nesta Machadiana digital, das duas colunas “Vespas Americanas” publicadas em junho de 1864 na revista Semana Ilustrada e inéditas em livro, assinadas por Gil, pseudônimo utilizado na juventude por Machado de Assis.  Palavras-chave: Machado de Assis, crônicas   “Vespas Americanas” foi uma coluna de crônicas satíricas de Machado de Assis, publicada apenas duas vezes pela revista semanal carioca Semana Ilustrada, em 5 e 19 de junho de 1864, sob o pseudônimo Gil. Durante doze anos (1864-1876) Machado foi colaborador regular da revista, participando também de outras colunas, a saber:   “Novidades da Semana / Pontos e Vírgulas / Badaladas”, coluna coletiva, com vários colaboradores, que circulou de 1864 a 1876 e foi mudando de nome. Como todos os autores assinavam com o mesmo pseudônimo, “Dr. Semana”, saber quais colunas foram escritas por Machado tornou-se um trabalho de detetive que desafiou e continua desafiando os especialistas.  “Nova Crônica”, coluna sem periodicidade certa, que circulou em 1869-70, assinada por Sileno.1                                                   1 Uma visão geral da produção machadiana no gênero da crônica pode ser obtida na seção “Crônicas”, de minha autoria, no verbete “Obra de Machado de Assis” da Wikipédia (<https://pt.wikipedia.org/wiki/Obra_de_Machado_de_Assis>). KORYTOWSKI, Ivo. As “Vespas Americanas” de Machado de Assis. 64 Machadiana Eletrônica, Vitória, v. 8, n. 16, p. 63-66, jul.-dez. 2025.  Em relação ao pseudônimo, vale a pena reproduzir o verbete “Gil” do Dicionário de Machado de Assis de Ubiratan Machado:  Pseudônimo utilizado quinze vezes por Machado, em diversas fases da juventude. A primeira vez foi em O Espelho, nos artigos “Folhas Velhas – O Mosteiro de São Bento” e “As gralhas sociais”, nos dias 4 e 18 de dezembro de 1859. Só voltaria a usá-lo nos “Comentários da Semana”, no Diário do Rio de Janeiro, de 12 de outubro a 11 de dezembro de 1861, totalizando nove colaborações. O pseudônimo ressurgiu na Semana Ilustrada, firmando a seção “Vespas Americanas”, publicada apenas duas vezes, nos dias 5 e 19 de junho de 1864. Depois de um longo hiato, Gil reaparece em dois artigos na Semana Ilustrada, em 5 de setembro de 1869 e 30 de janeiro de 1870, este abordando o Mosaico Brasileiro, de Moreira de Azevedo.2  As fontes de inspiração do autor foram duas, explicitamente citadas na primeira das duas crônicas: “Estas vespas nem são áticas como as de Aristófanes, nem gaulesas, como as de Alphonse Karr.” As vespas áticas são uma alusão à peça As Vespas do autor grego antigo Aristófanes, já as vespas gaulesas referem-se à revista satírica de grande sucesso Les Guêpes publicada pelo romancista e jornalista francês Alphonse Karr de 1839 a 1849. Tanto na coluna de Machado como nas revistas de Karr, desenhos (diferentes) de uma vespa delimitam os tópicos. Outra possível influência, embora não explicitada, pode ter sido o livro de poesias A Vespa do Parnaso, publicado no Porto em 1854 por Faustino Xavier de Novais, que foi amigo de Machado e irmão de Carolina Augusta Xavier de Novais, com quem Machado viria a se casar em 1869.   Machado escreve sobre suas próprias vespas: “Voem, voem, minhas vespas! Há tempos já que vos conservo escondidas e tranquilas. É preciso voar, correr, picar, e depois voltar de novo ao vosso asilo, para sair a novas empresas para a semana seguinte!”  Já Faustino Xavier de Novais escreve no poema “A Vespa”, que abre seu livro:  Por todo o mundo girando Me vereis sempre, voando, Pica-aqui, pica-acolá;3                                                  2 Ubiratan Machado, Dicionário de Machado de Assis, 2a edição revista e ampliada. São Paulo: Imprensa Oficial do Estado de São Paulo; Rio de Janeiro: Academia Brasileira de Letras; Lisboa: Imprensa Nacional, 2021. 3 Poema “A Vespa”, em Faustino Xavier de Novais, A Vespa do Parnaso. Porto: Tipografia de J. A. de Freitas Júnior, 1854. KORYTOWSKI, Ivo. As “Vespas Americanas” de Machado de Assis. 65 Machadiana Eletrônica, Vitória, v. 8, n. 16, p. 63-66, jul.-dez. 2025.   Essas Vespas Americanas nunca foram publicadas em livro, nem mesmo nas diversas edições da Obra completa de Machado de Assis.4 Quem as descobriu foi José Galante de Sousa, conforme revela Raimundo Magalhães Júnior no volume 2, “Ascensão”, de sua monumental Vida e obra de Machado de Assis:  O pseudônimo de Gil vinha de O Espelho. Passara, depois, ao Diário do Rio de Janeiro. E fora, por fim, retomado na Semana Ilustrada. José Galante de Sousa aí o encontrou, assinando umas croniquetas com o título de Vespas Americanas, mas apesar de existir numa delas a primeira paródia de Machado de Assis à Guitarre de Victor Hugo, sobre Gastibelza, l’homme à la carabine, em que tantas vezes reincidiu, o bibliógrafo levou longe demais os seus escrúpulos e disse não dispor de “argumentação cabal” para tal atribuição, desprezando as restantes.5  Magalhães Júnior, portanto, discordando da conclusão de Galante de Sousa, julga que a citação ao poema de Hugo (além do pseudônimo Gil) permite atribuir a Machado, sem sombra de dúvida, as duas “croniquetas”. De fato, pesquisa rápida em edição eletrônica das crônicas machadianas (eis que o computador veio substituir as memórias prodigiosas dos pesquisadores de antanho!) mostra que Machado aludiu ao poema de Hugo: 1) Na crônica “Ao Acaso” de 2 de maio de 1865 (“Conhecem os nossos leitores o Gastibelza de Victor Hugo, aquela balada que começa por estes versos:”); 2) nas “Balas de Estalo” de 28 de maio de 1885, tendo merecido uma nota explicativa da organizadora Heloisa Helena Paiva De Luca; 3) na crônica “A Semana” de 29 de novembro de 1896, reproduzida na Machadiana Eletrônica v. 7, n. 14 (2024), com interessante nota de rodapé por Gilson Santos sobre o poema e sua paródia por Machado. Magalhães Júnior já havia citado as Vespas antes no artigo “Dispersos de Machado de Assis”, publicado na primeira página do 2º caderno do jornal carioca Correio da Manhã de 5 de março de 1966. Ali, escreveu (os negritos são do texto original: “Aquele pseudônimo [Gil], tão frequente no Diário do Rio de Janeiro, seria retomado por Machado na Semana Ilustrada, assinando as Vespas Americanas sob a inspiração das Guêpes de Alphonse Karr, em 1864.”                                                  4 Confira: 1) Dicionário de Machado de Assis, de Ubiratan Machado, verbete “Vespas Americanas”; 2) John Gledson, “A história das edições das crônicas machadianas”, em Machado de Assis, Crônicas escolhidas. São Paulo: Penguin-Companhia das Letras, 2013. 5 R. Magalhães Júnior, Vida e obra de Machado de Assis, volume 2, “Ascensão”. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 1981, p. 56. KORYTOWSKI, Ivo. As “Vespas Americanas” de Machado de Assis. 66 Machadiana Eletrônica, Vitória, v. 8, n. 16, p. 63-66, jul.-dez. 2025.  Resta o mistério: por que Magalhães Júnior, ao organizar suas coletâneas de textos machadianos inéditos em livro, publicadas entre 1956 e 1958 pela Editora Civilização Brasileira (e republicadas mais tarde pela Ediouro), deixou de fora as “Vespas Americanas”?!  Referências ASSIS, Machado de. Todas as crônicas – Box. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2022.  DE LUCA, Heloísa Helena Paiva (org.). Balas de estalo de Machado de Assis. São Paulo: Annablume, 1998.  GLEDSON, John. “A história das edições das crônicas machadianas”. In: ASSIS, Machado de. Crônicas escolhidas. São Paulo: Penguin-Companhia das Letras, 2013.  MACHADO, Ubiratan. Dicionário de Machado de Assis (2a edição revista e ampliada). São Paulo: Imprensa Oficial do Estado de São Paulo; Rio de Janeiro: Academia Brasileira de Letras; Lisboa: Imprensa Nacional, 2021.  MAGALHÃES JÚNIOR, R. Vida e obra de Machado de Assis (Volume 2, “Ascensão”). Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1981.  NOVAIS, Faustino Xavier de. A vespa do Parnaso. Porto: Tipografia de J. A. de Freitas Júnior, 1854.  

As "Vespas americanas" de Machado de Assis

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