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Direitos humanos e sujeitos de direitos: breves reflexões sobre reivindicações e construções de sujeitos e normas
O presente ensaio consiste em uma breve reflexão acerca da construção de sujeitos de direitos a partir da segunda metade do século XX. Buscou-se compreender as diferentes possibilidades de inserção de indivíduos e grupos no rol de reconhecimento político e legislativo, tanto nos planos nacionais quanto internacionais. Como complementação, apresentam-se algumas reflexões sobre as políticas de direitos humanos e sua utilização, tanto para reforçar identidades individuais e coletivas, quanto para questioná-las. Se por um lado com o final da Segunda Guerra Mundial e o progressivo desmantelamento dos impérios coloniais nos continentes Africano e Asiático passou-se a falar em uma política universal de direitos humanos, por outro lado a crítica a esse universalismo desordenou o cenário de homogeneidade e igualdade que pretensamente o acompanhavam. A construção de sujeitos dignos de proteção legal nesse cenário é extremamente ambígua e instável, sendo importante trocar de lentes para compreender quais são os significados atribuídos aos termos e suas conseqüências políticas
O empoderamento de mulheres para o enfrentamento da violência doméstica e familiar – reflexões sobre o projeto Maria, Marias
This article reflects on popular education on rights as a tool for fighting domestic violence against women. First we recount the experience of Maria, Marias Project, that seeks to organize and mobilize women for the full implementation of Law 11.340/2006 (Maria da Penha Law). After presenting the project and its dynamics, the testimonials on the impact of the course from the perspective of the students of the 7th and 8th edition are worked, specially their reflections on "empowerment", "knowledge", "activism" and "network". Finally, we present some brief remarks reflecting on the potential of popular education on rights.O presente artigo tem por objetivo expor algumas reflexões sobre educação popular em direitos como instrumento para o enfrentamento da violência doméstica e familiar contra as mulheres. As reflexões partem da experiência do projeto Maria, Marias que busca organizar e mobilizar mulheres para aplicação integral da Lei 11.340/2006, mais conhecida como Lei Maria da Penha. O Maria, Marias tem como principal atividade um curso anual que visa capacitar sobre a lei, serviços e ONGs que trabalham no enfrentamento da violência contra as mulheres. Após apresentar o projeto e seu funcionamento, são trabalhados os depoimentos sobre o impacto do curso na perspectiva das alunas da 7ª e 8ª edição, que em suas avaliações escritas do curso trazem as palavras “empoderamento”, “conhecimento”, “luta” e “rede” para traduzir o que significou para essas mulheres participar do Maria, Marias. Para finalizar, apresentamos algumas breves considerações refletindo sobre as potencialidades da educação popular em direitos
Dar à luz na sombra
Este livro procura identificar necessidades, detectar entraves e elaborar estratégias para garantia do exercício de direitos materno-reprodutivos no sistema prisional brasileiro. Por meio da observação de estabelecimentos prisionais, da realização de grupo focal com presas e de entrevistas com especialistas, as autoras puderam identificar, no fluxograma do sistema de justiça, os entraves e as lacunas que impedem detentas de terem seus direitos efetivados; mapear a percepção de mães presas do tratamento jurídico-penal-social que lhes é concedido e granjear suas propostas para realização do exercício da maternidade na condição adversa em que se encontram. Como resultado da pesquisa, foram elaboradas trinta propostas sobre desencarceramento, convivência familiar e fluxo do sistema de justiça, se não para diminuir a população prisional feminina, pelo menos para reduzir as violações de direitos e as consequências do aprisionamento. Assim, este livro busca contribuir para o desenvolvimento e a divulgação da pesquisa empírica em Direito e para os avanços na defesa dos direitos de mulheres e crianças encarceradas no Brasil
Cuidado e direitos fundamentais: o caso do habeas corpus coletivo para pais e responsáveis por crianças e pessoas com deficiência
In the present case study, we analyze Habeas Corpus 165.704 DF, aimed at all people who are in prison and are responsible for disabled and children. The order was granted by the Supreme Federal Court (STF) on October 20, 2020, expanding the understanding of the decision of Habeas Corpus 143.641 SP that granted, with some exceptions, the substitution of pre trial detention for home prison in favor of all women who were pregnant or mothers to children up to 12 years of age and people with disabilities. This case deserves to be studied precisely because it broadens the understanding that not only mothers are responsible for the care of their children, recognizing other people as primary caregivers, therefore, breaking with the traditional sexual division of labor. This discussion, which is urgent and must also be deepened in other areas, acquires special relevance in times of the Covid-19 pandemic, in which care tasks were exacerbated.No presente estudo de caso analisamos o Habeas Corpus 165.704 DF, voltado a todas as pessoas em situação de prisão e que têm sob sua única responsabilidade deficientes e crianças. A concessão da ordem foi proferida pela Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) em 20 de outubro de 2020, ampliando o entendimento da decisão do Habeas Corpus 143.641 SP que concedeu a substituição da prisão preventiva por domiciliar em favor de todas as mulheres submetidas à prisão cautelar, que fossem gestantes, puérperas ou mães com crianças de até 12 anos de idade e de pessoas com deficiência, salvo algumas exceções. Este caso merece ser estudado justamente por alargar o entendimento de que não apenas mães são responsáveis pelo cuidado de seus filhos, reconhecendo outras pessoas como cuidadoras principais, portanto, rompendo com a tradicional divisão sexual do trabalho. Tal discussão, urgente e necessária, deve também ser aprofundada em outras áreas, adquire especial relevância em tempos da pandemia da Covid-19, nos quais foram exacerbadas as tarefas do cuidado
Dialogues between anthropology of law and performance
This text’s title is the same as the Panel that provided, in the end of 2021, a reunion between these four researchers and the remembrance of an important point of convergence in their trajectories: the Anthropology, Performance and Drama Nucleus at the University of São Paulo (NAPEDRA-USP). In this article, Ana Letícia de Fiori points out the interfaces between crimes and dangers attributed to games. Bruna Angotti narrates the power of a performance-seminar for the development of her doctorate. Jânia Perla Diógenes de Aquino recovers anthropological-performance analyzes of major bank robberies and Ana Lúcia Pastore Schritzmeyer tells how parts of NAPEDRA’s history and some of her researches in anthropology of law intermeshed and fed back each other.O título deste texto é o mesmo da mesa redonda que propiciou, no final de 2021, um reencontro entre as quatro pesquisadoras e a rememoração de um importante ponto de convergência entre suas trajetórias: o Núcleo de Antropologia, Performance e Drama da Universidade de São Paulo (NAPEDRA-USP). Neste artigo, Ana Letícia de Fiori pontua as interfaces entre crimes e perigos atribuídos a jogos. Bruna Angotti narra a potência de um seminário-performance para o desenvolvimento de seu doutorado. Jânia Perla Diógenes de Aquino recupera análises antropológico-performáticas de grandes assaltos a bancos e Ana Lúcia Pastore Schritzmeyer conta como parte da história do NAPEDRA e algumas de suas pesquisas em antropologia do direito se mesclaram e se retroalimentaram
Entre o Estado multiétnico e as lacunas jurídicas: uma análise da culpabilidade penal do indígena à luz do direito brasileiro
The purpose of this paper is to analyze the formation of the criminal reproach that falls on indigenous defendants in the Brazilian criminal scenario, in order to understand how the legal gaps and assimilationism reminiscent in the current normative order influence the violation of fundamental rights and guarantees of the native peoples. It also seeks to analyze how the indigenous issue is placed in the Federal Constitution of 1988, the Criminal Code and other legal texts, such as Resolutions No. 287/2019 and 454/2022 of the National Council of Justice of Brazil (CNJ), Convention No. 169 of the International Labor Organization, and Law No. 6,001/1973; always tracing parallels between its provisions and the legal-criminal treatment of the indigenous people in Brazil. As elements of the criminal culpability, the imputability, the awareness of illegality and the enforceability of different conduct are explored from the pluri-ethnic paradigm and the respect guaranteed by the Federal Constitution to legal-cultural self-determination. The historical construction of the integrationist ideal, the concepts of non-imputability due to incomplete mental development, civilizing penalization and culturally conditioned error, as well as the sociocultural impact of indigenous imprisonment, were also studied.Este artículo tiene como objetivo analizar la formación del juicio de desaprobación penal que recae sobre los imputados indígenas en el escenario penal brasileño, con el objetivo de comprender cómo los vacíos legales y el asimilacionismo que recuerdan el orden normativo actual influyen en la violación de los derechos y garantías fundamentales de los pueblos originarios. Además, también busca analizar cómo se ubica la cuestión indígena en la Constitución Federal de 1988, en el Código Penal y otros textos legales, como las Resoluciones nº 287/2019 y 454/2022, del Consejo Nacional de Justicia, Convenio nº 169, de la Organización Internacional del Trabajo, y Ley n° 6001/1973; trazando paralelismos entre sus disposiciones y el tratamiento legal y penal de los pueblos indígenas en Brasil. La imputabilidad, la conciencia de ilegalidad y la exigibilidad de conductas diferentes son elementos de la culpabilidad penal explorados desde el paradigma pluriétnico y el respeto que otorga la Carta Magna a la autodeterminación jurídica y cultural. También se desentrañó la construcción histórica del ideal integracionista, los conceptos de inimputabilidad por desarrollo mental incompleto, penalización civilizatoria y error culturalmente condicionado, como el impacto sociocultural del encarcelamiento indígena.O presente artigo tem como objetivo analisar a formação do juízo de reprovabilidade penal que recai sobre os réus indígenas no cenário criminal brasileiro, visando a compreender de que forma as lacunas jurídicas e o assimilacionismo reminiscentes no ordenamento normativo vigente influem na violação de direito e garantias fundamentais dos povos originários. Também, busca-se analisar como a questão indígena está colocada na Constituição Federal de 1988, no Código Penal e demais textos legais, como as Resoluções n.º 287/2019 e 454/2022, do Conselho Nacional de Justiça, a Convenção n.º 169, da Organização Internacional do Trabalho, e a Lei n.º 6.001/1973; traçando paralelos entre suas disposições e o tratamento jurídico-penal dos indígenas no Brasil. A imputabilidade, a consciência de ilicitude e a exigibilidade de comportamento diverso são elementos da culpabilidade penal explorados a partir do paradigma pluriétnico e do respeito prestado pela Carta Magna à autodeterminação jurídico-cultural. Destrinchou-se, ainda, a construção histórica do ideal integracionista, os conceitos de inimputabilidade por desenvolvimento mental incompleto, penalização civilizatória e erro culturalmente condicionado, tal como o impacto sociocultural do aprisionamento indígena
From the lonely act to the judiciary exposure: an anthropological-legal approach to infanticide in Brazil
O Código Penal Brasileiro, atualmente em vigor, prevê o crime de infanticídio como o ato de matar, sob a influência do estado puerperal, o próprio filho, durante o parto ou logo após. Trata-se de crime cuja agente é necessariamente a parturiente ou a puérpera. Com pena reduzida em relação ao homicídio, é considerado um crime excepcional, pelo fato de ser cometido por mulher sem completo domínio dos seus atos. No Brasil, os saberes sobre o tema são produzidos especialmente nas doutrinas penais e médico-legais, sendo restrito o diálogo com pesquisas empíricas que analisam o fenômeno do infanticídio sob uma ótica interdisciplinar. O presente trabalho apresenta uma etnografia dos usos e entendimentos do tipo penal infanticídio, feita por meio da análise de sete processos judiciais; 179 acórdãos, entrevistas e conversas informais com personagens processuais envolvidos em casos nos quais se discutiu se tratar de infanticídio; participação em três sessões de julgamento, pelo Tribunal do Júri, de mulheres acusadas da morte de seu/sua recém-nascido/a; e análise da produção sobre infanticídio publicada em doutrinas penais e médico-legais. Seu principal objetivo foi compreender como quem acusa, defende ou julga essas mulheres utiliza e interpreta o tipo penal infanticídio e os elementos que fazem deste crime peculiar. Mapeei, também, que visões de mulher, maternidade, crime feminino estão embutidas na construção desse tipo penal específico, bem como a maneira como este é trabalhado nas defesas e acusações judiciais. Por fim, identifiquei como os casos são apresentados e decididos no Sistema de Justiça Criminal. Concluí que há uma grande discrepância no modo como estes são interpretados e julgados, apesar da semelhança nítida que há entre eles, tendo as moralidades dos personagens processuais peso considerável nos rumos tomados nos autos. A mulher acusada de matar seu/sua recém-nascido/a é considerada mais ou menos cruel dependendo das lentes com as quais o caso é visto, sendo as expectativas acerca de uma maternidade sadia parâmetro para se julgar.The present Brazilian Criminal Code establishes infanticide as a criminal offense, describing it as the act of killing, under the influence of the \"puerperal state\", ones own child, during labor or shortly after. The offender is necessarily the laboring or puerperal woman. Considered an exceptional crime, its sentence is shorter than a homicide, for its committed by a woman not fully aware of her acts. In Brazil, the knowledge on the issue is produced mostly in criminal and legal-medical doctrinal analysis, limiting the dialogue with empirical researches that analyses the infanticide phenomenon under an interdisciplinary approach. This work presents an ethnography of uses and understandings of infanticide as a criminal offense, by means of the analysis of seven judicial cases; 179 decisions; interviews and informal conversations with people with roles in cases related to infanticide; participation in three Jury trials of women accused of the death of their own newborns; and analysis of the literature on infanticide published in criminal and legal-medical doctrinal analysis. Its main purpose is to understand how who accuses, defends or judge women for the death of their newborns uses and interprets the criminal offense infanticide and the elements that make this a peculiar crime. I have also mapped which visions of woman, motherhood, and feminine crime are enmeshed in the building of this specific criminal offense, as well as the way it is engaged in judicial accusations and defenses. Finally, I have identified how cases of women accused of the death of their own newborns are presented to and decided by the Criminal Justice System. The research concludes that there is a great discrepancy in the way the cases are interpreted and decided, despite the notorious resemblance between them, for the morality of the processual characters has a relevant impact on the unfolding of the process. The woman accused of killing her own newborn is considered more or less cruel depending on the lenses by which the case is regarded, as the expectations of what is a healthy motherhood are the judgement parameters